Com ascensão da extrema-direita pode nascer "novas canções de protesto"

O autor do livro 'A Revolução antes da Revolução', focado em 1971, o ano que mudou a música popular portuguesa, acredita que a ascensão do partido de extrema-direita Chega vai provocar "uma nova geração de canções de protesto".

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© X/ Luís Freitas Branco

Lusa
13/03/2024 09:09 ‧ 13/03/2024 por Lusa

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"Acredito que a ascensão do Chega, não tenho nenhuma dúvida disto, vai espoletar uma nova geração de canções de protesto de combate, mas também de raiva, de desalento e de tristeza", referiu Luís de Freitas Branco em entrevista à agência Lusa, quando questionado sobre um ressurgimento de música mais interventiva após os resultados das eleições legislativas de domingo.

O crítico musical, consultor de comunicação e mestrando de Ciências Musicais lembrou que tal já é visível, "de há um ou dois anos para cá, nas canções que estão a surgir sobre a crise na Habitação".

Entre outros, a fadista Gisela João fez no ano passado uma versão de "Casa da Mariquinhas" a que chamou "Hostel da Mariquinhas", na qual canta que encontrou a casa da Mariquinhas num 'site' de Turismo: "É bonito ver a casa restaurada/E há emprego p'ro menino e p'ra menina/ Só é pena o português não ganhar para o T3/ E ter que mudar p'ra lá da Cochinchina".

Já A Garota Não incluiu no álbum "dois de abril", editado em 2022, o tema "O que é que fica", que conta com a participação de Chullage, no qual canta: "Welcome monsieur, a casa é vossa/O mal dos outros não nos faz mossa/Quem não aguenta a subida encosta/Habitação é fratura exposta".

O músico Luís Varatojo gravou no álbum "Defesa Pessoal", do projeto Luta Livre, o tema "T0 no Barreiro", e Eu.Clides divulgou no ano passado a música "Tê menos 1".

Em "A Revolução antes da Revolução", editado pela Zigurate, Luís de Freitas Branco aborda "todo um repertório que contribuiu para o derrube da ditadura".

Acontecer um novo 1971 "é impossível", tendo em conta que naquele ano havia "uma série de condicionantes, desde a censura ao Estado Novo", mas Luís de Freitas Branco defende que "pode haver um novo 2011, o que já será bastante impressionante".

Em 2011, ano em que a 'Troika' regressou a Portugal, os Deolinda apresentaram o tema "Parva que sou", que acabou por inspirar o movimento Geração à Rasca, "que foi a maior manifestação política desde o 25 de Abril".

No âmbito de uma investigação que Luís de Freitas Branco está a fazer sobre "A música, o conflito e as canções de protesto de 2011", fez recentemente um "levantamento documental, e o que se descrevia da população portuguesa antes do 'Parva que sou' é que estava numa apatia, não ia à rua e não fazia nada".

"E foi uma canção que alterou isto tudo", disse, recordando que "sempre que houve momentos de conflito na sociedade portuguesa, houve uma reação imediata da música".

O partido de extrema-direita Chega elegeu 48 deputados nas legislativas de domingo, obtendo 18,06% dos votos, reforçando a sua posição de terceira maior força política na Assembleia da República.

Nas eleições anteriores, em 2022, o partido tinha elegido 12 deputados.

"Eu tenho a certeza que o Chega vai mexer muito com a canção portuguesa", afirmou Luís de Freitas Branco.

O álbum de estreia do 'supergrupo', assumidamente interventivo, Cara de Espelho, homónimo e editado recentemente, tem um tema sobre o líder do Chega - "Dr. Coisinho", que inclui versos como "O Dr. Coisinho vem coisificar o medo/ Ai ó mulher é branco/ Ai ó mulher é preto/ O Dr. Coisinho vem quantificar o erro/ Ai ó qu'ele é cigano/ Ai ó qu'ele é o demo".

Leia Também: Ano de 1971 "mudou a música popular portuguesa" e é recordado em livro

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