Vários médicos a exercerem nos serviços de saúde primários disseram à Lusa que foram informados que, a partir de 01 de janeiro, os portugueses com morada fiscal fora de Portugal serão considerados "inativos" e terão de pagar pelos cuidados recebidos.
Numa pergunta dirigida ao Governo, o grupo parlamentar do BE sobre os motivos por trás da decisão, perguntando se não considera a medida "totalmente contrária à lei de bases da saúde e, portanto, ilegal".
"Com esta decisão, que pode entrar em vigor no início de 2024, o Governo tem apenas um objetivo: martelar os números de utentes sem médico de família. Ora, esse objetivo de lavar a cara do Governo não se pode sobrepor aos direitos de todas e todos os cidadãos, muito menos se pode sobrepor ao direito à saúde. Deve, por isso, ser abandonado de imediato. Por ser ilegal e poder ter consequências graves tal intenção deve ser imediatamente abandonada. Todas e todos os cidadãos portugueses são beneficiários do SNS e devem ter pleno acesso ao mesmo. Invenções governativas que amputem esse direito são inadmissíveis", lê-se no documento.
Com a decisão, defende o BE, o Governo vai privar os emigrantes do "direito a um SNS universal e gratuito que é também deles" usando "um artifício" para lidar "com uma notória incapacidade de resolver o problema de acesso aos cuidados de saúde", nomeadamente no que diz respeito aos 1,7 milhões de utentes sem médico de família, e para "disfarçar o rotundo falhanço da sua política de saúde".
"O problema é que este artifício do Governo para mascarar números que são vergonhosos vai ter impactos muito negativos na vida de milhares e milhares de portuguesas e portugueses que, ainda que residentes no estrangeiro, são utentes do SNS. Segundo esta decisão, estes cidadãos portugueses podem deixar de ter médico de família e podem ter de pagar na íntegra todos os atos de saúde que venham a fazer no SNS", criticou o BE.
O Bloco considera que esta é "uma decisão inqualificável", questionando quantos portugueses emigrados não continuam a ser acompanhados pelos seus médicos de família, aproveitando as vindas a Portugal para esse efeito, e quantos não optam por ser tratados em Portugal, até por não terem acesso a sistemas de saúde de qualidade nos países onde residem.
"Porque pretende o Governo que estes beneficiários do SNS -- porque é isso que eles também são -- sejam privados do direito de acesso à saúde, sejam privados de um sistema universal, geral e gratuito? Porque pretende o Governo que estes portugueses -- que devem ser cidadãos e utentes de pleno direito -- passam a suportar na integra todos os cuidados de saúde no SNS? É algo sem pés nem cabeça. Não respeita o que a lei de bases diz sobre quem é beneficiário do SNS e sobre os seus direitos", criticou ainda o BE.
A classificação dos emigrantes portugueses como "inativos" no Serviço Nacional de Saúde (SNS) está a revoltar os representantes desta comunidade, que criticam sobretudo a falta de informação sobre a medida, que arranca em janeiro.
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