Marcelo Rebelo de Sousa falava no Campus de Carcavelos da Universidade Nova de Lisboa, na abertura de uma conferência sobre responsabilização e democratização das instituições e prevenção da fraude, em que também discursou a procuradora-geral da República, Lucília Gago.
"O desafio da reconstrução económica e social pós-pandémico em Portugal é o desafio das nossas vidas nos próximos longos anos", declarou o chefe de Estado, apelando a um "sentido ainda mais apurado de responsabilidade ética de todos os atores, políticos, económicos, judiciais, militares e educativos".
Retomando mensagens do seu discurso do 5 de Outubro, o Presidente da República disse que a pandemia de covid-19 expôs e agravou "atrasos estruturais" e que esta é uma oportunidade imperdível para tornar o país mais inclusivo, esbatendo "clivagens sociais", "assimetrias regionais" e "divergências geracionais".
Nesta intervenção, o chefe de Estado apontou também a necessidade de se "levar a cabo a modernização do Estado", para fazer de Portugal "um país que sabiamente articula Administração Pública, setor social e iniciativa privada, num desígnio eficaz de geração de competitividade económica".
A reconstrução do país "nunca poderá ser propósito individual, de um partido, de um sindicato, de uma confederação patronal, de um Governo, de um Presidente da República", advertiu, contrapondo que "são precisos todos os portugueses".
Relativamente à execução dos fundos europeus, Marcelo Rebelo de Sousa argumentou que "mais vale prevenir do que remediar" e defendeu que é preciso "criar mecanismos preventivos que permitam atualizar e revitalizar constantemente uma gestão de eficácia, eficiência e transparência e dissuadam potenciais infratores".
"O equilíbrio entre eficiência e rapidez, e garantia da legalidade e prevenção da fraude passa muito pelas regras das contração pública, flexíveis mas não laxistas", referiu.
Segundo o Presidente da República, por outro lado, "a prevenção e o controlo de várias entidades exigem exemplar coordenação", um "trabalho em rede", com "ação concertada de todos os agentes".
"Cumpre definir prioridades e instituir mecanismos que funcionem de prevenção e de identificação dos fatores de risco. É necessário que o sistema político, nele englobando o sistema judiciário, administrativo, mas também a sociedade civil, participem e assumam a definição de prioridades, congreguem esforços e estabeleçam um consenso alargado nesta matéria", acrescentou.
Além disso, exigiu "transparência total acerca dos fundos e sua utilização, em cada momento temporal", considerando que "os portugueses têm direito a exigir que sejam garantidos não só os mecanismos de prevenção e repressão de forma coordenada, mas que isso seja visível, compreensível, detetável, passível de escrutínio pelos cidadãos".
Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que "um menor sucesso" na aplicação dos fundos europeus seria intolerável: "Seria um fracasso da nossa democracia. Não o podemos tolerar e não o vamos tolerar".
"Há mais vida para além do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e até de todos os fundos europeus que são ainda mais até 2027, mas o seu uso rigoroso, eficaz e transparente contribuirá para a vida que iremos ter por muitos anos", insistiu.
Esta conferência foi organizada por um grupo de reflexão constituído em agosto do ano passado, por proposta do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), com duração prevista de dois anos, para desenvolver estratégias de prevenção e combate a fraudes com fundos europeus, em particular aqueles de resposta à crise provocada pela pandemia de covid-19.
O chefe de Estado congratulou-se com a criação deste grupo de reflexão "multidisciplinar e interinstitucional", do qual fazem parte magistrados do Ministério Público e representantes do Organismo Europeu de Luta Antifraude, do Tribunal de Contas, do Banco de Portugal, da Polícia Judiciária e, da Inspeção-Geral das Finanças, entre outras entidades.
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