Educadores de infância, assistentes sociais, auxiliares educativas ou técnicos superiores são alguns dos trabalhadores hoje concentrados no Largo Trindade Coelho, em Lisboa, num protesto para exigir a valorização salarial, o respeito pelos horários de trabalho ou a aplicação do acordo de empresa celebrado no final de 2023, contou à Lusa Joel Canuto, dirigente sindical do Sindicato dos Trabalhadores em Funções Publicas e Sociais do Sul e Regiões Autónomas (STFPSSRA).
Além da manifestação, o sindicato convocou também uma greve de 24 horas que Joel Neto disse não conseguir ainda fazer um balanço. O sindicalista criticou a decisão de impor serviços mínimos que, em alguns serviços, significaram "ter hoje mais trabalhadores do que é habitual" num dia de trabalho normal.
A falta de funcionários é precisamente um dos motivos que leva à sobrecarga laboral e à "dificuldade em marcar férias ou folgas", contaram à Lusa vários manifestantes. Mas não é o único: Os baixos salários e a quase inexistente progressão na carreira continuam a ser as principais razões da revolta.
Liliana Rodrigues, Ana Gonçalves e Sónia Teixeira são auxiliares de educação numa creche na zona de Lisboa e os seus casos são elucidativos do que dizem ser as injustiças de quem trabalha para a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML).
Ganham as três o mesmo ordenado, pouco mais de 900 euros, mas Sónia trabalha na Santa Casa há 20 anos, Liliana há 13 e Ana começou apenas no ano passado.
"Recebemos pouco mais do que o salário mínimo, mas temos de pagar impostos, por isso a diferença acaba por ser de poucos euros", lamentou Sónia Teixeira que foi interrompida pela amiga Liliana para salientar a importância do trabalho que desempenham.
"Quando as educadoras não estão na sala somos nós que lá estamos e somos nós que temos de dar a cara, caso aconteça alguma coisa", sublinhou Liliana Rodrigues.
Mas há casos ainda mais complicados. Felismina Marques é educadora de crianças e jovens numa casa de acolhimento desde 2005 e ao longo dos últimos 20 anos já viu colegas serem ameaçados e até agredidos por menores que chegam à instituição por decisão judicial ou pela mão das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens.
"São casos muito complicados. Lembro-me de uma altura em que uns adolescentes nos ameaçaram com facas e durante quatro meses não havia facas às refeições para comer", recordou a técnica superior, acrescentando o facto de a falta de pessoal levar a que, por vezes, os turnos da noite sejam garantidos por apenas um funcionário.
Ao cansaço de trabalhar mais horas do que o previsto nos contratos, há histórias de quem "está na Santa Casa há 20 ou 30 anos e nesse período teve aumentos salariais que não chegam a 10 euros", acusou Felismina Marques, reconhecendo que no seu caso o pior é ainda não ter sido aplicado o acordo de empresa celebrado há pouco mais de um ano.
"Se o acordo fosse cumprido podia estar a ganhar mais 600 euros", disse Felismina Marques, que tem um salário mais elevado do que muitas manifestantes presentes no protesto.
Mafalda Canalhos, por exemplo, precisa de dois empregos para conseguir pagar as contas. A educadora de infância trabalha na Santa Casa da Misericórdia de Lisboa desde 2007 e até há pouco tempo ganhava apenas 750 euros.
"Nós somos responsáveis por uma população vulnerável, mas nós é que somos cada vez mais a comunidade vulnerável", lamentou Mafalda, que não percebe como é que a empresa viu aumentar os lucros mas os salários da maioria dos trabalhadores continuam inalterados.
"Em 2024, a Santa Casa teve um saldo positivo de 27,9 milhões, ou seja muito acima dos 10,4 milhões de euros esperados, mas mantêm os congelamentos nas progressões das carreiras. A larga maioria não tem progressões e os trabalhadores estão a perder cerca de dois a três salários por ano", acusou o sindicalista Joel Canudo, lembrando que os únicos trabalhadores que têm tido aumentos são os que recebem o salário mínimo.
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