Gouveia e Melo alerta para "pressão psicológica" na Marinha e faz apelo

O chefe do Estado-Maior da Armada considera que a falta de efetivos na Marinha está a criar uma "pressão psicológica interna grande" e aconselha o poder político a olhar para as classes sem poder reivindicativo, como os militares.

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© Marinha Portuguesa

Lusa
27/12/2023 06:28 ‧ 27/12/2023 por Lusa

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chefe do Estado-Maior da Armada

Em entrevista à agência Lusa, por ocasião do segundo ano do seu mandato, que se cumpre hoje, o almirante Gouveia e Melo avisa que "um sistema político democrático equilibrado tem que conseguir perceber que quem não tem o direito a manifestar-se deve ser protegido". Se não o fizer, "pode causar uma distorção tão grande que pode ser perigoso para o sistema", alerta.

"Se o sistema democrático não perceber isto, também não percebe o que é democracia", conclui o chefe da Marinha.

Gouveia e Melo reconhece, por outro lado, que a Marinha tem "cerca de 1.500 efetivos a menos", dos aproximadamente 8.000 de que deveria dispor, que "fazem muita falta".

"Não podemos estar permanentemente a sacrificar as mesmas pessoas, exigir das mesmas pessoas, porque também há um processo de saturação natural. Uma coisa é exigir durante um período, outra coisa é exigir para sempre", desabafa o almirante chefe da Armada, afirmando sentir "muito orgulho" no seu pessoal.

Lembra que a marinha enfrentou os fogos, a pandemia e as operações "tudo em simultâneo", o que gerou uma "pressão psicológica interna grande" que o ramo tenta "aliviar e mitigar".

No entanto, este responsável militar lembra que "as Forças Armadas são profissionais e muito qualificadas" pelo que não podem recrutar recursos humanos não qualificados.

Questionado sobre o poder reivindicativo dos militares, quando comparado com o de classes profissionais como os professores, os médicos ou os funcionários da administração pública, o almirante que foi responsável máximo pela vacinação durante a pandemia responde que "as exigências que se pedem aos militares devem ser justamente recompensadas e não injustamente", mas alerta para desequilíbrios nos pilares do sistema democrático que podem gerar problemas no futuro.

"Esse desequilíbrio já causou perturbações noutras sociedades e nós vivemos um momento crítico das democracias, devemos estabilizar o que são os pilares da democracia e esses pilares devem estar estáveis", defende, avisando o poder para a existência de "muitos oportunistas que gostariam de desestabilizar esses pilares com falsas promessas, falsas soluções, soluções rápidas que podem ser contagiosas em determinados cenários".

Para concluir o raciocínio, Gouveia e Melo alerta que "a democracia na Europa pode ser colocada em causa no futuro". Diz mesmo que "dentro do bloco europeu há sociedades com sintomas quase de esquizofrenia não democrática", o que reforça a necessidade de defesa dos pilares do sistema democrático, nos quais as Forças Armadas se inserem.

"Temos de defender a democracia e temos de a defender todos os dias. Com bom senso e com equilíbrio de todos, mas ter cuidado em não deixar que uma parte da sociedade que não se pode manifestar, estatutariamente, para proteção da própria sociedade, não passe a ser um 'underdog' e a parte desfavorecida dessa sociedade só porque não se pode manifestar", defende.

Quanto às remunerações nos ramos, o chefe do Estado-Maior da Armada entende que são baixas, apesar de entender que "as remunerações têm de ser vistas num contexto nacional", cabendo aos militares "alertar para o problema", mas não resolvê-lo.

"Sou militar há 44 anos. Se tivesse sete vidas, eventualmente gastava uma vida a fazer outra coisa, mas voltava a fazer nas outras seis vidas a mesma coisa. Ser militar é muito mais que ganhar um ordenado, é uma vocação e é uma vida que nos enche com experiências que não existe em nenhum outro sítio", salienta, concluindo: "tem de haver vocação e sem vocação, por mais dinheiro que se pusesse, as pessoas não vinham para cá".

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