Foi na segunda-feira que Jéssica, de três anos, morreu vítima de maus-tratos, em Setúbal. A menina, que apresentava vários hematomas, foi transportada para o Hospital de São Bernardo, onde foi sujeita a manobras de reanimação, mas acabou por não resistir aos ferimentos.
Segundo revelou aos jornalistas a avó de Jéssica, Rosa Tomás, os sinais de maus-tratos já seriam evidentes quando a mãe foi buscar a criança a uma alegada ama, na segunda-feira de manhã. No entanto, o alerta às autoridades só foi dado durante a tarde.
A criança terá estado durante cinco dias com a alegada ama, que terá comunicado à mãe da menina que a menor tinha caído de uma cadeira no dia anterior. Terá, por isso, medicado a criança com cinco mililitros do anti-histamínico Atarax, avançou a estação televisiva CNN Portugal.
No entanto, de acordo com as informações recolhidas pela agência Lusa junto de fontes hospitalares e da Polícia Judiciária (PJ), os ferimentos que a criança apresentava iam muito além do que poderia ter acontecido devido a uma queda de uma cadeira.
Dívida na origem do crime
A mãe da menina teria problemas com o companheiro, recorrendo, por isso, a rezas, de acordo com o mesmo meio noticioso. Ao longo do tempo, a suspeita terá exigido cada vez mais dinheiro, até que a mulher deixou de lhe pagar. Na verdade, segundo João Bugia, coordenador da Polícia Judiciária (PJ) de Setúbal, a mãe da menina foi "ardilosamente enganada" e levada a entregar a filha por conta de uma dívida de 400 euros que tinha para com a suspeita, que a convenceu a levar Jéssica “a sua casa com o pretexto de que a menina poderia ficar a brincar com a neta, da mesma idade, enquanto conversavam sobre a dívida”.
No entanto, o responsável revelou que não foi permitido à mãe da menina levar a criança de volta para casa, tendo esta, nos cinco dias em que permaneceu na casa dos entretanto detidos, sofrido maus-tratos severos que, diz a CNN Portugal, a mulher terá testemunhado através do telefone. Ainda assim, apesar de algumas suspeitas iniciais de eventuais agressões sexuais contra a criança, esses indícios não foram confirmados na autópsia, realizada na quarta-feira.
O coordenador indicou ainda que os três suspeitos, detidos em Leiria depois de terem fugido para uma casa abandonada, serão presentes a tribunal na sexta-feira, dia em que ocorre o funeral da menina. A alegada ama, de 52 anos, o marido desta, de 57 anos, e uma filha do casal, de 27 anos, são suspeitos dos crimes de rapto, extorsão, ofensas à integridade física, e homicídio qualificado.
A mãe da menina e o padrasto foram também ouvidos pela PJ, mas não foram constituídos arguidos. Pediram, contudo, proteção policial, por temerem represálias por parte da família dos alegados raptores, de acordo com a CNN Portugal.
Jéssica esteve referenciada pela CPCJ entre 2019 e 2020
A Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ) confirmou, esta quinta-feira, que a CPCJ de Setúbal tinha a cargo um processo de promoção e de proteção da criança, entre fevereiro de 2019 e janeiro de 2020.
"Este processo foi sinalizado pelo Núcleo Hospitalar de Crianças e Jovens em Risco de Setúbal, por a criança estar exposta a ambiente familiar que poderia colocar em causa o seu bem-estar e desenvolvimento", apontou a entidade, em comunicado a que o Notícias ao Minuto teve acesso.
Além disso, a CPCJ "realizou a avaliação diagnóstica e deliberou aplicar uma medida de promoção e proteção da criança que, uma vez não aceite pelos pais, originou de imediato o envio do processo ao Ministério Público em janeiro de 2020”. O organismo rematou que, após esta data, não voltou a haver qualquer outra comunicação de perigo à CPCJ de Setúbal.
Jéssica era a mais nova de seis irmãos. De acordo com a CNN Portugal, a menina era a única a cargo da mãe. Quatro dos filhos estarão com familiares, ao passo que a mais velha foi institucionalizada a pedido da avó materna.
Ao mesmo meio noticioso, o pai biológico da menina, que vive nos Países Baixos, revelou que, no início do mês, Jéssica já apresentava hematomas, justificados pela mãe por uma queda de uma cadeira.
Ânimos acesos no velório
O velório da menina foi marcado pela presença da Polícia de Segurança Pública (PSP), devido a confrontos entre os familiares e ao clima de revolta contra a mãe da criança, esta quinta-feira.
Na cerimónia, que decorreu na capela da Nossa Senhora da Anunciada, a avó paterna de Jéssica mostrou-se bastante exaltada, tendo saindo a braços com o filho, o pai biológico da menina, acusando a nora de ser uma "assassina".
No local esteve também uma ambulância, já que a mãe da menina ter-se-á sentido mal. A avó paterna terá também sido assistida.
Mais tarde, uma mulher terá mesmo invadido o local e esbofeteado a mãe da criança.
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