A posição consta de um despacho num processo cível do Estado contra o ex-banqueiro e a sua mulher, na sequência da coima de 3,7 milhões de euros aplicada pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão. Neste caso, o Ministério Público (MP) tinha pedido para serem prestadas declarações de parte pelos réus - um meio de prova que visa a confissão judicial.
"Confirma-se a impossibilidade do réu em comparecer em tribunal por motivo de doença a fim de prestar depoimento de parte, não tanto por razões físicas, uma vez que a sua deslocação e presença em audiência de julgamento é possível -- ainda que careça de ajuda de terceiras pessoas que o auxiliem em termos materiais (...) --, mas antes em termos de utilidade e finalidade deste meio de prova", pode ler-se no despacho de julho do tribunal de Cascais.
De acordo com o documento a que a Lusa teve acesso, o MP entendia que, apesar de os relatórios das perícias neurológicas a que o ex-banqueiro foi sujeito reconhecerem a existência da doença e o seu previsível agravamento, continuava a haver interesse na produção de prova em audiência, uma vez que o depoimento seria livremente aproveitado pelo tribunal.
No entanto, o tribunal salientou que a valorização desse depoimento enquanto meio para uma confissão só seria possível se as declarações fossem inequívocas e sem vícios.
Destacou também que as avaliações médicas realizadas não garantiam que as declarações fossem totalmente fidedignas perante a degradação cognitiva de Ricardo Salgado, que, segundo uma das perícias citadas no despacho, apresenta um quadro de "demência moderada", o segundo estádio de doença mais grave entre quatro possíveis e que prevê a dependência de terceiros para algumas atividades básicas.
"Entende-se que a situação de saúde comprovadamente apresentada pelo réu constitui um motivo válido e suficiente para concluir pela impossibilidade do depoimento de parte ser prestado em sede de audiência de julgamento", refere o documento, que, por outro lado, autorizou o depoimento da mulher, Maria João Salgado, e agendou a audiência de julgamento para 20 de novembro.
Ricardo Salgado, de 80 anos, foi condenado em junho a seis anos e três meses de prisão no Caso EDP por corrupção e branqueamento. Além desta condenação, o ex-banqueiro viu também ser-lhe aplicada uma pena de oito anos de prisão no processo separado do caso Operação Marquês por abuso de confiança, estando as duas decisões em fase de recurso.
A defesa do ex-banqueiro impediu a prestação de declarações em julgamento nos dois casos, apesar de Salgado ter comparecido quando foi chamado pelo Juízo Central Criminal de Lisboa.
O ex-presidente do BES e do GES é ainda arguido em vários processos-crime, tendo já sido acusado pelo MP no caso BESA, no processo do saco azul do GES, no caso de corrupção ligado ao Banco do Brasil e no processo das ligações do GES à Venezuela.
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