A greve dos motoristas esteve em destaque no espaço de comentário semanal de Luís Marques Mendes na antena da SIC. "Comparado com a greve de abril, julgo que esta greve ocorre em muito piores condições", salientou desde cedo o comentador, que de seguida explicou que, neste "'David contra Golias', o Governo sai por cima, já os sindicatos de motoristas dificultaram a sua própria posição.
Para tal, houve "três erros de palmatória" que contribuíram para este contexto mais adverso para os motoristas.
"Primeiro, um erro de análise: comparado com a greve de abril, que teve a simpatia da opinião pública, esta greve é altamente impopular". "Segundo, a greve do tempo da Páscoa teve um efeito de surpresa e novidade: apanhou o Governo desprevenido. Agora já não". E, finalmente, a greve anterior "tinha uma justificação imediata: tratar dos aumentos salariais para 2019 e 2020. Agora estamos a falar de aumentos para 2021 e 2022, e sobretudo quando as partes se comprometeram a fazer negociações até ao final do ano".
"Foi um erro de análise convocar esta greve", sintetizou o comentador.
Para além disto, houve também "falta de inteligência negocial" da parte das estruturas sindicais, considera Marques Mendes.
Oportunidades perdidas... e aproveitadas
O sindicato teve esta semana duas excelentes oportunidades para recuar, desconvocar a greve e sair por cima", apontou o ex-governante.
Uma das hipóteses foi quando, no início da semana que agora findou, "o Governo quis mediar o conflito e apresentou uma proposta no sentido de fazer uma convenção coletiva de trabalho". O sindicato "poderia ter saído por cima, e ganhador". Mas "teve uma postura má, de intransigência e teimosia".
Depois, na quarta-feira, quando foram decretados os serviços mínimos, "o sindicato poderia ter tido uma grande oportunidade de sair por cima, dizendo que o Governo esvaziou a greve e fazia-se de vítima". Teria desconvocado a greve, mudando um pouco 'os pratos da balança' em relação ao Governo, "e deixava esse trunfo para uma outra oportunidade". Mas não foi isso que sucedeu.
De resto, Marques Mendes considera que houve ainda outra 'má jogada' da parte dos motoristas de matérias perigosas, que foi "recorrer aos tribunais", pensando que estes iriam anular a decisão dos serviços mínimos. "Mas quem percebe um bocadinho destas matérias sabe que isso na prática era quase impossível". Acabaram por recorrer à Justiça "e perderam".
O sindicato dos motoristas de matérias perigosas, "sem prejuízo de ter razão em muitas das suas reivindicações, seguiu o caminho errado. E com isso tem a opinião pública contra, o Governo contra e a Justiça contra. E corre mesmo o risco de fazer uma greve e sair dela sem nenhum ganho de causa, o que significará, usando um ditado popular, entradas de leão, saídas de sendeiro", alertou.
O Governo, por seu lado, mostrou-se "impreparado" e "amador" na greve de abril. Agora, já preparado, o Executivo de António Costa "foi muito profissional e assertivo". "No plano do discurso, dramatizou a situação quanto baste sem exagerar, acicatando os ânimos da opinião pública contra os camionistas, que não o perceberam e se portaram como patinhos feios e caíram na esparrela".
Depois, "o Governo foi habilidoso - e costuma ser muito hábil neste momentos - quando se propôs a mediar o conflito", que é privado. "Mostrou abertura, diálogo, equilíbrio... os sindicatos responderam com intransigência e o Governo marcou pontos".
Finalmente, "foi muito eficaz ao decretar os serviços mínimos. É certo que são mais [serviços] máximos do que mínimos". Mas "como a opinião pública acha a greve impopular, compreendeu". E a Justiça acabou por "dar cobertura", com o parecer a dar razão ao Governo e os sindicatos a perder as providências cautelares em tribunal.
Para Marques Mendes, "o Governo teve a habilidade de transformar um problema em oportunidade". Além do mais, mesmo com o seu 'teatro', "nestas circunstâncias qualquer governo faria isso". Já os motoristas, por seu lado, partem para uma greve num contexto frágil.
A greve dos motoristas de matérias perigosas tem início esta segunda-feira e vai manter-se por tempo indeterminado.