"Era altura de não falarmos mais por telemóvel e vir cá pessoalmente. Sobretudo porque vos queria agradecer muito o trabalho que fizeram em equipa ao longos destes 15 dias muito difíceis (...)", começou por dizer António Costa, em Odemira, numa declaração em que confirmaria que a cerca sanitária nas freguesias de São Teotónio e Longueira/Almograve iria ser levantada a partir de 00h00 de amanhã, quarta-feira.
Marcelo já se tinha antecipado no anúncio do levantamento da cerca sanitária, mas Costa confirmou-o, dando conta de que o Conselho de Ministros reuniu hoje por via eletrónica para aprovar essa resolução.
Na longa declaração em Odemira, o primeiro-ministro vincou que "a realidade da Covid-19 evidenciou outros problemas sociais conhecidos e problemas sociais que não eram sequer conhecidos".
"Mas a primeira prioridade tem sido e tem de ser a salvaguarda da saúde pública", afirmou, sinalizando que foi nesse contexto que, quando se iniciou o programa de desconfinamento se adotou um conjunto de critérios seguindo as propostas dos especialistas. A "grande vantagem" é que os critérios são objetivos, com base num cálculo matemático. "Como não há bela sem senão, a vantagem do critério ser claro e transparente tem depois a contrapartida de ser cego relativamente às realidades concretas do terreno", notou.
António Costa reconheceu que os critérios são "particularmente penalizadores para concelhos de baixa densidade, porque aí um pequeno número de casos torna-se num número imenso quando calculamos por 100 mil habitantes a 14 dias". Este critério, continuou, "é também ingrato" para concelhos que, para além da sua população recenseada, têm população flutuante.
Por isso, disse Costa, "fomos procurando aplicar, na medida do possível, o critério com ajustamentos". Das 13 freguesias do concelho de Odemira, "era muito claro que o problema se concentrava em duas dessas", lembrou, justificando a decisão da cerca sanitária tomada há 15 dias.
"Não tenho a menor das dúvidas do custo de uma cerca sanitária", fez sobressair o primeiro-ministro, sublinhando que só em "casos extremos" o Governo tem optado por esta solução.
Levantada a cerca sanitária não significa que o problema tenha desaparecido
O chefe do Executivo destacou que nos últimos 15 dias houve uma evolução muito positiva da taxa de incidência em Odemira e que o ritmo de transmissão acompanhará essa tendência.
"E por isso hoje mesmo, o delegado coordenador de saúde do Alentejo Litoral dirigiu à senhora ministra da Saúde a dizer que a maior parte dos resultados positivos encontrados correspondem a cadeias de transmissão já identificadas, não havendo neste momento transmissão comunitária". Pela tendência decrescente dos casos, o delegado de saúde considerou que pode ser levantada a cerca sanitária nas freguesias afetadas.
E o Governo concordou. António Costa anunciou, então, que o Conselho de Ministros reuniu eletronicamente e que "foi decretado o levantamento da cerca sanitária a partir das 24 horas de hoje" nas duas freguesias do concelho de Odemira (São Teotónio e Longueira/Almograve).
"Levantada a cerca sanitária não significa que o problema tenha desaparecido", alertou. "O problema existe. Existe aqui em Odemira, como existe em todo o país. Não vale a pena ninguém ter ilusões de que há concelhos imunes e concelhos onde há Covid. Já todos tivemos com os melhor números e com os piores números".
Aliás, o primeiro-ministro recordou que assim foi com o país no geral. "Tivemos uma primeira vaga em que fomos apontados como um excelente exemplo. Tivemos um mês de janeiro absolutamente trágico, estivemos várias semanas nos piores lugares a nível mundial. E hoje, felizmente, estamos de novo nos melhores lugares a nível mundial".
Costa defendeu que temos de trabalhar para que o país se mantenha nesta posição e que a situação do país reflete a situação dos municípios. "Não vale a pena estigmatizarmo-nos uns aos outros, apontar que este concelho é bom e que aquele é mau. O vírus não conhece fronteiras à escala mundial, quanto mais à escala nacional", atirou.
O primeiro-ministro reafirmou que esta pandemia "revelou muitas das fragilidades que existem no país", assinalando, aliás, que o primeiro capítulo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) se destina a enfrentar as "vulnerabilidades sociais": uma parte dedicada ao reforço do Serviço Nacional de Saúde e outra relacionada com o problema da habitação.
Seguramente poder-se-ia ter feito mais, mas a verdade é que a Covid consumiu muito daquilo que era a disponibilidade dos recursos
"Sabemos que esta realidade não é nova aqui em Odemira, nem nos era desconhecida", continuou. "Convém não esquecer que já em outubro de 2019, uns meses antes de aparecer o Covid, foi aprovada uma resolução de Conselho de Ministros, de muitos anos de trabalho, para se conseguir resolver uma situação específica de habitação neste concelho que tem a ver com um elevado número de trabalhadores sazonais".
De outubro de 2019 para cá, argumentou, "grande parte da nossa atividade foi perturbada pela Covid-19 e pela reorganização dos esforços para responder" à pandemia. Costa reconheceu que "seguramente se podia ter feito mais", mas "a verdade é que a Covid consumiu muito daquilo que era a disponibilidade dos recursos".
Dois protocolos assinados - um para trabalhadores sazonais, outro para residentes no concelho
"Este problema, infelizmente, existe noutras regiões. Temos de fazer este trabalho em todo o país"
O primeiro-ministro destacou também a importância dos dois protocolos assinados hoje em Odemira. "Porque, em primeiro lugar, distingue duas situações que são distintas. E o protocolo que assinamos com a Portugal Fresh, a Luso Morango, (...) visa precisamente que os proprietários promovam a existência de condições de habitação condigna para aqueles que para si trabalham numa base sazonal".
Para esse efeito, o Governo compromete-se a disponibilizar verbas do fundo europeu do desenvolvimento regional. Algo a concretizar "até ao final do primeiro trimestre de 2022".
Quanto à população residente em Odemira, no âmbito das novas políticas de habitação, "temos definido o programa 1.º Direito, que visa criar condições para que cada município desenhe a sua própria estratégia local". Costa afirmou, neste ponto, que o PRR assegura o financiamento a 100%, sem necessidade de contrapartida nacional, seja do Estado, seja do município, para a execução deste programa. "Claro que a verba não é toda para Odemira, é para todo o país, porque em todo o país se vive em habitações sem a dignidade necessária".
O segundo protocolo assinado hoje em Odemira visa precisamente que o município apresente a sua estratégia local de habitação, incluindo nessa estratégia todos aqueles que residem no concelho. O Governo compromete-se a alocar as verbas necessárias, no âmbito do PRR.
O primeiro-ministro enfatizou que o problema da habitação precária não existe só em Odemira. "Este problema, infelizmente, existe noutras regiões. Temos de fazer este trabalho em todo o país".
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