"É verdade que o presidente do PAIGC [Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde, no poder] mostrou publicamente desagrado por aquilo que alguns podem interpretar como uma excessiva familiaridade entre as autoridades portuguesas e as autoridades Bissau-guineenses. Eu, pessoalmente, não tenho essa interpretação. Eu penso que as autoridades portuguesas têm tido a preocupação de respeitar as autoridades que estão em posto, estão em exercício em cada momento, em cada país", afirmou.
O deputado do PS referia-se à acusação de Simões Pereira, em declarações à Lusa a 05 de dezembro, em que o líder do PAICG e presidente do parlamento guineense, dissolvido um dia antes pelo Presidente, Umaro Sissoco Embaló, considerava que Portugal se deixa usar pelo chefe de Estado guineense, Umaro Sissoco Embaló, "em vez de contribuir para o reforço da estabilidade, para a construção de instituições democráticas".
"Volta e meia, por tuta e meia, o Presidente [Sissoco Embaló] evoca conversas com [o Presidente da República de Portugal] Marcelo Rebelo de Sousa, com o primeiro-ministro, António Costa, e com outras autoridades [portuguesas]. E fá-lo com o intuito de evocar algum paralelismo com aquilo que acontece em Portugal e que, portanto, se é normal em Portugal, é normal na Guiné-Bissau", afirmou então Simões Pereira à agência Lusa.
"Quando (...) as autoridades portuguesas ouvem essa menção e não fazem questão de denunciar e de se distanciar dessa realidade, tornam-se cúmplices daquilo que está a acontecer neste momento" na Guiné-Bissau, acrescentou.
No dia seguinte à acusação Simões Pereira, em comunicado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros português repudiou essas declarações.
"O Governo português repudia as declarações do Presidente da Assembleia Nacional Popular da República da Guiné-Bissau quanto à posição de Portugal sobre a atual crise política no país", lê-se no comunicado, em que se destaca que, "respeitando a plena soberania daquele país, Portugal tem cooperado com todas as instituições e autoridades guineenses - bilateralmente, mas também no quadro das Nações Unidas, da União Europeia e da Comunidade de Países de Língua Portuguesa - para a consolidação da estabilidade, democracia e Estado de Direito, bem como a promoção do desenvolvimento na Guiné-Bissau".
A Guiné-Bissau vive uma situação de tensão e instabilidade, após a detenção, em 30 de novembro, do ministro da Economia e Finanças, Suleimane Seidi, e do secretário de Estado do Tesouro, António Monteiro, ambos dirigentes do PAIGC, no âmbito de um processo relacionado com pagamentos a empresários.
Os acontecimentos precipitaram-se com efetivos da Guarda Nacional a irem buscar os dois governantes às celas da Polícia Judiciária, a que se seguiram confrontos entre esta força militarizada e efetivos do batalhão do Palácio Presidencial.
Na segunda-feira, 04 de dezembro, após uma reunião do Conselho de Estado, o Presidente anunciou a decisão de dissolver o parlamento.
Simões Pereira qualificou essa decisão como um golpe de Estado constitucional, tendo em conta que nos termos da Constituição guineense a Assembleia Nacional Popular não pode ser dissolvida nos 12 meses posteriores à sua eleição.
Depois de salientar que Domingos Simões Pereira esteve recentemente em Lisboa no congresso do Partido Socialista, como líder de um "partido irmão" e que "merece todo o (...) respeito", Porfírio Silva frisou que, "no fundo", o que está a ser feito é o que deve ser feito a diferentes níveis: "Estado é Estado, Governo é governo, povo é povo, partido é partido, são coisas diferentes e nós não podemos atropelar uma relação por causa das outras".
Porfírio Silva dá como exemplo a situação com o Brasil, quando o país tinha Jair Bolsonaro na Presidência.
"Não há a mais pequena dúvida de que nenhum dos principais responsáveis das instituições em Portugal tem simpatia por aquilo que foi a ação política de Jair Bolsonaro no Brasil. E, no entanto, não deixamos de ter as relações institucionais que se exigem entre países irmãos, porque os governantes mudam, os países ficam e os povos ficam", defende.
"E nós temos sempre em vista essa relação formal e institucional que tem que ser respeitada. Isso não nos pode, é óbvio, impedir de ter uma visão própria e de a expressar acerca do exercício que cada um faz do seu mandato e sermos capazes de assinalar quando as coisas não estão a correr de forma que nos parece constitucional e legal", concluiu.
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