"Queremos demonstrar que não reconhecemos legitimidade à servidão administrativa que a secretária de Estado emitiu", afirmou Nelson Gomes da associação Unidos em Defesa de Covas do Barroso (UDCB).
A secretária de Estado da Energia, Maria João Pereira, emitiu um despacho, publicado em 06 de dezembro em Diário da República, que autoriza a constituição de servidão administrativa, pelo prazo de um ano, o que permite à empresa Savannah aceder a terrenos privados para a prospeção de lítio.
Em Covas do Barroso, concelho de Boticas, distrito de Vila Real, juntaram-se hoje residentes desta aldeia e limítrofes, de concelhos vizinhos e outros vindos de diferentes pontos do país.
Em tarjas e cartazes escreverem mensagens como "O tempo da servidão acabou", "O povo do Barroso não quer minas", "Os nossos emigrantes mandam dizer não às minas" ou "stop, lítio aqui não".
Algumas das palavras de ordem gritadas foram "Não à mina, sim à vida" e "Barroso não se vende, se ama e se defende".
O ponto de encontro dos manifestantes foi no largo do Pelourinho de Covas do Barroso, tendo seguido depois a pé, de carro e em trator para a zona onde decorrem as prospeções mineiras, perto de Romaínho.
Nelson Gomes disse que os residentes afetados pela servidão administrativa se "sentem invadidos" e que o projeto da mina do Barroso está a ser "imposto à força".
Benjamim Gonçalves, 65 anos, tem terrenos inseridos na servidão administrativa onde disse que já foram derrubadas árvores como pinheiros e medronheiros, mas acrescentou que a empresa já lhe "entrou em outros terrenos onde não tem direto à servidão".
"A gente vê tudo destruído (...) Destroem-nos o verde para fazer poeira", lamentou o agricultor.
João Loureiro, 55 anos e agricultor, vive em Romaínho, numa zona próxima da mina e tem também terrenos incluídos na servidão administrativa.
"A minha é a casa mais próxima da mina, está a cerca de 500 metros. O Estado não nos apoia, estamos pior do que no tempo do Salazar. Isto é uma coisa do outro mundo, não é uma coisa normal", frisou, lamentando perder "o direito" aos seus terrenos.
Maria Loureiro, 57 anos, tem terrenos onde a empresa pretende fazer a prospeção. "Isto é muito mau porque eu vivo a 100% da agricultura. São terrenos grandes que me fazem falta para o pasto, lenha e outras coisas", afirmou a produtora de vacas que disse ainda temer perder o direito ao subsídio que recebe, podendo até ter de devolver o dinheiro.
Maria Loureiro disse que a vida nestas aldeias, nos últimos tempos, tem sido de uma grande instabilidade e que, aqui, se perdeu a paz.
"Não vamos poder estender uma peça de roupa, com o pó da mina os animais podem ficar doentes e não é nada viável para a agricultura, não foi isto que nós escolhemos", sublinhou
Também a residir em Romaínho, António Teixeira, viveirista e produtor de gado de 44 anos, e disse que a exploração mineira coloca "em causa o pasto dos animais".
"A mina não nos traz nada de bom, está-nos a destruir a aldeia, o ambiente, a floresta, a nossa rentabilidade do dia-a-dia. Se fazem a mina temos que parar a agrícola", frisou.
Maria do Rosário Pires, 82 anos, veio Braga de propósito para se juntar à manifestação porque está preocupada com o futuro da sua terra natal, onde viu já terrenos incluídos na lista de expropriações divulgada pela Savannah.
O presidente da Câmara de Boticas, Fernando Queiroga, esteve uma vez mais junto da população nesta manifestação, repetindo que a servidão administrativa "não deveria ter sido concedida da forma como foi".
"E depois ainda veio agravar mais o abuso que está a ser feito por parte da empresa relativamente a outros terrenos que não têm servidão administrativa. Estou aqui para mostrar apoio `minha população e ao meu concelho", referiu.
Nelson Gomes, da UDCB, adiantou ainda que se está a estudar uma forma de contestar a servidão administrativa quer seja impedindo os trabalhos quer processos em tribunal.
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) viabilizou ambientalmente a exploração de lítio na mina do Barroso emitindo uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável em maio de 2023, integrando um conjunto alargado de condicionantes.
A empresa já disse que prevê iniciar a produção em 2027.
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