Autotestes? É impossível "garantir que a colheita é bem efetuada"
Os autotestes de despiste à Covid-19 já estão a ser vendidos em algumas farmácias e parafarmácias. O Notícias ao Minuto esteve à conversa sobre a temática com Joana Vicente, diretora técnica do Test it Lab - um laboratório de análises exclusivamente dedicado aos testes de diagnóstico à Covid-19.
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País Covid-19
As farmácias e parafarmácias começaram, a partir do sábado passado, dia 2 de abril, a vender ao público testes rápidos de antigénio para deteção do SARS-CoV-2. Estes, vulgarmente, chamados autotestes foram aprovados no início do mês de março pelo Governo ao abrigo de um regime excecional e temporário.
O dispositivo em causa está isento de IVA e receita médica, mas não é comparticipado pelo Estado. De momento o único teste que tem autorização do Infarmed para ser vendido em Portugal é da empresa sul-corenana SD Biosensor e está a ser distribuído no país pela farmacêutica Roche.
A propósito da temática, o Notícias ao Minuto esteve à conversa com Joana Vicente, diretora técnica e CEO do Test it Lab, um laboratório de análises exclusivamente dedicado aos testes de diagnóstico à Covid-19 (PCR e antigénio). Desde que foi inaugurado, em novembro do ano passado, este laboratório já fez "cerca de 3.500 testes de PCR e antigénio".
Para a analista é impossível "garantir que a colheita é bem efetuada" por alguém que está em casa e que possivelmente nunca teve contacto com um teste desses, sendo esse "o primeiro passo e o mais importante de todos". "Penso que os tais autotestes de que se fala não poderão ter um caráter formal, porque há uma responsabilidade que só profissionais de saúde, devidamente habilitados para o efeito, poderão assumir", pois "para que haja uma formalidade do resultado analítico, a colheita não deverá ser nunca uma autocolheita", referiu ainda.
Não me incomoda que [os autotestes] existam, incomoda-me que não exista uma estratégia de testagem complementar
"É que neste momento o autoteste é comunicado pela própria pessoa se quiser, não é obrigada a comunicar" e, por isso, para Joana Vicente, "há aqui um conflito de interesses que nem sequer se deveria colocar como hipótese".
A diretora técnica referiu ainda que: "com o estado da nossa economia e com tantas atividades que foram obrigadas a estar fechadas, se ficar apenas à responsabilidade de cada um a comunicação do rastreio, não considero que seja a melhor estratégia", evocando como exemplo um "proprietário de um negócio que está fechado há tanto tempo e que de repente se depara com um resultado positivo" - "imagino que não seja fácil para toda a gente tomar uma decisão".
Já temos uma rede alargada geograficamente, mas falta o Governo investir economicamente na testagem bissemanal para todos
Sobre uma possível solução para garantir que os resultados são comunicados às autoridades sanitárias, recorda que "o resultado é obrigatoriamente comunicado pela rede já existente de laboratórios e todas as entidades que estão ligadas ao SINAVE Lab". "A solução passaria, no fundo, por continuar a fazer os testes numa vertente laboratorial ou nas farmácias aderentes. É necessário haver uma responsabilização quase criminal. Isso já existe para quem está a fazer o diagnóstico e por quem tem de transmitir estes resultados e identificar um resultado positivo", acrescentou.
"Não considero que sejam uma panaceia. Considero que [os autotestes] poderiam ser um complemento, nunca uma estratégia por si só. Não me incomoda que existam, incomoda-me que não exista uma estratégia de testagem complementar. Acredito que possa ser um complemento, mas nunca parte de uma estratégia de testagem que responsabilize as pessoas por esse ato. Isso considero que não estamos todos habilitados para o fazer", nota, contrabalançando, no entanto, que, "de resto, faz sentido que as pessoas queiram ter em sua casa os testes para utilização pontual".
Não compreendo como é que nesta estratégia de desconfinamento possam realizar-se eventos como casamentos sem que uma testagem seja obrigatória
Questionada sobre como poderia decorrer uma boa estratégia alargada de testagem, Joana vinca que "já temos uma rede alargada geograficamente, mas falta o Governo investir economicamente na testagem bissemanal para todos. Para que a comunidade pudesse ter direto a fazer essa testagem semanal na rede existente de farmácias ou de laboratórios, com profissionais de saúde".
"Não compreendo como é que nesta estratégia de desconfinamento possam realizar-se eventos como casamentos sem que uma testagem seja obrigatória. Desejo que as pessoas se casem, obviamente, que os eventos culturais aconteçam - que são o coração da sociedade - que tudo reabra e que todos possamos regressar à vida normal, mas penso que uma testagem prévia para que se previnam fontes de transmissão seria, no mínimo, uma questão de bom senso", sublinha.
Mas um investimento desse género não seria demasiado elevado? "Iria compensar em muito por podermos reabrir a economia e as atividades. As pessoas precisam de trabalhar, as atividades estão fechadas já há muito tempo e há uma fadiga elevada inerente. Penso que neste momento temos todos de criar condições para que haja um reabrir das atividades mas de forma segura, até para garantir que não andamos constantemente nestes confinamentos", concretiza, elaborando que "a única forma para fazer isso é com uma testagem frequente e com um comprovativo de que a pessoa foi testada hoje ou ontem, que tem um certificado válido, atestado por um profissional de saúde que se responsabiliza por dizer que não estava infetada e que, por isso, não constitui um perigo para a saúde dos outros, podendo assim ir ao teatro, a uma loja ou onde entender", conclui.
Recorde-se que os autotestes têm um custo a rondar os 7 a 10 euros por unidade e podem ser comprados em farmácias ou parafarmácias, por pessoas com mais de 18 anos. Numa primeira fase, vão ser garantidos às farmácias 120 mil testes, número que aumentará em função da procura.
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