A arguida, de 55 anos, que tinha domicílios profissionais em Soure e Coimbra, incorre ainda na pena acessória de proibição do exercício de função de administradora judicial e de fiduciária, de acordo com o despacho de acusação, de 13 de fevereiro, a que a agência Lusa teve acesso.
À mulher, que também foi advogada, o MP atribui o desvio de 396.863,24 euros de contas bancárias de massas insolventes para três contas pessoais, dinheiro que gastou e geriu como bem entendeu.
Os processos de insolvência são, na esmagadora maioria, de pessoas singulares, de norte a sul do país e Açores.
Para o MP, a acusada sabia que, no exercício da função em cada uma das insolvências elencadas no despacho, "lhe estava vedada a prática de quaisquer atos que, para seu benefício ou de terceiros, fossem suscetíveis de perigar as liquidações de ativos ou os rendimentos cedidos pelo devedor, devendo orientar sempre a sua conduta para a maximização da satisfação dos interesses dos credores".
E, enquanto fiduciária, "deveria manter separado do seu património pessoal todas as quantias oriundas de rendimentos cedidos pelos devedores".
O MP sustentou que a antiga administradora judicial, ao desviar aquele montante para contas pessoais, misturou "valores próprios e alheios" de que se apropriou, "atuando como a sua proprietária, em prejuízo de massas insolventes e dos credores das insolvências", e, dessa forma, "impossibilitando que os credores recebessem atempadamente todos os valores a que tinham direito, obrigando-os a esperar anos para obtenção de parte do valor obtido com a liquidação e, assim, serem pagos na proporção que lhes caberia".
Por outro lado, a arguida beneficiou, junto de três bancos, "de uma situação patrimonial mais benéfica e que não correspondia à verdade", conseguindo, por essa via, posição mais privilegiada para "poder beneficiar de condições de concessão de crédito mais favoráveis", como ocorreu na compra de um carro.
Dos 396.863,24 euros supostamente retirados de contas de massas insolventes, o MP pede que seja declarado perdido a favor do Estado o montante de 369.725,52 euros. A arguida repôs um total de 20.597,72 euros e teria direito a remuneração variável em dois processos.
O documento acrescenta que a jurista elaborou um plano que passava por se aproveitar do seu papel enquanto administradora judicial para se apropriar de valores pertencentes a massas insolventes, passando a efetuar depósitos, transferências ou a determinar a entrega do produto da venda do ativo nas suas contas pessoais.
No despacho de acusação, do Departamento de Investigação e Ação Penal Regional de Coimbra, lê-se que o processo de insolvência mais antigo em que foi nomeada é de 2005 e o mais recente de 2020.
A menor quantia de que se terá apropriado de uma massa insolvente foi 304 euros; a maior soma 129.947,11 euros.
Destituída em quase todos os processos de insolvência mencionados, sendo que em vários deu origem a inquérito-crime, no despacho final são, contudo, apresentadas situações em que alegadamente a administradora judicial praticou factos após a destituição, ou, por exemplo, depois de ter sido suspensa preventivamente ou quando se encontrava a cumprir sanção acessória de interdição temporária de atividade, estas duas determinadas pela Comissão para o Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça.
Num dos casos, quando confrontada pelo tribunal com a falta de dinheiro na conta da massa insolvente de um casal, a arguida, por não ter dinheiro numa conta pessoal, transferiu para esta valores de outras massas insolventes, que depois tornou a transferir para uma nova conta, entretanto aberta pela administradora que lhe sucedeu, da massa insolvente do casal.
Entre outras situações elencadas pelo MP, há uma transferência de dinheiro para uma pessoa "desconhecida dos autos de insolvência" ou, após ser nomeada administradora num processo, de 2012, de Vila Nova de Gaia e ter recebido 757,50 euros como adiantamento pelo Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, a arguida "nunca praticou qualquer ato processual até 29 de março de 2017".
Aquele valor foi considerado indevidamente pago e a arguida notificada para os restituir, inclusive pessoalmente, mas não o fez, segundo o MP.
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