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Festivais em Chelas com artistas do bairro ajudam a "mudança do estigma"

Os responsáveis da associação Chelas é o Sítio acreditam que a realização de grandes festivais de música naquela zona de Lisboa, com artistas do bairro nos cartazes, ajuda na "mudança do estigma" que paira há décadas sobre Chelas.

Festivais em Chelas com artistas do bairro ajudam a "mudança do estigma"
Notícias ao Minuto

19:02 - 31/08/23 por Lusa

Cultura Chelas

O Parque da Bela Vista acolhe, entre hoje e sábado, a 2.ª edição do festival Kalorama, que estabeleceu uma parceria com a Chelas é o Sítio e conta com três artistas do bairro, escolhidos pela associação, no cartaz. O mesmo já tinha acontecido no ano passado naquele festival e também no Rock in Rio Lisboa. O Parque da Bela Vista situa-se na freguesia de Marvila, na zona oriental da cidade, território do qual faz parte Chelas.

A realização destes dois festivais naquela zona da cidade "acima de tudo ajuda na mudança do estigma", defendeu um dos fundadores da Chelas é o Sítio, Ricardo Gomes, em declarações à Lusa.

A associação, que conta com o 'rapper' Sam The Kid entre os fundadores, nasceu precisamente com o propósito de combater esse estigma, numa altura em que os bairros de Chelas, identificados com letras, como zona J, zona M ou zona I, ganhavam novos nomes, atribuídos pelo poder local, entre os quais bairro da Flamenga e bairro das Amendoeiras.

"A palavra Chelas era quase proibida", recordou Ricardo Gomes. "Esse estigma foi combatido, e conseguimos. Agora, como é óbvio, há muito mais para fazer. Há uma intervenção importante para fazer nas escolas, a nível social, a nível dos bairros, faltam parques infantis, espaços verdes", disse.

Nuno Varela, também da associação, salientou o facto de hoje os festivais não serem "só música, bebida e diversão". "Há toda esta parte social, a parte da sustentabilidade, que está por trás e começa meses antes de o festival acontecer, que vai criar estas dinâmicas todas e esta pressão que é necessária, para se calhar as coisas começarem a mudar a nível interno, mesmo na educação, e termos outras ferramentas para dar aos miúdos aqui dentro do território".

Fundador de uma das mais antigas plataformas de divulgação da cultura hip-hop em Portugal, Hip-hop sou eu, Nuno Varela acredita que o impacto do Kalorama e do Rock in Rio naquela zona da cidade "é grande a todos os níveis", antes de mais para os moradores: "Porque o berço é palco de um dos grandes festivais do país".

Já a nível artístico, tendo em conta a parceria com a associação, "o impacto é superior".

"Para estes artistas, tendo a exposição que vão ter, num palco tão grande e num festival com esta dimensão, é um marco para sempre", disse, admitindo que isso não quer dizer que "todos os que estão presentes no Rock in Rio ou no Kalorama venham a ter uma carreira de sucesso, cabe também muito ao artista o aproveitamento que vai ter depois deste impacto".

Este ano, atuam no Kalorama, no âmbito da curadoria Chelas é o Sítio, Rato Chinês, Gui Aly, Necxo e Snake Gr, e no que depender da quantidade de artistas que Chelas alberga haverá para vários anos de festivais.

"Felizmente para nós existe muito artista [em Chelas]. É um bairro que tem muita capacidade criativa e muito artista. Há muita gente e muito mais gente para vir. Fazemos mais dez festivais e com certeza teremos mais 20 ou 30 artistas que poderão estar aqui", referiu Ricardo Gomes.

Ter artistas do bairro no palco do Kalorama pode ter o efeito "bola de neve". "Miúdos que têm 12/13 anos estão a ver outros, de 17/18 anos, a ter esta oportunidade, e acabam por pensar 'é possível, se calhar isto é possível'. Uma criança tem que sonhar e esse sonho tem que ser possível, eles não podem achar que é impossível. Muitas vezes, especialmente num bairro como o nosso, os sonhos são mais difíceis. Parece que não querem deixar as crianças sonhar, e nós queremos exatamente o oposto", referiu Ricardo Gomes.

Para ele, Nuno Varela ou Sam The Kid são "exemplos de sonhos concretizados" de artistas que cresceram em Chelas.

O simples facto de atuarem num festival não chega. "Como é óbvio, têm que trabalhar. Não é só chegar aqui e vai correr tudo bem na carreira deles. Vai vir da força e da resiliência deles, atingir o que querem no futuro. Estarmos a conseguir abrir estas portas é muito bom, pode acelerar o processo, mas é preciso batalhar", disse.

Nuno Varela considera que "ainda é um bocado cedo" para perceber se os artistas já beneficiaram de ter o nome no cartaz dos festivais, até porque as parcerias começaram apenas no ano passado.

"Já temos artistas que estão a ter uma boa exposição e continuam com datas, não sabemos se está ligado diretamente a terem estado numa curadoria de Chelas é o Sítio, mas acredito que muitas das pessoas que passa por aqui futuramente irão ter uma carreira de sucesso dentro do mundo da música", afirmou.

O festival Kalorama começou hoje. O recinto abriu às 14h00 e pelos quatro palcos vão passar, entre outros, Blur, The Prodigy, Pongo, Rita Vian, José González, M83 e Metronomy.

Até sábado, o cartaz inclui Florence + The Machine, Aphex Twin, Arcade Fire, Capitão Fausto, Dino D'Santiago, Belle & Sebastian, Eu.Clides, The Hives, Pablo Vittar e Júnior Boys.

Leia Também: "MEO Kalorama funciona como o último grande festival de verão europeu"

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