"Este é um caso de enorme gravidade, pelo número de vítimas que teve, mas não é caso único, sendo que os moradores denunciam que há muitas casas habitadas por pessoas nas mesmas circunstâncias e todas as semanas as organizações de defesa das pessoas migrantes relatam situações semelhantes", disse a vereação do Bloco de Esquerda (BE).
Na noite de sábado, um incêndio deflagrou num prédio na Rua do Terreirinho, no bairro lisboeta da Mouraria, provocando dois mortos, de nacionalidade indiana, e 14 feridos, todos já com alta hospitalar.
"Este incêndio ocorreu numa habitação onde viviam 22 pessoas em clara sobrelotação", refere a vereação do BE, em comunicado, indicando que enviou esta tarde um requerimento urgente ao presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), o social-democrata Carlos Moedas, com cinco questões, inclusive se conhecia este caso.
A Lusa questionou a autarquia, inclusive o gabinete de Carlos Moedas, sobre a dimensão do problema da sobrelotação das habitações, aguardando uma resposta.
No requerimento, a vereadora única do BE, Beatriz Gomes Dias, questiona ainda que condições de alojamento estão a ser oferecidas às pessoas migrantes, se o município tem conhecimento de casos semelhantes e se está a articular-se com o Governo para aumentar as respostas na crise da habitação.
"Está a CML disponível, tendo em conta o aumento das receitas de IMI [Imposto Municipal sobre Imóveis] e IMT [Imposto sobre a Transmissões Onerosas de Imóveis] e o maior orçamento de sempre, a aumentar a dotação dos programas de recuperação dos bairros municipais, a reativação do Programa de Renda Acessível, nomeadamente o pilar 100% público, e os programas de apoio às pessoas sem-abrigo?", interroga.
O Bloco apresenta um conjunto de 12 considerandos, destacando que "a sobrelotação das habitações radica num problema de habitação que afeta pessoas migrantes e não migrantes que vivem na cidade de Lisboa".
Apesar de o problema de habitação ser geral, alerta, as pessoas migrantes têm a agravante de que "muitas não têm a situação regularizada em Portugal, o que impede a celebração de contratos de arrendamento e/ou candidaturas aos programas municipais de arrendamento".
"A alternativa destas pessoas e destas famílias à sobrelotação é a rua, visto que não existem programas nacionais e municipais de habitação que deem resposta à crise na habitação", indicam os bloquistas, lembrando que o direito à habitação está consagrado na Constituição da República Portuguesa.
O BE considera que o Governo tem falhado na política de habitação, com medidas que têm favorecido a especulação imobiliária, desde os 'vistos gold' ao regime para nómadas digitais.
"A Câmara Municipal de Lisboa também tem falhado no combate à crise na habitação. Os Programas de Renda Acessível que estavam em curso foram parados por Carlos Moedas, a recuperação dos bairros municipais tem menos orçamento do que no mandato anterior, um regulamento que restrinja mais alojamento local não está preparado e as políticas de 'housing first' para as pessoas em situação de sem-abrigo foram congeladas", contesta.
No fim de semana, a Proteção Civil de Lisboa informou que o prédio na Mouraria onde ocorreu o incêndio era habitado essencialmente por cidadãos indianos, com 25 pessoas - 24 residentes e um não residente.
O fogo provocou 22 desalojados, além de causar a morte de dois cidadãos indianos, um dos quais um jovem de 14 anos.
Nessa altura, a Proteção Civil de Lisboa verificou que viviam neste prédio dois cidadãos belgas, dois argentinos, dois portugueses, três bengalis e 15 indianos.
O alerta para o incêndio foi dado às 20:37 de sábado e o fogo foi declarado extinto às 21:15, tendo as chamas só atingido o rés-do-chão do prédio, segundo o Regimento de Sapadores Bombeiros.
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