Do primeiro encontro negocial entre Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos, na semana passada, ficou a certeza de que o PS não aceitaria as propostas do Governo para o IRC e IRS Jovem. Com pressões vindas da Direita e da Esquerda para que o Orçamento do Estado (OE) fosse viabilizado, passando também pelo Presidente da República, o primeiro-ministro garantiu que iria apresentar uma proposta "irrecusável" aos socialistas. Essa proposta teve por base o programa do PS e, apesar de não ter sido suficiente para convencer Pedro Nuno, permitiu a Montenegro ganhar margem negocial com a oposição.
Antes deste segundo encontro em São Bento, que foi mais curto do que o primeiro e durou menos de meia hora, os dois líderes estiveram frente a frente no debate quinzenal na Assembleia da República.
O tema central do debate não era o OE, mas foi incontornável. O Governo garantiu que "não quer eleições antecipadas" e voltou a falar numa proposta "irrecusável" que iria fazer à oposição.
O líder da Oposição não demorou a responder a Montenegro, garantindo que "estava de acordo na vontade de ter um Orçamento viabilizado e na vontade de evitar eleições antecipadas. Esse objetivo é partilhado por ambos".
As pressões foram intensas de parte a parte e, no final do debate, que durou três horas, Pedro Nuno deixou críticas a Montenegro, mesmo antes da tão esperada reunião. À saída, exigiu "respeito", deu o exemplo de que na 'Geringonça' isso sempre aconteceu, e considerou "inaceitável" o que se passou no Parlamento.
Recuo no IRS Jovem e menos corte no IRC. Como Montenegro ganhou margem para negociar
Eram 18h40 quando o secretário-geral do PS chegou ao Palácio de São Bento. Saiu às 19h10, com uma pasta na mão e a garantia de que não iria fazer declarações sobre o assunto.
Já o primeiro-ministro falou ao país, às 20 horas, depois desta segunda reunião, para elencar as aproximações, com vista à 'luz verde' para o Orçamento.
"Acabei de apresentar um quadro de aproximação com o PS nas matérias fiscais relativas quer ao IRC, quer ao IRS dos mais jovens", afirmou, explicando que no que diz respeito ao IRC foi apresentada uma "proposta de diminuição de metade da taxa inicialmente prevista - ou seja, de apenas um ponto percentual".
"O Governo fixou como objetivo atingir os 17% de taxa de IRC, ao contrário do que tínhamos inicialmente proposto que era de 21% para 15%, e fazê-lo no mesmo período", explicou Luís Montenegro, acrescentando que a única decisão que está definida é "baixar um ponto percentual em 2025, o que quer dizer descida de 21% para 20%".
Desta forma, o Governo "abdica de metade da proposta de diminuição" para o próximo ano, enquanto para os restantes anos, a definição exata será tomada nos respetivos orçamentos.
Montenegro referiu ainda que propuseram medidas em três eixos: Habitação, Pensões e o Serviço Nacional de Saúde (SNS). A proposta, explicou ainda o primeiro-ministro, "acolhe as preocupações da habitação e alojamento estudantil, da valorização das pensões e dos mecanismos de atração de médicos no SNS".
No final, sublinhou que "há todas as razões para o PS viabilizar o Orçamento do Estado". "É minha convicção que a reflexão do secretário-geral do PS deverá conduzir à viabilização do Orçamento. Assim, os políticos e a política servir o interesse das pessoas", apontou.
O IRS Jovem do PS e a redução do IRC para metade
A proposta de IRS Jovem que o primeiro-ministro apresentou ao PS segue o modelo já existente, mas alarga o benefício a todos os jovens independentemente das habilitações e aumenta de cinco para 13 anos o período de isenção.
No que toca ao IRC, Montenegro apresentou a Pedro Nuno Santos uma contraproposta sobre a redução que, em vez de cair para 17% no final da legislatura, decresce para 15%, sendo que em 2025 o corte é de um ponto percentual.
Perante estas alterações às duas medidas vistas como linhas vermelhas para o PS, o primeiro-ministro afirmou ainda que não ficou marcada nova reunião com o líder socialista, mostrando-se disponível para "aprimorar" a contraproposta, mas avisando que a margem é cada vez mais reduzida tendo em conta a aproximação e cedência feitas.
Já na sede do PS, no largo do Rato, Alexandra Leitão tornava públicas as primeiras reações do lado dos socialistas, deixando claro que a contraproposta do Governo para as negociações do Orçamento do Estado "não é irrecusável".
Entretanto, uma fonte socialista assegurava à agência Lusa que será apresentada um contraproposta "em breve", que vai ser entregue ao Executivo liderado por Luís Montenegro.
Questionado sobre essa contraproposta à saída do largo do Rato, onde estava desde a reunião que teve ao final da tarde com o primeiro-ministro, Pedro Nuno Santos voltou a sublinhar que quer "evitar eleições e queremos evitar um chumbo do orçamento".
"Daremos o nosso contributo", assegurou.
"Debate a dois" desagrada restantes partidos
Depois da reunião entre os dois líderes seguiram-se as reações dos partidos. O presidente da Iniciativa Liberal criticou a proposta que o primeiro-ministro apresentou ao secretário-geral do PS para a viabilização do Orçamento, considerando que é cada vez mais difícil distinguir a Aliança Democrática e os socialistas.
De acordo com Rui Rocha, na "novela" entre PS e Governo, o primeiro-ministro apresentou propostas sobre o IRC e o IRS jovem que "o afastam cada vez mais da necessidade de mudança que o país precisa".
Do lado do Governo, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, em entrevista à CNN Portugal, defendeu que a contraproposta apresentada pelo Executivo foi encontrada em prol das "prioridades" para o país.
Já o Chega criticou Montenegro por considerar que o próximo OE vai ser uma "extensão do programa socialista".
À Esquerda, a líder parlamentar do PCP, Paula Santos, viu as negociações como uma "discussão de recursos para grupos económicos". Enquanto Rui Tavares, do Livre, também criticou "esta forma de negociar" e Inês Sousa Real, do PAN, lamentou o "debate a dois".
Leia Também: "Queremos evitar eleições e queremos evitar um chumbo do orçamento"