"O Governo português -- enquanto órgão de soberania responsável pela condução da política externa --, respeitando por inteiro a soberania do Brasil, através do primeiro-ministro, António Costa, e do ministro dos Negócios Estrangeiros, não pode deixar de se demarcar, pelas vias diplomáticas adequadas mas também publicamente, da afirmação de que a União Europeia, a NATO e os Estados Unidos estão a fomentar e a estimular a guerra", afirmou Rangel numa declaração política feita hoje no Porto.
Segundo sustentou, "com a mesma franqueza e, até, desassombro com que o Presidente do Brasil fala da cumplicidade e intervenção da União Europeia e procura suavizar ou omitir a responsabilidade do regime de Putin, o primeiro-ministro António Costa deverá afirmar a posição de Portugal a favor do direito internacional, da integridade territorial da soberania ucraniana e da paz".
Luiz Inácio Lula da Silva defendeu no sábado, no final de uma visita à China, que os EUA devem parar de "encorajar a guerra" na Ucrânia e a União Europeia deve "começar a falar de paz".
"Os Estados Unidos devem parar de encorajar a guerra e começar a falar de paz, a União Europeia deve começar a falar de paz", disse o chefe de Estado brasileiro aos jornalistas, em Pequim, antes de partir para os Emiratos Árabes Unidos.
Embora salientando a "importância fundamental" da "oportuna e útil" visita de Lula da Silva a Portugal, dentro de alguns dias, e garantindo que o PSD tudo fará para que seja um "sucesso" e permita "relançar fortemente" os laços comuns entre os dois países, Paulo Rangel considerou que António Costa "tem de tomar uma posição pública e formal" face às "repetidas tomadas de posição do Estado brasileiro, através do seu mais alto magistrado".
"Depois destas declarações, o Estado português - que é membro da União Europeia e que não está, obviamente, envolvido em nenhuma guerra, sem deixar de estar ao lado da Ucrânia e dos Estados vizinhos da Ucrânia - tem de tomar uma posição. [...] Esta visita não pode ser feita com um silêncio sobre esta matéria quando se acusa Portugal de estar em guerra e de estar a fomentar a guerra, quando não é isso que Portugal tem feito", disse.
"Não podemos pactuar nem contemporizar, impávidos e serenos, com as declarações reiteradas que omitem e esquecem que há um Estado agressor e um Estado agredido, que há uma violação da integridade territorial da Ucrânia que rasga princípios sagrados do direito internacional, que a Federação russa e o regime de Putin têm cometido sucessivos crimes de guerra, massacrando o povo ucraniano e destruindo as suas cidades e a sua economia", sublinhou.
Para o vice-presidente do PSD, "não pode aceitar-se a impostação de que a Ucrânia deve perder a Crimeia ou de que o Presidente Zelenski é responsável pelo conflito" e "não se pode ficar indiferente perante o ataque bárbaro de uma autocracia a um Estado independente, soberano e democrático".
"Mais: o primeiro-ministro e o ministro dos Negócios Estrangeiros [João Gomes Cravinho] têm obrigação estrita de contraditar a condenação pública de que a União Europeia é hoje parte com intervenção direta na guerra. Não ser indiferente perante uma invasão bárbara que viola flagrantemente o direito internacional e que ameaça a independência e integridade dos Estados e povos nossos aliados não é, nunca foi e não será 'entrar' ou 'participar em guerra'", reiterou.
Paulo Rangel afirmou que o PSD "toma boa nota" das votações do Brasil de condenação da invasão no âmbito das Nações Unidas e que "nenhum país gostaria mais do que Portugal que o Brasil fosse realmente o mediador e o promotor da paz na guerra da Ucrânia, como potência mundial emergente que é", mas considerou que "isso não pode ser feito com a condenação dos ucranianos" e considerando "que eles, a União Europeia e a NATO fomentaram a guerra, porque isso não corresponde à verdade".
Questionado pelos jornalistas, Rangel reconheceu ainda que as declarações de Lula da Silva "não ajudam" à aproximação entre o Brasil e a União Europeia, processo no qual Portugal "tem tido um papel muito importante, nomeadamente na tentativa de relançar o acordo entre a União Europeia e o Mercosul".
"É evidente que, com uma posição tão extremada de condenação da União Europeia naquilo que é uma coisa óbvia -- as fronteiras da União Europeia estão sob risco [...] -- estas declarações não ajudam", disse.
[Notícia atualizada às 14h07]
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