Numa nota enviada à agência Lusa e assinada pelo Presidente da AOFA, António Costa Mota, a associação de oficiais refere que o Conselho Nacional, reunido no passado dia 15, repudiou "por unanimidade" a eventual decisão da obrigatoriedade da utilização da 'app' StayAway Covid, proposta pelo governo.
De acordo com a nota, a posição unânime do Conselho tem por base "questões de legalidade", desde logo "o facto de, segundo os próprios criadores da 'app', esta não garantir em absoluto a privacidade dos utilizadores" ou ainda a necessidade da aplicação ter a geolocalização ligada, o que implica uma "violação de direitos de privacidade".
Sobre a fiscalização da medida prevista pela proposta do governo, que caberá às Forças e Serviços de Segurança, para a AOFA existe uma "manifesta inaplicabilidade evidente", questionando quem irá fiscalizar o seu cumprimento com cidadãos ou até entre os próprios militares.
"Pensa o senhor ministro (ou não tem quaisquer dúvidas sobre isso?) que é legal que um cidadão, seja ele qual for, passe para a mão, ou sequer mostre, os conteúdos do seu telemóvel ainda que a um Agente da Autoridade? Nós não temos quaisquer dúvidas. Além de impraticável é ilegal", criticam.
Ao nível técnico, o Tenente-Coronel António Costa Mota questiona como é que um militar poderá usar a aplicação se não tiver telemóvel ou condições técnicas para a instalar e "quem pagará os custos inerentes à ligação permanente da georreferenciação e Bluetooth necessárias ao funcionamento" da StayAway Covid, ironizando se será o ministério a facultar telemóveis a todos os militares. A AOFA acusa assim o ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho, de estar "profundamente errado", depois de esta manhã o responsável pela tutela ter dito à Lusa, que "não há nenhuma dificuldade" para os militares se tiverem de utilizar a aplicação StayAway Covid no dia-a-dia, ressalvando que poderão não o fazer em missões nas quais não devam identificar a sua posição.
"Naturalmente que quando os militares estão em alguma missão que exija não se saber a sua posição, naturalmente que nesses momentos têm a geolocalização desligada", disse o ministro.
Em tom irónico, o Presidente da AOFA pergunta ainda se esta não será uma "manobra de diversão" do governo perante "os riscos de aprovação da proposta de Orçamento do Estado para 2021", considerando que existem outras matérias "mais relevantes" às quais o ministério e o governo se poderiam dedicar.
A proposta de lei, que deu entrada quarta-feira à noite e prevê multas até 500 euros em caso de incumprimento, "determina a obrigatoriedade do uso de máscara para o acesso ou permanência nos espaços e vias públicas e a obrigatoriedade da utilização da aplicação StayAway Covid".
O anúncio desta iniciativa do executivo socialista foi feito após o Conselho de Ministros que decidiu elevar o nível de alerta para situação de calamidade em todo o território nacional devido à evolução preocupante da pandemia de covid-19, bem como a adoção de novas medidas para travar o aumento de casos.
Na quinta-feira, ao longo do dia, os diversos partidos foram-se manifestando no parlamento contra a obrigatoriedade do uso da aplicação, tendo sido levantada por algumas das forças políticas a questão da constitucionalidade da lei.
Mesmo o PS, partido do Governo, afirmou que a bancada ainda não tem posição fechada sobre o uso obrigatório da aplicação Stayaway Covid e pediu audições urgentes de especialistas em saúde, direitos e liberdades e proteção de dados.
O líder do principal partido de oposição, o social-democrata Rui Rio, anunciou que o PSD vai apresentar um diploma idêntico ao do Governo sobre a obrigatoriedade do uso de máscaras na rua, mas sem as referências ao uso obrigatório da aplicação StayAway Covid.
Na mesma reação no parlamento, Rio admitiu, no entanto, que possa vir a ser obrigatória a utilização desta aplicação, desde que haja garantias da sua eficácia, que considerou não existirem na atual proposta do Governo.
No final do dia, o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, admitiu o diploma, apesar das dúvidas sobre algumas medidas, face à "situação de urgência" em função da evolução da pandemia.
Entretanto, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, já prometeu enviar para o Tribunal Constitucional para fiscalização preventiva a lei que obriga à utilização da aplicação para telemóveis Stayaway Covid, se esta for aprovada pelo parlamento e persistirem dúvidas de constitucionalidade.