Regresso de Trump coloca desafios a governo trabalhista britânico

O segundo mandato de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos representa um especial desafio para o governo trabalhista britânico de Keir Starmer, numa altura de instabilidade económica e geopolítica. 

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Lusa
17/01/2025 11:20 ‧ ontem por Lusa

Mundo

Trump

Criticado por ter aumentado impostos, feito cortes na despesa e protagonizado escândalos políticos nos seis meses depois de ter tomado posse, o novo Executivo britânico foi abalado nas últimas semanas pela subida dos juros sobre a dívida pública.  

 

O sucessor de Joe Biden arrisca agravar este panorama difícil se desencadear uma guerra comercial mundial que aumente a inflação e trave o crescimento económico no Reino Unido.

Trump ameaçou impor tarifas de 10% sobre todos os produtos importados para os EUA (60% sobre as importações da China), o que poderá suscitar medidas retaliatórias da União Europeia e de outras potências. 

Os EUA são o principal parceiro comercial do Reino Unido, que exportou 186,7 mil milhões de libras (cerca de 222 mil milhões de euros) de bens e serviços em 2023. 

As exportações de maior valor seriam as mais prejudicadas, como produtos farmacêuticos, automóveis, máquinas e aparelhos e componentes para a aviação.

"É uma parte enorme e importante da nossa economia que poderia ser facilmente tarifada pela administração Trump. O Reino Unido seria particularmente vulnerável", vincou o professor da Universidade de York, Chris Featherstone, especialista em relações anglo-americanas. 

O Instituto Nacional de Investigação Económica e Social britânico estimou que tarifas norte-americanas resultariam numa queda de 0,8% no PIB no próximo ano, equivalente a um buraco fiscal de 21,5 mil milhões de libras (25,5 mil milhões de euros).

Perante esta incerteza, o banco de investimento Goldman Sachs baixou a previsão de crescimento económico do Reino Unido para 1,2% este ano.

Outro ponto sensível é a parceria militar e diplomática próxima entre os dois países, refletida no apoio de Londres às invasões do Afeganistão em 2001 e do Iraque em 2003.

No anterior mandato, o republicano questionou o papel da NATO, na qual o Reino Unido tem um papel importante. 

"É uma característica extremamente importante da nossa política de defesa, mas consigo ver uma situação em que Trump, com o seu isolacionismo, tenta recuar e questionar o valor de ter o Reino Unido como um parceiro tão próximo", afirmou Featherstone à Agência Lusa.

Este académico acredita que Trump e Starmer estão mais ou menos alinhados em questões como a concorrência com a China e a ameaça do Irão, mas que poderão chocar noutras questões como a das alterações climáticas. 

A nível de política externa, refere, Starmer vai tentar evitar que os EUA interrompam o apoio a Kiev para forçar a Ucrânia a negociar um acordo de paz com a Rússia. 

A incerteza criada pelas posições de Trump nos últimos meses é tal que Keir Starmer começou-se a mexer cedo nos bastidores antes e depois das eleições presidenciais norte-americanas de novembro. 

Em setembro de 2024, garantiu um jantar com o ainda candidato republicano em Nova Iorque, na Torre Trump, e em dezembro enviou o chefe de gabinete, Morgan McSweeney, a Washington para encontros com a equipa do presidenteeleito. 

Starmer nomeou também um novo embaixador do Reino Unido, o antigo ministro e comissário europeu Peter Mandelson. 

Durante as eleições, apoiantes de Trump acusaram o Partido Trabalhista de interferência por enviar ativistas para ajudar na campanha da rival, a candidata democrata, Kamala Harris. 

Mandelson "é muito bom a manter contactos, e é capaz de ser um pouco como um estadista mais experiente que não fica irritado e que sabe dar a volta ao assunto, enquadrando um determinado evento ou política de forma a agradar a Trump", descreveu Featherstone.

Para o professor de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade de Birmingham, David Dunn, esta diplomacia "silenciosa" vai ser chave nos próximos quatro anos na relação entre dois dirigentes de polos opostos no espectro político. 

"O que o Reino Unido está a fazer é tentar continuar como se tudo estivesse normal e não fazer nada que, de alguma forma, cause problemas. A esperança é que, ao manter-se discreto, reduz a fricção entre os dois países", ilustrou.

Esta prudência passa por tentar ignorar declarações provocadoras de próximos de Trump, como o multimilionário Elon Musk, sem se desviar da própria agenda para a política externa. 

"O facto de [a ministra das Finanças] Rachel Reeves se ter deslocado à China na semana passada é uma indicação de que o governo britânico está preparado para seguir o seu próprio caminho", exemplificou. 

Dunn também não acredita que Starmer recue na aproximação à União Europeia e ao mercado único, apesar da hostilidade conhecida de Trump à UE, mesmo que prejudique as perspetivas de um acordo comercial com os EUA.

"É pouco provável que o Reino Unido esteja disposto a fazer grandes sacrifícios - e seriam sacrifícios sérios. A abertura do sistema nacional de saúde (NHS) à concorrência e do mercado alimentar à carne dos EUA, com normas de qualidade alimentar menos exigentes, seriam grandes obstáculos, especialmente para o Partido Trabalhista", explicou. 

"Posso ver Trump a tentar meter-se entre o Reino Unido e a UE, mas ficaria surpreendido se fosse bem sucedido", acrescentou.

Leia Também: Trump vai tentar "evitar que TikTok fique indisponível" nos EUA

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