"O sistema descoberto possui dois planetas com massas semelhantes a Saturno, e com períodos orbitais de apenas nove e 35 dias", afirma a UC, numa nota enviada hoje à agência Lusa.
Esta configuração, adianta, origina variações -- "observadas pela primeira vez a partir da superfície da Terra" -- nos "períodos orbitais devido às interações gravitacionais entre os dois planetas".
Desde a descoberta, em 1995, do primeiro exoplaneta (planeta em torno de uma estrela que não o Sol), que "o número de novos planetas conhecidos não para de aumentar", sublinha a UC, referindo que "a procura de sistemas com vários planetas em torno da mesma estrela é particularmente interessante, uma vez que eles interagem entre si e permitem determinar mais propriedades sobre o sistema".
Quando existe um único planeta em torno da estrela, ele tem um período orbital bem definido, que não varia com o tempo.
Sempre que o planeta passa em frente da estrela, "podemos detetar uma pequena diminuição na luz desta, fenómeno apelidado de 'trânsito planetário'. Os trânsitos ocorrem em intervalos de tempo regulares, permitindo que o período orbital do planeta seja medido com bastante precisão", explicam, citados pela UC, os autores do estudo, liderado pelo Instituto de Astrofísica de Paris (França).
"Se a estrela hospedar um segundo planeta, as interações gravitacionais entre os dois planetas originam pequenas modificações das suas órbitas" e, como consequência, "os trânsitos planetários ocorrem um pouco adiantados ou atrasados entre duas passagens em frente da estrela, um fenómeno chamado de 'variações do tempo de trânsito' [TTV na sigla em inglês]", acrescentam.
Embora previstas do ponto de vista teórico, as TTV permaneceram sem ser observadas durante muito tempo, apesar de inúmeras pesquisas com telescópios terrestres.
Na maioria dos casos, "as interações gravitacionais levam a TTV de apenas alguns segundos ou menos, que são muito difíceis de detetar" -- o telescópio espacial Kepler foi "o primeiro a conseguir medir a TTV num sistema planetário, em 2010". Seguiram-se outras medições, mas sempre através de telescópios espaciais como aquele.
A observação de TTV exige instrumentos muito precisos e simultaneamente planetas de grande massa que se encontrem em órbitas relativamente próximas.
Nesta descoberta, Alexandre Correia, investigador do Centro de Física da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, esteve envolvido na análise das interações entre os planetas.
"Verificámos com simulações numéricas que o sistema é estável até inclinações de 35 graus, e que as TTV observadas estão de acordo com o que seria de esperar para este tipo de sistema", relata o cientista.
O sistema planetário WASP-148 agora encontrado "foi descoberto usando unicamente telescópios terrestres", salienta a equipa de investigadores.
"O primeiro planeta, com uma massa semelhante a Saturno e um período orbital de apenas cerca de nove dias, foi observado pela primeira vez pelo instrumento SuperWASP, instalado no Observatório Roque de los Muchachos em La Palma, nas Ilhas Canárias, Espanha".
A partir de 2014, a estrela foi igualmente observada com o espectrógrafo de alta resolução SOPHIE, instalado no Observatório de Haute-Provence, em França, que mede as variações na velocidade da estrela.
A combinação destas observações levou à conclusão de que a estrela WASP-148 hospeda um segundo planeta, igualmente com uma massa semelhante a Saturno e um período orbital de cerca 35 dias.
Ao contrário do primeiro planeta a nove dias, o segundo planeta a 35 dias não transita em frente da estrela.
"Isto deve-se ao facto de os dois planos orbitais serem diferentes. Não é possível ainda saber exatamente qual a inclinação entre as duas órbitas, mas simulações em computador sobre o sistema WASP-148 mostram que para o sistema permanecer estável a inclinação poderá ser no máximo 35 graus", esclarece Alexandre Correia.
A razão entre os dois períodos orbitais é próxima de quatro, pelo que, refere a UC, "as interações gravitacionais entre os planetas são amplificadas por um fenómeno conhecido por ressonância. Como as massas dos planetas são elevadas, este sistema é o candidato ideal para observar as TTV a partir da Terra".
Usando pequenos telescópios localizados nas Ilhas Canárias e em França, verificou-se que os trânsitos ocorrem com um quarto de hora de atraso ou de avanço.
Os cientistas salientam que o resultado desta investigação constitui a "primeira deteção de TTV a partir da superfície da Terra, obtida através de mais de dez anos de observações".
Nos próximos meses e anos, "o sistema WASP-148 será objeto de numerosos estudos teóricos e observações adicionais, o que permitirá melhorar as medições das suas propriedades e melhor compreender a sua estrutura e evolução", em particular, "o sistema será observado em breve pelo telescópio espacial TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA".
Estas observações, concluem os investigadores, "com muito mais precisão que as efetuadas na Terra, irão medir nove trânsitos consecutivos do planeta a nove dias, o que permitirá determinar a inclinação entre as duas órbitas".
O estudo vai ser publicado em breve na revista Astronomy & Astrophysics.