O ex-secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, foi esta quarta-feira presente na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP, numa audição que durou sete horas, para dar esclarecimentos sobre a indemnização de meio milhão de euros paga à ex-administradora da companhia, Alexandra Reis.
Ao longo das audições na Comissão Parlamentar de Inquérito, que arrancaram em 29 de março, tem sido abordada a intervenção do ex-secretário de Estado noutras questões polémicas, como no caso da alteração de um voo do Presidente da República, por conveniência política.
Recorde-se que Ourmières-Widener, então CEO da TAP, enviou um e-mail a Hugo Mendes a pedir a sua opinião sobre um pedido que recebeu da agência de viagens, tendo o então governante respondido que era importante manter o apoio político de Marcelo Rebelo de Sousa, considerando que era o "principal aliado" do Governo - mas que poderia tornar-se o "pior pesadelo".
Na audição da ex-presidente executiva na comissão de inquérito, a 4 de abril, ficou ainda a saber-se que Hugo Mendes teria dado ordens à gestora para não falar com nenhum outro ministério a não ser o das Infraestruturas.
Hugo Mendes começou a sua intervenção, esta quarta-feira, declarando que "a TAP é uma história de sucesso", porém "de sacrifícios, suor e lágrimas", que está "em reestruturação profunda" e é "um organismo com uma ferida profunda, aberta e a sangrar todos os dias, que exige cuidados de todos os que a querem salvar".
Eis os principais pontos da intervenção de Hugo Mendes na CPI à TAP:
- Alteração de voo de Marcelo Rebelo de Sousa. "Comentário que partilhei com ex-CEO foi infeliz"
A propósito de um e-mail enviado sobre a alteração da data de um voo do Presidente da República, o ex-secretário de Estado reconheceu que foi infeliz a opinião que partilhou com a ex-presidente executiva da TAP, mas assegurou que não deu qualquer instrução para alterar a data.
"Penalizo-me pelo comentário que partilhei com ex-CEO (...) não devia ter emitido nem partilhado aquela opinião tanto no seu conteúdo como na sua forma (...) Foi sem dúvida infeliz, mas eu não dei nenhuma instrução", afirmou Mendes.
- Indemnização de Alexandra Reis. "Pareceu-me passível de ser aceite"
Sobre o valor dos 500 mil euros pagos à antiga administradora da TAP, Hugo Mendes declarou que não negociou o valor que, na sua opinião, lhe pareceu "passível de ser aceite". No entanto, justificou que correspondiam a um terço da proposta inicial de Alexandra Reis.
Relativamente à saída de Reis da TAP, Hugo Mendes afirma que o ministério aceitou o pedido da Christine Ourmières-Widener para substituir Alexandra Reis para "empoderar" a sua autoridade e "dar as melhores condições que a líder executiva reclamava para executar o plano de reestruturação".
- Pressões externas sobre a TAP? Foi criado "um anel de segurança"
O ex-secretário de Estado assegurou que o seu ministério "sempre criou um anel de segurança" em torno da TAP e nunca cedeu a qualquer pressão externa ou fez pressão interna sobre a companhia aérea.
"A atitude do 'quero, posso e mando', do 'agora que o país pagou pela empresa a TAP tem de voar para todo o lado', ou, na memorável frase do doutor Rui Rio 'como a TAP é pública e funciona com dinheiros públicos, tenho de exigir', esta nunca foi a postura do Ministério das Infraestruturas e da Habitação", assegurou, assumindo que sempre fez tudo para "proteger a TAP de todas as pressões para que estivessem garantidas as melhores condições para cumprir o plano de reestruturação, de cuja rigorosa execução depende o seu futuro".
- Afirmações de António Costa? "Resultados da TAP são excelentes"
Hugo Mendes recusou, entretanto, comentar as críticas feitas pelo primeiro-ministro - que considerou gravíssimo o e-mail que Hugo Mendes enviou à presidente executiva da TAP sobre a alteração do voo de Marcelo Rebelo de Sousa e que teria obrigado à sua demissão na hora - deixando apenas duas notas a este tema.
"Se eu fui membro do Governo foi porque o líder do Governo aceitou e, já agora, o Presidente da República também", apontou Hugo Mendes, lembrando que Costa afirmou que as condições para manter um membro no Governo se medem pelos seus resultados.
"Ouvi o senhor primeiro-ministro há umas semanas a dizer que as condições para um membro do Governo se manter num Governo se medem pelos resultados e os resultados da TAP são excelentes", rematou.
- Fundos Airbus? Governo "não escondeu nada a ninguém"
Questionado pelo deputado do PCP Bruno Dias sobre quando teve conhecimento dos chamados fundos Airbus, Hugo Mendes revelou que teve conhecimento formal das diligências que a administração da TAP começou a fazer junto da Airbus em 2022.
"Não tinha informação concreta, específica, rigorosa que pudesse levantar bandeiras de risco", referiu, admitindo ter "ouvido dizer" que existiam fundos antes de ter tido conhecimento formal. Contudo, assegurou que o Governo que integrou "não escondeu nada a ninguém" porque foi quem enviou o processo para o Ministério Público.
- Saída de Alexandra Reis? "Pus-me na mão de advogados"
O ex-secretário de Estado admitiu que se colocou "na mão dos advogados" na negociação da saída de Alexandra Reis da TAP e que o Ministério agiu "de boa fé", respeitando "o princípio da responsabilidade dos gestores".
O ex-governante reiterou ainda que nunca foi sinalizado pela empresa qualquer risco inerente ao acordo que permitiu o pagamento da indemnização de 500.000 euros a Alexandra Reis e que, numa reunião no dia 1 de fevereiro do ano passado, o assessor jurídico da TAP apresentou "a possibilidade" de se pagar aquele montante pela saída antecipada da então administradora, mas não foi discutido o enquadramento jurídico do acordo.
[Notícia atualizada às 21h54]
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