A Assembleia da República (AR) foi este domingo palco do início das comemorações do 25 de Abril, dia da Liberdade.
A cerimónia teve início pouco depois das 10h00 com o habitual discurso do presidente da AR. Ferro Rodrigues não esqueceu o ano pandémico que vivemos e não deixou de enaltecer o trabalho daqueles que não deixaram que o país parasse.
O líder da Assembleia da República lembrou que 47 anos em 900 anos de história pode parecer pouco, mas lembrou que em menos de cinco décadas muito se conquistou no país.
A par disso, o presidente da Assembleia da República apelou aos deputados dos diferentes partidos a que se ultrapassem bloqueios políticos e honrem o legado dos constituintes, sendo capazes de convergir e traduzindo em leis soluções para o país. O seu discurso deu o pontapé de saída para a intervenção de todos os partidos na cerimónia.
Também como é habitual, as palavras que encerraram a sessão solene foram do Presidente da República, que, este ano, levaram os deputados de, praticamente, todas as bancadas parlamentares a levantarem-se e aplaudirem.
Ainda assim, após o término da cerimónia, o chefe de Estado acabou por ser vaiado à saída da Assembleia da República por um grupo de cerca de 20 manifestantes que protestavam contra a corrupção. Um dos manifestantes - um homem de 57 anos que galgou as barreiras policiais e tentou subir a escadaria em frente ao Parlamento - acabou por ser detido pela PSP no local.
Iniciativa Liberal e as críticas "à dona do 25 de Abril"
O deputado único da Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo, foi o primeiro a falar. Após uma semana de polémica, em torno da participação do partido no desfile que decorre esta tarde na Avenida da Liberdade, o deputado acusou a "esquerda sectária" de se achar dona do 25 de Abril.
"Queremos celebrar uma data da qual ninguém se pode apropriar. A esquerda sectária, do alto da sua arrogância moral e intelectual, acha que é dona do 25 de Abril. E a direita ambígua permite-o por falta de comparência. A iniciativa Liberal diz presente", enfatizou, referindo-se ao desfile próprio que os liberais vão manter.
"Não podia haver maior contraste entre a alegria, a exigência e a abertura dos liberais e a tristeza, a resignação e a exclusão da esquerda sectária", disse em relação à polémica em causa, defendendo que "os liberais [estão] com os olhos no futuro, a esquerda sectária agarrada ao passado".
Chega e um dia em que se devia celebrar "o luto da democracia"
André Ventura considerou que Portugal é um "país de contradições" e defendeu que deveria ser celebrado "o luto da democracia".
"Hoje, os cravos vermelhos deviam ser substituídos por cravos pretos porque é o luto da nossa democracia que hoje devíamos estar a celebrar", afirmou, referindo-se às medidas restritivas no país.
Enquanto na Assembleia da República "os portugueses veem celebrar a liberdade, veem os seus negócios e as suas vidas" encerradas "por um Governo sem critério", atirou.
PEV quer "colorir" o país com o que "ficou por fazer"
Mariana Silva foi quem discursou em nome dos Verdes. A deputada citou o poeta Jorge de Sena para lembrar "a cor" da liberdade e pediu que se continue "a colorir" Portugal com o que "ficou por fazer" na justiça, na saúde.
"É preciso continuar a colorir o futuro, com tudo o que ainda ficou por fazer", pediu, fazendo também referência à Covid-19, pedindo para se "colorir os dias com um Serviço Nacional de Saúde robusto, eficiente, com o acesso aos cuidados primários em todo o território, com mais profissionais a quem mais uma vez agradecemos a entrega, o esforço e a eficiência".
PAN e a "democracia doente"
Naquele que será o último discurso de André Silva no parlamento, o deputado do PAN dedicou à corrupção a sua intervenção.
Para o porta-voz do PAN, o país está "capturado por interesses instalados que enclausuram a democracia na bolha das opções políticas do Bloco Central e que, tantas vezes, servem apenas algumas pessoas ou grupos, gerando a desilusão e a revolta social que abrem espaço ao oportunismo que vende o ódio, o medo e a institucionalização da discriminação como remédios para curar esta Democracia doente".
Na sua última intervenção numa sessão solene da Revolução dos Cravos, o deputado, que anunciou a renúncia ao mandato no final desta sessão legislativa, contemplou igualmente as questões ambientais e de defesa dos direitos dos animais na sua intervenção: "o Ambiente recebe juras de amor de todos os partidos em período eleitoral, continua refém dos interesses das grandes poluidoras e das políticas coniventes do Bloco Central".
PCP 'chama' jovens que não viveram abril de 1974 "a continuá-lo"
O PCP evocou os seis milhões de portugueses que já nasceram depois do 25 de Abril de 1974 e pediu a indignação dos portugueses contra as injustiças, as desigualdades ou a corrupção. "Todos quantos não viveram abril de 1974 são chamados a continuá-lo e a defender os direitos com ele conquistados", afirmou a deputada comunista Alma Rivera.
"Travamos a batalha pela defesa dos valores mais humanos e mais essenciais, de liberdade e democracia, de igualdade e solidariedade. E não calamos que a pobreza e a miséria, a precariedade e o desemprego são inimigos dos valores de Abril", disse.
E acrescentou que "a desesperança é o contrário do caminho de abril", que "a impunidade da corrupção, dos crimes económicos e financeiros, dos buracos da banca, da utilização indevida do erário público são afrontas à democracia", que "o seu maior inimigo é a subjugação do poder político pelo poder económico e a sua fusão num só".
PSD centra-se na Justiça e pede "vontade política e ambição"
O presidente do PSD centrou a sua intervenção na sessão solene do 25 de Abril na Justiça, pedindo "vontade política e ambição" para fazer as reformas necessárias ao país e apontar caminhos a "um regime doente".
Num discurso que tem repetido, até antes de ser líder do PSD, Rio defendeu que, quando as reformas exigidas pelas mutações sociais não se fazem, "é inevitável o aparecimento de um fosso entre a sua fraca capacidade de resposta e as legitimas aspirações do povo que é suposto servir".
Para Rio, "tem faltado vontade política e ambição para se realizarem, com a necessária coragem, as reformas que a realidade reclama e a prudência aconselha" e existe uma "a falta de eficácia" do sistema de Justiça, "uma das principais razões do descontentamento do povo português".
"Quando se ouve o politicamente correto dizer que 'isto é a Justiça a funcionar, é por demais evidente que o povo, que sabe bem que isto é a Justiça a não funcionar', só se pode revoltar contra o domínio da hipocrisia sobre a verdade e a coragem", avisou.
BE defende que 25 de Abril ficará por cumprir se não se encarar "de frente a corrupção"
A deputada Beatriz Gomes Dias foi a escolha dos bloquistas para o discurso na sessão solene comemorativa do 47.º aniversário do 25 de Abril de 1974.
"Abril também não se cumprirá cabalmente enquanto não encararmos de frente a corrupção. A corrupção é o cimento da injustiça económica e da desigualdade. Ela mina a democracia, corrói a justiça e ameaça a coesão social", avisou.
A já anunciada candidata do BE à Câmara de Lisboa nas próximas eleições autárquicas enfatizou que "a corrupção depreda recursos e faz prevalecer as escolhas erradas sobre as escolhas certas", defendendo que ninguém pode "aceitar pagar" preço destas escolhas erradas.
CDS exige que Estado saiba responder a três pandemias
Já o deputado Pedro Morais Soares, do CDS-PP, defendeu que existe um "sentimento generalizado de descrença dos portugueses" com a justiça, e defendeu que o combate à corrupção "terá de ser uma das prioridades".
"Importa que o Estado não ignore o sentimento generalizado de descrença dos portugueses, muitas vezes justificado, relativamente à justiça, urge reformá-la e o combate à corrupção é necessário e indispensável, terá de ser uma das prioridades", afirmou o centrista na sua intervenção.
Apontando que o "Estado tem de saber responder" a três pandemias - de saúde pública, social e económica - Pedro Morais Soares indicou que "o país não aguenta mais nenhuma falha de resposta em qualquer uma delas".
PS: As lições da pandemia, a união para a sustentabilidade e "a fragilização das democracias"
Num discurso em que alertou para "a fragilização das democracias", fenómeno que disse estar a crescer, o cientista e professor universitário e deputado independente Alexandre Quintanilha falou em nome do PS na cerimónia solene.
"O populismo e a demagogia, fortissimamente financiados, ganham força de forma insidiosa. E os Estados Unidos da América escaparam por pouco", observou, numa alusão à turbulenta transição de poder de Donald Trump para Joe Biden na presidência deste país.
Alexandre Quintanilha sustentou que os desafios do presente "são imensos, são globais, complexos e interdependentes" e "exigem uma sólida união de esforços e de recursos". "Ou nos ajudamos mutuamente ou naufragamos todos juntos. É essa também a lição da pandemia. A emergência climática, as desigualdades obscenas, as novas e antigas doenças, a insegurança laboral, a transição demográfica e os conflitos armados não podiam ser mais evidentes", declarou.
Marcelo revisita o passado em nome do futuro
Como é habitual, o Presidente da República concluiu a ronda de intervenções na sessão solene. Este ano, Marcelo Rebelo de Sousa começou "por revisitar a história” para lembrar que existe hoje “uma missão ingrata que é a de julgar o passado com o olhar de hoje, sem exigir aos que viveram esse passado, que pudessem antecipar valores com o seu conhecimento que são agora tidos por evidentes, intemporais e universais".
O chefe de Estado pediu que se faça "história da História" e que se "retire lições de uma e de outra, sem temores nem complexos, com a natural diversidade de juízos própria da democracia".
Recordando os tempos de colonização, o Presidente denotou que o “desenvolvimento, liberdade e democracia”, todos os valores ali celebrados, “sempre foram imperfeitos e, por isso, não plenos", lembrando que nunca foram resolvidos os problemas da "pobreza estrutural de 2 milhões de portugueses e desigualdade pessoais e territoriais", por exemplo. Tudo isso “a pandemia veio revelar e acentuar”.
Posto isto, Marcelo Rebelo de Sousa considerou que as suas reflexões "são atuais porque não há nada como o 25 de Abril para repensar o nosso passado, quando o nosso presente ainda é tao duro e nosso futuro tão urgente e porque a cada passo pode haver a tentação de repensar o passado em argumento da mera movimentação tática ou estratégica, num tempo que ainda é e será de crise na vida e na saúde". Assim, pediu que se encare com "lúcida serenidade o que pode agitar o confronto politico, mas não o que corresponde ao que é prioritário aos portugueses".
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