"Essas iniciativas estão a ser financiadas a partir do estrangeiro e o financiamento não é transparente", declarou numa conferência de imprensa o líder do partido no poder desde 2012, o Sonho Georgiano - acusado pelos opositores de uma deriva autoritária pró-russa -, agitando o espetro de uma ingerência externa no país.
"Lembro a todos que não haverá revolução na Geórgia, seja ela transparente ou não", acrescentou Irakli Khobadidzé.
O primeiro-ministro georgiano recusou-se hoje a negociar com a oposição, ao quinto dia de uma grande manifestação, marcada por confrontos, exigindo novas eleições legislativas e condenando a decisão governamental de suspender o processo de integração da Geórgia na União Europeia (UE).
Ao fim da tarde, milhares de manifestantes estavam de novo concentrados em frente ao parlamento, em Tbilissi, a capital. O edifício, ponto de encontro tradicional, tornou-se o epicentro das tensões entre polícia e opositores desde a passada quinta-feira.
O chefe do executivo georgiano assegurou que o seu Governo fará "todos os esforços" para integrar o país do Cáucaso na UE, apesar de ele mesmo ter anunciado na semana passada a suspensão do processo de adesão à Europa comunitária até 2028, o que provocou estes protestos em grande escala.
"Nada de negociações" com a oposição, declarou.
O objetivo de adesão à UE é tão importante que está, inclusive, inscrito na Constituição desta ex-república soviética.
Esta mobilização popular ocorre numa altura em que a autoridade do Sonho Georgiano é muito contestada pela oposição, que o acusa de ter "roubado" as eleições legislativas de 26 de outubro.
O Sonho Georgiano utiliza frequentemente a Ucrânia, invadida pelas tropas russas há quase três anos, como exemplo do contrário, acusando os seus dirigentes o Ocidente de querer arrastar a Geórgia para uma guerra com Moscovo.
O porta-voz do Kremlin (presidência russa), Dmitri Peskov, estabeleceu um paralelo entre a situação na Geórgia e a revolta da praça Maïdan, na Ucrânia, em 2014.
Hoje de manhã, a Presidente da República georgiana, a pró-ocidental Salome Zurabichvili, em rutura com o Governo, mas cujos poderes são muito limitados, considerou que a mobilização popular não está a enfraquecer.
"Mais uma noite impressionante, durante a qual os georgianos defenderam firmemente a sua Constituição e a sua opção europeia", escreveu Zurabichvili na rede social X (antigo Twitter).
No domingo à noite, pela quarta noite consecutiva, dezenas de milhares de manifestantes concentraram-se, agitando bandeiras europeias até tarde em Tbilissi e noutras cidades.
A situação tornou-se tensa ao fim da tarde, junto ao parlamento: os manifestantes lançaram fogo-de-artifício para o edifício e sobre a polícia, que em seguida utilizou canhões de água e gás lacrimogéneo para os dispersar.
Desde o início dos protestos, dezenas de pessoas - manifestantes, jornalistas e polícias - ficaram feridas, algumas com gravidade, de acordo com ambas as partes, embora o número exato não tenha sido claramente apontado.
No total, 224 pessoas foram detidas desde quinta-feira, informou o Ministério do Interior num comunicado.
Os manifestantes acusam a polícia de os maltratar: "Estão furiosos, batem-nos, atiram-nos água [mas] não nos importamos", disse no domingo Lika, de 18 anos, citada pela agência noticiosa francesa AFP, enquanto a polícia tentava dispersar a multidão.
A Lituânia, a Letónia e a Estónia anunciaram hoje a imposição de sanções a governantes georgianos que, segundo eles, foram responsáveis pela violação dos direitos humanos durante as manifestações.
Um porta-voz da diplomacia alemã garantiu hoje à Geórgia que a porta de entrada na União Europeia continua aberta e apelou ao Governo para que apoie esta via.
Hoje, começaram greves de solidariedade com os manifestantes em escolas, instituições públicas e empresas, segundo a comunicação social nacional.
Lacha Matiachvili, professor grevista de 35 anos visto em protesto no domingo, afirmou tratar-se de "um ato simbólico de resistência".
Os georgianos estão a marchar tanto a favor da UE como contra a vizinha Rússia, com a multidão a entoar regularmente palavras de ordem anti-Moscovo.
O país situado nas margens do mar Negro ainda está traumatizado com a invasão russa em 2008, durante uma breve guerra.
Moscovo reconheceu posteriormente a independência de duas regiões georgianas separatistas que fazem fronteira com o seu território, a Abecásia e a Ossétia do Sul, onde a Rússia ainda mantém uma presença militar.
A Geórgia está a atravessar uma crise política desde o anúncio da vitória do Sonho Georgiano nas eleições de outubro, desde então contestada.
Apesar das acusações de irregularidades, o Governo excluiu a possibilidade de realizar novas eleições.
Os manifestantes georgianos receberam o apoio de Washington, Kyiv e Bruxelas, que condenaram nomeadamente o uso da força pela polícia.
A Geórgia obteve oficialmente o estatuto de candidato à adesão à UE em dezembro de 2023, mas Bruxelas congelou entretanto o processo, acusando o Governo de dar um grave passo atrás em termos de democracia.
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