Em declarações aos jornalistas, em Lisboa, no dia do início do julgamento do caso BES, o deputado do PCP António Filipe frisou que os "graves problemas detetados no funcionamento do sistema bancário estão muito longe de estar corrigidos".
"E, com o sistema com que estamos confrontados quer de supervisão - que está cada vez mais distante, na medida em que está cada vez mais entregue a instâncias supranacionais - e, com uma regulação do sistema bancário cada vez mais entregue à União Europeia (UE), nós estamos confrontados com a possibilidade de situações como estas, e descalabros bancários à custa dos cidadãos e dos contribuintes, puderem continuar a acontecer", advertiu.
António Filipe defendeu que "o caso do BES é um exemplo que nunca deve ser esquecido daquilo que foi uma má prática bancária, resultante da gestão privada da banca, da forma como o poder político tem sido conivente com este tipo de situações".
"E que, do nosso ponto de vista, infelizmente estão muito longe de estar ultrapassadas e de podermos ficar descansados relativamente a situações como estas não voltarem a acontecer", frisou.
O deputado do PCP disse que o caso do BES "é porventura o caso mais grave de corrupção no setor bancário e privado" em Portugal e manifestou a esperança de que "o processo judicial se conclua, haja um apuramento de responsabilidades e os responsáveis sejam punidos, neste caso criminalmente, que é isso que está em causa".
No entanto, António Filipe disse que também é importante recordar "que houve responsabilidades políticas gravíssimas neste caso", criticando a atuação do então governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, mas também dos responsáveis governativos da altura, referindo-se em particular ao ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, ao ex-vice-primeiro-ministro Paulo Portas e à ex-ministra das Finanças e atual candidata a comissária europeia Maria Luís Albuquerque.
"E do próprio Presidente da República Aníbal Cavaco Silva que, provavelmente, muitas pessoas se lembrarão que, poucos dias antes do descalabro do BES, ter declarado publicamente que as pessoas tinham de ter confiança que o banco era sólido e que, portanto, veio procurar dar confiança às pessoas num caso em que, poucos dias depois, se revelou que era um descalabro imenso", criticou.
O deputado do PCP quis ainda salientar que, devido ao caso do BES, "os contribuintes sofreram na pele, e com as medidas impostas do tempo da 'troika', as consequências nefastas deste gravíssimo escândalo de corrupção, com milhares de milhões de euros que os contribuintes portugueses tiveram de suportar".
O julgamento do processo BES/GES começou hoje às 09:30 no Juízo Central Criminal de Lisboa, 10 anos após o colapso do Grupo Espírito Santo (GES), num caso com mais de 300 crimes e 18 arguidos, incluindo o ex-banqueiro Ricardo Salgado.
Ricardo Salgado é o principal arguido do caso BES/GES e responde em tribunal por 62 crimes, alegadamente praticados entre 2009 e 2014.
Entre os crimes imputados contam-se um de associação criminosa, 12 de corrupção ativa no setor privado, 29 de burla qualificada, cinco de infidelidade, um de manipulação de mercado, sete de branqueamento de capitais e sete de falsificação de documentos.
Segundo o Ministério Público, a derrocada do GES terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.
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