Alexandre Lafayette, que representa ainda o sargento instrutor Rodrigues, criticou, nas alegações finais, as conclusões da procuradora de julgamento Isabel Lima, da procuradora titular do inquerito, Cândida Vilar, assim como as alegações de Ricardo Sá Fernandes (advogado da família das vítimas) e a investigação da Polícia Judiciária Militar dirigida por Vasco Brazão.
À saída do tribunal, Alexandre Lafayette declarou à Lusa e à CMTV que todos os militares acusados deviam ser absolvidos, argumentando que os dois instruendos que morreram devido a um "golpe de calor", em 04 de setembro de 2016, quando se registou uma onda de calor em Portugal que já não se verificava desde 1931.
"Nenhum dos homens que está aqui merece ser punido", disse o advogado, insistindo que a fatal prova zero dos Comandos se verificou numa "semana tão quente em Portugal", só historicamente equiparável a uma data do século passado (1931).
Segundo Alexandre Lafayette, os comandos (força especial) que foram para o campo de tiro de Alcochete "não tinham conhecimento da temperatura", pois não tinham termómetros, nem aparelhos para medir a humidade, negando a versão testemunhal de que o instrutor Rodrigues meteu terra na boca de Hugo Abreu quando este estava debilitado e desidratado ou que tenha havido falta de ajuda e assistência dos instrutores ou outros responsáveis da prova, apesar da dureza da mesma.
"Estes rapazes [comandos] vão parar à República Centro Africana onde têm que enfrentar 40º graus de temperatura à sombra e andar no Afeganistão. O primeiro sargento Rodrigues apanhou 56º graus à sombra no Iraque onde treinou as tropas especiais do Iraque para libertar Mossul", argumentou o advogado, reiterando alegações feitas ao coletivo de juízes, presidido por Helena Pinto e que integra um coronel.
Alexandre Lafayette lamentou a morte dos instruendos, defendeu que o Exército deve indemnizar a família dos jovens, mas reiterou que a dureza da prova dos comandos tem que ser idêntica a uma "situação real", pois as adversidades são constantes em combate.
"Têm que treinar em situações adversas porque vão apanhar situações adversas no Afeganistão, na República Centro-Africana e se calhar no norte de Moçambique onde [na era colonial] estava o quartel dos Comandos dirigido por Jaime Neves", recordou o advogado.
"Devem ser todos absolvidos", insistiu Alexandre Lafayette, alegando que a procuradora "não fez prova absolutamente nenhuma e não contou a verdade em tribunal".
Quanto à procuradora Cândida Vilar, o advogado lembrou que pediu o seu afastamento por parcialidade e que a magistrada foi punida por ter utilizado "termos indecorosos" no mandado de detenção que "deteve injustificadamente" os militares e os obrigou a passar uma noite no presídio militar de Tomar.
Outros dois advogados de defesa pediram também a absolvição dos seus constituintes e alegaram que os militares acusados foram julgados na "praça pública" pelos media.
Na quinta-feira, Ricardo Sá Fernandes, advogado da família de Dylan de Silva e Hugo Abreu, pediu a condenação de oito militares, incluindo o médico e os comandantes da prova e do Regimento dos Comandos.
Segundo o advogado, este julgamento "deve servir para modelar a execução da prova zero", por forma a que "o caso não se repita", sublinhando que, apesar da natural dureza desta prova dos Comandos, há "vários limites que não se podem ultrapassar", como, por exemplo, "as pessoas [instruendos] com castigo serem atirados às silvas".
"Isso é absolutamente gratuito. Isso não é admissível", comentou, assinalando que tais práticas não podem ser recorrentes e admitidas numa instituição militar com o prestígio dos Comandos.
Sá Fernandes pediu a condenação de oito militares que interagiram com os instruendos mortos, mas não exclui que outros dos acusados possam vir também a ser condenados por situações que envolveram outros recrutas que tiveram que ser internados (mas não morreram). Foi, porém, perentório em pedir a absolvição do enfermeiro que esteve na prova, seguindo a mesma posição do MP em julgamento.
Sá Fernandes foi muito incisivo quanto à responsabilidade do diretor da prova (Mário Maia), do comandante do Regimento e do médico militar Miguel Domingues, frisando que a prova devia ter sido suspensa cerca das 14:00 quando estavam cerca de 40 graus de temperatura, havia instruendos a cambalear, outros a vomitar e outros a desistir, não havendo na tenda médica refrigeração, soro gelado nem condições para acolher tantos recrutas debilitados e desidratados devido ao racionamento de água.
Para o advogado, a culpa não pode ser agora dos cabos e devem ser assacadas responsabilidades às chefias militares que dirigiram e executaram a prova zero e que, perante o "descalabro do que estava a acontecer", num dia quente (40º graus) e com desmaios, não ordenaram a imediata suspensão da prova.
O advogado da família de Dylan e Hugo Abreu pediu a condenação de oito militares, incluindo Cristiano Monteiro, Hugo Pereira, Miguel Almeida, Pedro Fernandes e Gonçalo Fulgêncio, que alegadamente interagiram com as duas vítimas mortais.
Em alegações, o MP considerou que o instrutor Ricardo Rodrigues cometeu abuso de autoridade com ofensa à integridade física, com perigo de vida, pedindo que este seja punido com pena de prisão até 10 anos.
A procuradora considerou que cabia ao instrutor Ricardo Rodrigues "zelar pela segurança e saúde dos instruendos", mas que "não agiu" dessa forma, "potenciando o perigo para a vida do instruendo [Hugo Abreu]".
Quanto ao médico Miguel Domingues, também acusado de abuso de autoridade com ofensa à integridade física, o MP pediu uma condenação a cinco anos de prisão, pena passível de ser suspensa na execução.
Quanto ao diretor da prova zero, Mário Maia, a procuradora pediu a sua condenação a uma pena de dois anos de prisão, suspensa por igual período.
Igual pena suspensa de dois anos de prisão foi pedida para os arguidos Pedro Nelson Morais, Pedro Fernandes e Lenate Inácio. Não foi pedida condenação para os restantes arguidos.
Em causa no processo estão os acontecimentos ocorridos durante a primeira prova do 127.º curso de Comandos, tendo o MP acusado 19 militares, por cerca de 500 crimes ligados aos atos praticados naquela instrução.
Dylan da Silva e Hugo Abreu, ambos com 20 anos, morreram e outros instruendos sofreram lesões graves e tiveram de ser internados.
Oito oficiais, oito sargentos e três praças, a maioria instrutores, foram acusados de abuso de autoridade por ofensa à integridade física.
Segundo a acusação, os arguidos atuaram com "manifesto desprezo pelas consequências gravosas que provocaram nos ofendidos".
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