Gisèle Pelicot falou em tribunal. "Não cabe a nós ter vergonha, é a eles"

Marido de francesa está a ser acusado não só de a drogar como violar e ainda convidar outros homens para fazer o mesmo.

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© CHRISTOPHE SIMON/AFP via Getty Images

Natacha Nunes Costa
23/10/2024 12:08 ‧ 23/10/2024 por Natacha Nunes Costa

Mundo

Caso Pelicot

A francesa Gisèle Pelicot, de 72 anos, que foi drogada pelo marido e violada, enquanto estava inconsciente por cerca de 50 homens ao longo de nove anos, entre 2011 e 2020, foi ouvida pela primeira vez esta quarta-feira, em tribunal.

 

Segundo a BBC, Gisèle, que prescindiu desde o início do processo do anonimato, começou por dizer que quer que as mulheres violadas saibam que "não cabe a nós ter vergonha, é a eles [violadores]".

"Quero que todas as mulheres que foram violadas digam: 'Se a senhora Pelicot fez isso, eu também posso'. Não quero que elas tenham mais vergonha", acrescentou, referindo-se ao seu pedido por um julgamento aberto e para que os vídeos das alegadas violações sejam exibidos.

Nas últimas semanas, Gisèle ouviu o testemunho de várias mulheres, mães e irmãs dos réus a dizerem que os acusados eram "homens excepcionais". "É exatamente como quem eu achava que tinha em casa", realçou a vítima, vincando que os violadores não se encontram apenas em "estacionamentos escuros, à noite".

"Os violadores também se encontram no seio da família, entre amigos", lembrou.

Sobre o seu estado anímico, Gisèle Pelicot admitiu que está "completamente destruída" e a tentar reconstruir-se, apesar de não saber se a sua "vida inteira" será "suficiente para entender" como é que o agora ex-marido foi capaz de tais atos.

"Marido atencioso. Era uma mulher feliz e realizada"

A certa altura, adianta a BBC, a francesa dirigiu-se ao ex-marido e chamou-lhe de "Sr. Pelicot". "Gostaria de poder chamar-te de Dominique. Vivemos juntos durante 50 anos, eu era uma mulher feliz e realizada", salientou, frisando que nunca duvidou do companheiro.

"Eras um marido atencioso e cuidadoso e eu nunca duvidei de ti. Nós compartilhámos risos e lágrimas", acrescentou, com a voz embargada.

Gisèle declarou ainda que se sentia "sortuda" por ter Dominique ao seu lado quando sofria de problemas de saúde, que agora sabe estavam relacionados aos medicamentos que ele lhe dava para a poder violar.

"Estou a tentar entender como é que este homem, que para mim era perfeito, pode fazer isso. Como é que ele me traiu desta forma? Como é que deixaste estes estranhos entrarem no nosso quarto? [...] Sempre te elevei o mais alto possível, em direção à luz, mas escolheste as profundezas mais escuras da natureza humana. Tu fizeste essa escolha", atirou.

Recorde-se que Dominique admitiu ter recrutado homens online, durante quase uma década, para violar a mulher enquanto ela estava sob o efeito de sedativos pesados ​​e medicamentos para dormir, que ele administrou em segredo.

Ao longo de quase dois meses de testemunhos em tribunal já foram ouvidas dezenas de homens acusados do crime. No entanto, a maioria negou ter violado a mulher, uma vez que pensavam que a francesa estaria a dormir ou a jogar um jogo e não que tivesse inconsciente.

O julgamento está previsto continuar até ao dia 20 de dezembro.

Vídeos das alegadas violações foram descobertos em 2020, após a polícia francesa ter detido Dominique Pelicot por estar a filmar mulheres por baixo da saia num supermercado.

Os homens acusados enfrentam uma pena de prisão que pode chegar aos 20 anos. No total, 49 homens estão acusados de violação, um de violação na forma tentada e um de assédio sexual. Outros cinco estão ainda acusados de posse de imagens de abuso infantil. 

Leia Também: Caso Pelicot. Giséle vai ser ouvida em tribunal esta quarta-feira

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