O diploma do Parlamento que despenaliza a morte medicamente assistida, que necessitava de passar pelo 'crivo' de Belém, foi enviado para o Tribunal Constitucional (TC). O Presidente Marcelo decidiu pedir a fiscalização preventiva da constitucionalidade.
O envio para o TC foi justificado pelo chefe de Estado pelo facto de o diploma recorrer "a conceitos excessivamente indeterminados" na "definição dos requisitos de permissão da despenalização da morte medicamente assistida".
O diploma, que tinha sido aprovado no dia 29 de janeiro, seguiu na quinta-feira da Assembleia da República para o Palácio de Belém e foi enviado pelo Presidente da República para o Tribunal Constitucional no mesmo dia.
Saliente-se que esta é a segunda vez que Marcelo Rebelo de Sousa recorre ao Tribunal Constitucional desde que chegou a Belém, em 9 de março de 2016.
Assim que começaram a surgir as primeiras iniciativas legislativas sobre o tema, o Presidente manifestou que deveria haver um amplo e longo debate na sociedade. Marcelo não revelou, porém, qual o seu posicionamento sobre a eutanásia e recusou-se inclusive a antecipar qual seria a sua decisão - promulgação, veto ou envio para o Tribunal Constitucional - sem ter 'nas mãos' o documento.
O texto aprovado na Assembleia da República prevê que deixe de ser punida a "antecipação da morte medicamente assistida" verificadas as seguintes condições: "Por decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento intolerável, com lesão definitiva de gravidade extrema de acordo com o consenso científico ou doença incurável e fatal, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde".
Perante um pedido de fiscalização preventiva, o Tribunal Constitucional deve pronunciar-se no prazo de 25 dias, que pode ser encurtado pelo Presidente da República, invocando motivo de urgência.
Se o Tribunal declarar alguma norma inconstitucional, o diploma deverá ser vetado pelo Presidente da República e devolvido, neste caso, ao Parlamento, que poderá reformulá-lo expurgando o conteúdo julgado inconstitucional ou confirmá-lo por maioria de dois terços.
Se nenhuma norma for declarada inconstitucional, uma vez publicada a decisão do Tribunal Constitucional, o chefe de Estado tem vinte para o promulgar ou exercer o direito de veto, solicitando nova apreciação à Assembleia da República numa mensagem fundamentada.
Da Esquerda à Direita, as reações
Os partidos do arco da governação não tardaram a reagir ao envio do diploma para fiscalização preventiva. Do lado do PS, pela voz de Isabel Moreira, o partido considerou natural a decisão do Presidente e adiantou que aguarda "com tranquilidade" a pronúncia do Tribunal Constitucional.
"Tranquilidade" foi também a palavra usada pelo Bloco de Esquerda (BE) na reação ao envio do diploma para o TC. O líder da bancada parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, sublinhou que "a partir de agora, temos um calendário preciso para a resposta do TC e, por isso também, um calendário preciso para que, finalmente, possamos ter esta lei em vigor no nosso país".
Apontando que Marcelo é "muito conservador em matérias de costumes", o PAN lamentou que o Presidente não se tenha pronunciado sobre o tema da eutanásia durante a campanha eleitoral, como fizeram os seus oponentes.
O PEV, por sua vez, está convicto que o diploma que despenaliza a morte medicamente assistida está de acordo com a Lei Fundamental, mas adiantou estar desde já disponível no Parlamento para expurgar normas que eventualmente sejam consideradas inconstitucionais.
O CDS congratulou-se com o envio para o Tribunal Constitucional do diploma, considerando que contém normas que ferem a Constituição e classificando de "imoral" a sua aprovação no contexto pandémico.
"A dúvida é óbvia e consistente em função do que diz a Constituição e da apreciação ao direito à vida e do facto de o diploma ser relativamente vago", considerou Telmo Correia, na quinta-feira.
A Iniciativa Liberal defendeu que era "expectável" o envio para o Tribunal Constitucional do diploma que despenaliza a eutanásia, mas disse João Cotrim Figueiredo confiar na conformidade à Lei fundamental.
André Ventura, do Chega, lamentou a decisão de Marcelo, considerando que o Presidente deveria ter optado pelo "veto político. Do ponto de vista da oportunidade política, não é o momento de se regular a morte assistida quando estamos numa luta para salvar vidas todos os dias".
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