"O IHRU, e este é um terreno do IHRU, comportou-se como o pior dos proprietários privados. Chegou aqui, afixou um edital numa parede e disse que têm um mês para sair porque estas casas vão ser despejadas e demolidas. Ou seja, é o próprio Estado que olha para um bairro onde vivem 400 pessoas, tantas crianças que, caso contrário, estariam na rua, e que olha para este bairro e só vê chapa", criticou a coordenadora bloquista.
Mariana Mortágua visitou esta tarde o Penajoia, um bairro autoconstruído num terreno propriedade do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), que cresceu durante a pandemia de covid-19 para albergar famílias que ficaram sem quaisquer alternativas habitacionais.
Em 12 de junho, o IHRU informou os moradores do bairro, através de um edital afixado nas paredes, que pretende a partir de quarta-feira proceder à "remoção de construções, bens, produtos ou resíduos dos terrenos" dos quais é proprietário e onde se ergue o bairro.
Na semana passada, o IHRU assegurou que não serão realizadas desocupações de casas no bairro em Almada sem que sejam providenciadas previamente alternativas habitacionais adequadas aos respetivos agregados familiares, mas os moradores manifestaram-se hoje receosos com o que poderá acontecer na quarta-feira.
Rodeada de alguns dos moradores do bairro, incluindo várias crianças, Mortágua acusou o IHRU de não ver "seres humanos, vidas, famílias, crianças ou percursos de vida" mas apenas "um bairro para destruir".
"Foi a mobilização destes moradores e o facto de se terem juntado e ter criado protagonistas que permitiu que o IHRU tivesse aparentemente recuado. Foi possível ir à Câmara Municipal. O IHRU diz que, enfim, poderá não demolir algumas, poderá fazer uma limpeza. Não há certezas", alertou.
Realçando que a "crise habitacional em Portugal tem várias facetas", a bloquista criticou ainda o facto de a Câmara Municipal de Almada, liderada pela socialista Inês de Medeiros, "lavar as mãos" e responsabilizar apenas o IHRU pela situação.
Mariana Mortágua e uma comitiva do BE, que incluiu a deputada bloquista eleita por Setúbal, Joana Mortágua, visitaram o bairro e ouviram os receios dos moradores, que vivem em casas com escassas condições habitacionais, construídas num terreno de terra batida.
Muitos moradores não vão trabalhar na quarta-feira com receio de que, com as casas vazias, o IHRU decida demoli-las, explicou Rosana Silva, que vive no bairro há cinco anos e que "não tem solução" sem ser viver neste local.
"A luta ainda não terminou porque não sabemos a partir de amanhã o que vai acontecer. (...) O grande dia 10 está a chegar, amanhã, e depois o que vai acontecer?", questionou.
Rosana negou qualquer tipo de intenção de violência esta quarta-feira e pediu apenas "soluções adequadas" para estes moradores, avisando que "a crise habitacional é real em Portugal".
"Não estamos aqui porque queremos, ou porque aqui estamos bem, é porque não temos opções. Estas barracas aqui foram a nossa saída das ruas, para não ir para a rua com as crianças, mas não é porque queremos ou porque nos sentimos bem em viver numa barraca, toda a gente que ter um sítio digno para viver", alertou.
Criticando "os jogos" entre a autarquia e o IHRU, que afirmou que passam responsabilidades entre si, Rosana confessou que esta noite nenhum morador vai dormir descansado.
Atualmente, o bairro de Penajoia alberga cerca de 160 agregados, num total de 350 pessoas, entre as quais cerca de 60 crianças, seis bebés recém-nascidos, 17 adolescentes e mais de vinte pessoas idosas, doentes crónicos e mulheres grávidas, segundo um comunicado dos moradores e de associações e coletivos solidários.
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