Após longa agonia, Tito morreu em Ljubljana, capital da república federal da Eslovénia, em 04 de maio de 1980, na sequência de problemas circulatórios motivados pela diabetes. Faria 88 anos três dias depois.
Filho de pai croata e mão eslovena, Tito nasceu em 1892 em Kumrovec, uma pequena localidade da Croácia junto à fronteira com a Eslovénia, então domínios do império Austro-Húngaro.
Desde cedo adere ao Partido Comunista, que durante largo período atua na clandestinidade. Dirigiu um aguerrido movimento de libertação na Segunda Guerra Mundial na sequência da invasão da então Jugoslávia monárquica pela Alemanha nazi em 1941, e libertou o país sem a tutela do Exército Vermelho de Estaline.
No final do conflito, em 1945, mais de meio milhão de 'partisans' (guerrilheiros comunistas) combatiam 17 divisões alemãs e Tito assume-se como o líder de um país multiétnico dividido por guerras internas, que vai dirigir sem contemplações.
Na sequência da partilha dos Balcãs entre as potências vencedoras, e apesar de persistir uma guerra civil na vizinha Grécia, a nova Jugoslávia republicana e socialista começará progressivamente a distinguir-se pelas suas especificidades e a afirmar-se como um elemento decisivo nesta região charneira da Europa.
O futuro presidente vitalício da República federal e líder da Liga dos Comunistas da Jugoslávia, rompe com Estaline em 1948 e empenha-se num dos seus grandes legados, o Movimento dos "não-alinhados", para além de um inovador sistema económico de autogestão, que se tornam em ideologias no país e uma alternativa ao monolitismo estalinista.
Aquelas decisões políticas tornam a federação a partir de 1952, e no espaço de uma década, num respeitado ator internacional que se movia à margem dos dois blocos então dominados pelas superpotências Estados Unidos e União Soviética.
A Jugoslávia passa a ser uma referência em termos de uma conceção de socialismo de "vertente humanitária", dirigida por um homem altivo que gostava de exibir as suas fardas brancas, com fama de mulherengo, 'bon vivant', e que insistia em convidar 'estrelas' de Hollywood, presidentes e rainhas para as suas luxuosas mansões no arquipélago de Brioni, junto ao aprazível mar Adriático, que percorria no seu iate.
Mas Tito também foi um dirigente autoritário, que perseguiu de forma implacável os seus opositores, detidos aos milhares na prisão da ilha de Goli Otok, ao largo da costa da Croácia.
A Jugoslávia de Tito nunca integrou o Pacto de Varsóvia e mostrou-se muito crítica face às intervenções soviéticas na Hungria em 1956 e na Checoslováquia em 1968.
Em 1961, Tito tinha já impulsionado a Primeira Conferência de chefes de Estado e de Governo dos países não-alinhados.
Belgrado recebeu delegações de 25 países, na presença dos líderes da Índia, Indonésia, China e Egito (Nehru, Sukarno, Chu En-Lai e Nasser, respetivamente) e empenhou-se com determinação no apoio aos movimentos de libertação que se emancipavam e questionavam os impérios coloniais europeus.
No entanto, a Jugoslávia de Tito também decidiu manter pontes de contacto permanentes com o Ocidente. Os jugoslavos eram os únicos cidadãos dos países do leste europeu que possuíam passaporte, permitindo uma importante imigração para a Europa central, sobretudo Alemanha.
As estâncias balneares da Eslovénia ou Croácia também recebiam anualmente milhões de turistas alemães, austríacos, britânicos, italianos. A Jugoslávia era a grande ponte entre as duas Europas, entre dois mundos.
Mas no decurso do seu prolongado consulado, todas as veleidades nacionalistas que despontavam, em particular entre correntes intelectuais na Sérvia e Croácia, eram de imediato abafadas e reprimidas.
Em recente entrevista à agência noticiosa AFP, o seu neto Josip Broz (Joska), 72 anos, considerou que a popularidade do fundador da "Segunda Jugoslávia" se mantém intacta, apesar de um "erro", um gérmen que estará na origem da explosão sangrenta do país dez anos após a sua morte.
No crepúsculo da sua vida, Tito terá confessado a seu neto ter apenas um lamento: permitir a adoção da Constituição federal de 1974.
Este texto concedia às seis repúblicas federadas (Eslovénia, Croácia, Bósnia-Herzegovina, Sérvia, Montenegro e Macedónia) e às duas províncias autónomas integradas na Sérvia (Voivodina e Kosovo) o direito à autodeterminação e à secessão.
O espetro da desagregação jugoslava vai acelerar-se nos anos imediatos à sua morte, que implicou um luto nacional de sete dias e gigantescas cerimónias na presença de 170 delegações estrangeiras e dos principais líderes mundiais.
Quatro reis, 31 presidentes, seis príncipes, 22 primeiros-ministros, 46 ministros dos Negócios Estrangeiros deslocaram-se a Belgrado, onde decorreram as cerimónias fúnebres.
Entre outros, estiveram presentes os presidentes da União Soviética, Leonid Brejnev, da China, Hua Guofeng, do Iraque, Saddam Hussein, de Itália, Sandro Petrini, da Coreia do Norte, Kim Il-sung, da Síria, Hafez el-Assad, da Zâmbia, Kenneth Kaunda, da Roménia, Nicolae Ceausescu, da Bulgária, Todor Jivkov, os primeiros-ministros do Reino Unido, Margaret Thatcher, da Índia, Indira Ghandi, do Japão, Masayoshi Ohira, o chanceler da Alemanha Federal, Helmut Schmidt, e o secretário-geral da ONU, Kurt Waldheim.
Compareceram ainda às cerimónias fúnebres os reis da Suécia, Carlos Gustavo, da Noruega, Olavo, da Jordânia, Hussein, e o líder da Organização de Libertação da Palestina, Yasser Arafat. A ausência mais notada foi a do Presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, representado pelo seu vice, Walter Mondale.
Tito permanece sepultado no seu mausoléu, a "Casas da Flores", situada na colina de Dedinje, que domina Belgrado, a atual capital da Sérvia e antiga capital federal.
E apesar de um renascimento de "jugo-nostalgia", dos tempos da "irmandade e fraternidade" da respeitada Jugoslávia federal multiétnica, o seu desaparecimento coincide com o início de uma crise económica e política que vai reavivar os nacionalismos que sempre percorreram os subterrâneos da grande federação balcânica dos "eslavos do sul".
A República Federativa Socialista da Jugoslávia vai implodir numa série de guerras sangrentas entre 1991 e 1999, e que também significaram o fim definitivo dos legados do "titismo".