"Muitas pessoas estão a ficar inquietas e a minha tarefa é tentar diminuir a histeria coletiva e ser realista na abordagem da pandemia", disse à Lusa a luso-americana Ana Paula Gomes, enfermeira especialista a trabalhar na área de Boston com o grau de "nurse practitioner", que representa um cargo mais avançado da enfermagem nos Estados Unidos.
A mulher de 27 anos é enfermeira doutorada em saúde psiquiátrica e mental, preparada para diagnosticar, conduzir terapias ou prescrever medicação a pacientes com distúrbios psiquiátricos ou distúrbios cerebrais orgânicos.
Nesta altura em que os Estados Unidos são o país com maior número de infetados com coronavírus -- quase 165 mil -- e o estado de Massachusetts, onde Ana Paula reside, é o quinto mais afetado no país, a portuguesa diz que a necessidade de serviços de saúde mental disparou, muito por causa das ordens de quarentena, isolamento voluntário e distanciamento social.
A profissional realiza consultas virtuais a pacientes dentro de hospitais ou fechados em casa, inclusive adultos com crianças, que revelam muita ansiedade e "muito perto do pânico" e que não se sentem bem por estarem isolados.
O que preocupa muito as pessoas é "essencialmente, o desconhecido", destaca a profissional de saúde, sublinhando, no entanto, que a população nos EUA tem qualificações elevadas e está devidamente consciente e informada pelos especialistas de saúde sobre os esforços de contenção de doenças infecciosas.
"Tento assistir o melhor que posso, fornecendo terapia, apoio ou 'coping skills' [métodos para lidar] neste momento difícil, mas também educando para as orientações dadas pelo CDC", autoridade nacional de saúde, explica a enfermeira.
Voluntária em organizações de solidariedade, Ana Paula espera ser mobilizada para prestar auxílio em situação de catástrofe, em qualquer local dos Estados Unidos, como fez em 2017 no centro-sul do país depois do furacão Harvey, que devastou o Texas e Louisiana.
Ana Paula dirigiu uma equipa de saúde mental e apoio psicológico durante duas semanas num "mega abrigo", onde estavam cerca de cinco mil pessoas, que tinham sido retiradas das suas casas, enquanto mais de mil voluntários e representantes de variadas organizações de solidariedade cooperavam entre si para conseguir dar assistência à população.
No mês de fevereiro teve uma missão em El Salvador, a tratar de pessoas e crianças em idade escolar e teve de passar por controlos de segurança com avaliação da temperatura corporal, um dos primeiros passos impostos nos aeroportos americanos.
"Regressei para uma América muito diferente", comenta a enfermeira, nascida na cidade de Salem, em Massachusetts e criada no seio da comunidade portuguesa de Peabody, onde também se voluntariou e participou em diversas associações socioculturais portuguesas.
Ana Paula Gomes diz que os Estados Unidos estão a combater a covid-19 com "uma dinâmica muito diferente" da Europa em termos de saúde, mas de forma global, ninguém estava preparado para esta pandemia.
Nas suas funções, a profissional tenta manter as pessoas "realistas, conscientes do estado de saúde e vigilantes" e insiste que a população se mantenha protegida e que comunique se tiver sintomas da covid-19.
Sem sintomas, não se justifica fazer um teste, adianta a enfermeira, até porque o vírus demora vários dias a desenvolver sintomas ou a revelar-se.
"Se uma pessoa for testada mais cedo, pode receber um resultado falso negativo e estar a espalhar a doença sem saber".
Por isso, os conselhos da CDC para quem está infetado, com ou sem sintomas, é o isolamento voluntário em casa por 14 dias para evitar a infeção a outras pessoas.
Os EUA são atualmente o país com mais casos de infeção pelo novo coronavírus - quase 175 mil casos confirmados - e 3.400 mortes.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 800 mil pessoas em todo o mundo, registando-se perto de 40.000 mortes, desde que surgiu na China em dezembro passado.