Na conferência de imprensa de fim de ano, em Genebra, Suíça, na qual fez um balanço dos acontecimentos de 2024, marcado por uma "proliferação dos conflitos armados", Volker Türk destacou "os acontecimentos extraordinários" ocorridos na véspera na Síria, onde o regime liderado por Al-Assad "foi afastado do poder após décadas de repressão brutal e após quase 14 anos de um conflito implacável".
"Durante este período, perderam-se centenas de milhares de vidas, mais de 100 mil pessoas desapareceram e cerca de 14 milhões foram expulsas das suas casas, muitas vezes nas circunstâncias mais atrozes. Encontrei-me com muitos deles ao longo dos anos, testemunhei o seu desespero e trauma ao testemunharem as mais graves violações dos direitos humanos cometidas contra eles, incluindo a tortura e o uso de armas químicas", apontou.
De acordo com o alto-comissário, "os sírios saíram às ruas com muita esperança", de que esta seja "uma oportunidade para o país construir um futuro assente nos direitos humanos, na liberdade e na justiça", mas também com "ansiedade", pois "muita coisa é incerta", e deixou então vários alertas para o período de transição que se seguirá.
"Qualquer transição política deve assegurar a responsabilização dos autores de violações graves e garantir que os responsáveis respondam por elas. É imperativo que todas as provas sejam recolhidas e preservadas meticulosamente para utilização futura. A reforma do aparelho de segurança será fundamental. Esta transição deve igualmente assegurar que a tragédia das pessoas desaparecidas seja resolvida", começou por advogar.
Volker Türk alertou então que "devem ser tomadas todas as medidas para assegurar a proteção de todas as minorias e para evitar represálias e atos de vingança".
Apontando que "estão alegadamente a ter lugar hostilidades nalgumas partes da Síria, designadamente no nordeste", o responsável das Nações Unidas disse que "é realmente importante, imperativo de facto, que todas as partes cumpram as suas obrigações ao abrigo do direito humanitário internacional e do direito dos direitos humanos".
"O único caminho a seguir é um processo político nacional que ponha fim à litania de sofrimento, satisfaça as aspirações de todos os sírios e garanta a verdade, a justiça, a reparação, a cura e a reconciliação", disse, acrescentando que "é essencial que os direitos humanos de todos os sírios estejam no centro desse processo, através de uma participação significativa e inclusiva, nomeadamente das mulheres e dos jovens".
"A soberania, a unidade, a independência e a integridade territorial da Síria devem ser restauradas. O meu gabinete está pronto a apoiar o processo de transição", declarou.
No domingo, os rebeldes declararam Damasco 'livre' do Presidente Bashar al-Assad, após 12 dias de ofensiva de uma coligação liderada pelo grupo islâmico Organização de Libertação do Levante (Hayat Tahrir al Sham ou HTS, em árabe), juntamente com outras fações apoiadas pela Turquia, para derrubar o governo sírio.
O Presidente sírio, que esteve no poder 24 anos, deixou o país perante a ofensiva rebelde e asilou-se na Rússia, país que foi seu aliado na guerra contra os rebeldes.
No poder há mais de meio século na Síria, o partido Baath foi, para muitos sírios, um símbolo de repressão, iniciada em 1970 com a chegada ao poder, através de um golpe de Estado, de Hafez al-Assad, pai de Bashar, que liderou o país até morrer, em 2000.
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