Raul Minh'alma, pseudónimo de Pedro Miguel Queirós, é natural de Marco de Canaveses. Formou-se em engenharia, mas foi a escrita que o cativou, quando na adolescência começou a escrever poesia. Já lançou vários livros, sendo o mais recente 'Fomos mais que um erro'.
Uma história que aborda questões como a toxicidade em relacionamentos amorosos, traumas infantis, o estabelecer limites e saber dizer que não.
Em conversa com o Notícias ao Minuto, o autor falou sobre a importância de abordar este assunto e que "há muito queria falar sobre este tema para ajudar quem possa estar a passar por situações semelhantes" e que a mensagem que quer passar é que "é melhor nada do que só metade".
Raul Minha'alma referiu ainda que uma das suas batalhas enquanto autor é "melhorar a inteligência emocional" dos seus leitores, assumindo ainda que que tem um "compromisso consigo próprio de querer deixar o mundo um bocadinho melhor".
Teve de haver aqui um equilíbrio da minha parte para não deixar que, de repente, a história fosse sobre violência doméstica
Como é que surgiu a ideia ou a inspiração para escrever este livro?
Este livro surge de uma vontade minha de abordar um tema muito importante na atualidade, pelo menos naquilo que aos relacionamentos diz respeito: os relacionamentos tóxicos. É um tema quente, um tema que que me diz muito também e que vai de encontro às temáticas que também costumo abordar nos meus livros.
Já há muito tempo que queria falar sobre este tema, também para, de certa forma, ajudar quem possa estar a passar por situações semelhantes ou já tenha passado. Através desta história, ajudar quem estiver numa situação dessas, para que se possa libertar desses relacionamentos e que passem a ter relacionamentos mais saudáveis. Essa é uma das minhas batalhas enquanto autor.
O livro é um romance e, como disse, fala-nos de um relacionamento tóxico, um tema atual. Como é que foi escrever esta história?
Teve de haver aqui um equilíbrio da minha parte para não deixar que, de repente, a história fosse sobre violência doméstica. A história não é sobre violência doméstica, é sobre relacionamentos tóxicos. Não chega a existir, em momento algum, violência doméstica. No máximo, violência psicológica, violência emocional. Era uma linha que não queria transpor, até porque a violência já foi abordada noutros livros e não era esse o tema, não era esse o meu objetivo.
Muitas vezes, as pessoas não conseguem reconhecer situações tóxicas porque, na verdade, aquilo sempre aconteceu e, para elas, é normal e é importante falarmos um bocadinho sobre isso.
Obviamente que o livro é uma história de amor, é romanceado, é uma história de ficção, mas ali pelo meio vou tentando dar algumas dicas, alguns episódios, que quem estiver a passar por algo semelhante vai conseguir identificar-se.
Portanto, aquilo que digo e aquilo que defendo ou a mensagem final da história vai de encontro àquilo que os terapeutas, os profissionais da área também defendem. É aí que me protejo porque sou escritor [...] tenho esse compromisso de transmitir mensagens que sejam validadas até por profissionais
Como é que foi escrever sobre temas como traumas infantis, inseguranças? Como é que se aborda este tipo de questões e como se escreve de forma imparcial sobre o assunto?
Isso é importante, não só neste livro, mas em qualquer outro livro que escreva. Claro que tem sempre o nosso cunho pessoal, mesmo que queiramos fugir dele e tentemos ser imparciais e isentos.
Às vezes, é difícil, só que, particularmente, nestas situações, que são mais delicadas, a forma como consigo ser isento, é estudando sobre o assunto. Portanto, aquilo que digo e aquilo que defendo ou a mensagem final da história vai de encontro àquilo que os terapeutas, os profissionais da área também defendem. É aí que me protejo porque sou escritor [...] tenho esse compromisso de transmitir mensagens que sejam validadas até por profissionais.
Aquilo que escrevo é também porque os ouvi [aos profissionais] primeiro, porque estudei sobre o assunto. Não me aventuro em temas que não me sinto perfeitamente à vontade para falar sobre e aquilo em que não me sentir confortável não vou fazer, não vou escrever. Depois é deixar a criatividade fluir sempre dentro dessas linhas, daquilo que é a opinião profissional.
Numa entrevista que deu há pouco tempo dizia que "ao longo da vida, apaixonamo-nos por duas ou três pessoas que não serão o amor da nossa vida, mas serão fundamentais para o encontrarmos". Essa mensagem é também importante para quem lê este livro?
É um bocadinho aquilo que acaba por acontecer na história. Através disso, mostrar às pessoas, neste caso mostrar aos meus leitores, que há quem entre na nossa vida não para ficar. Entram para nos ensinar uma série de coisas que nos vão ajudar a crescer e a evoluir e, depois, sim, quando nos sentirmos minimamente evoluídos, já temos condições para encontrar uma pessoa que vá de encontro aquilo que é também os nossos desejos.
Às vezes, quando nós somos mais novos, somos mais ingénuos, acabamos por achar que uma coisa é amor quando, na verdade, é um relacionamento tóxico ou é uma dependência emocional que estamos a projetar no outro. No entanto, isso só vem com a experiência, mas também vem nos livros que nós vamos lendo, vem com as pessoas sábias e profissionais da área com quem nós podemos aprender e isso pode proteger-nos de muitas desilusões no futuro. Os meus livros vão de encontro a isso, querem ser também [os livros] aquela voz sábia que nos vem proteger de muitas desilusões.
A mensagem principal, vem até na própria contracapa, que é: 'é melhor nada do que só metade'
Diz que é um livro "comovente, imprevisível e com um final à Raul Minh'alma". Porquê?
Quem acompanha o meu trabalho, ou já leu dois ou três livros meus, consegue perceber, ou já percebeu, que os meus finais são muito característicos. São imprevisíveis. Há, eventualmente, algum 'plot twist', uma reviravolta final e este não é exceção. Há um final que, normalmente, quando as pessoas terminam têm sempre uma opinião sobre. Podem não ter opinião sobre mais nada, mas fazem sempre referência ao final, que é imprevisível, que não estavam à espera.
Gosto disso, gosto sempre de surpreender o leitor. O final faz todo o sentido na história, não é só para surpreender que o coloquei. Ele faz todo o sentido na história como em todos os meus livros. Tenho sempre esse cuidado. Nada acontece por acaso. É uma história muito imprevisível, que está sempre a sofrer alterações e isso torna-o também diferente de todos os livros que tenho feito e, de certa forma, é isso que o faz especial.
Qual é a mensagem que quer passar aos leitores?
A mensagem principal, vem até na própria contracapa, que é: 'é melhor nada do que só metade'. Infelizmente, as pessoas nos relacionamentos, e noutros campos das suas vidas, acabam por aceitar menos do que aquilo que acham que merecem. Aceitam migalhas porque acham que é melhor do que nada.
Às vezes, nos relacionamentos, é melhor nada do que uma migalha e as pessoas ainda não perceberam isso. [...] Têm carências para saciar, porque têm traumas por resolver e entram em relacionamentos que não são bons e, pior que entrar, é deixarem-se ficar neles. Se um relacionamento tóxico não for travado, se não for resolvido, pode evoluir para situações mais graves.
É uma batalha que assumo como minha enquanto autor porque tenho este compromisso comigo próprio de querer deixar o mundo um bocadinho melhor
Fala de amor, toxicidade, estabelecer limites, saber dizer que não. Em Portugal, as questões de violência no namoro, mas também o 'Me too', parecem ter encontrado um espaço de discussão. Foi algo que pensou ao escrever o livro?
Eu também já vivi relacionamentos que não foram muito saudáveis. Precisei de estar lá para aprender, mas muitas pessoas não precisam de chegar lá para aprender se lerem livros, se estiverem atentos, se tiverem curiosidade de estudar sobre relacionamentos e sobre o que é o amor, a paixão e os sentimentos e melhorarem a sua inteligência emocional.
No fundo, é também essa a minha batalha, melhorar a inteligência emocional dos meus leitores, das pessoas. Porque quando nós entendemos melhor os sentimentos, o que é que estamos a sentir e o que é que podemos fazer com isso, conseguimos ter uma vida mais saudável, mais feliz e mais realizada em todos os sentidos, não só nos relacionamentos. Portanto, essa é uma batalha que assumo como minha enquanto autor porque tenho este compromisso comigo próprio de querer deixar o mundo um bocadinho melhor.
Sei que é um tema quente e que precisa de ser falado. Sou um romancista e criei uma história ficcional, mas que aborda também esse tema porque precisa de ser falado e as pessoas precisam de aprender uma série de coisas para que não entrem em relacionamentos que não são os melhores. Se nós conseguirmos ir à fonte, à raiz do problema, conseguimos muitas vezes eliminar, não só a questão dos relacionamentos tóxicos, como todos aqueles que dele advém.
Como é que tem sido o feedback dos leitores ao livro?
Tem sido incrível, tem-me surpreendido. Especialmente, pelas emoções que o livro vai criando. Eu sabia que seria um livro, até pelo tema, que muitas pessoas iriam identificar-se, mas até pelo final do livro e por algumas coisas que acontecem pela história, seria um bocadinho mais forte a nível emocional em relação a outros livros meus. Também queria isso e fico feliz por ter conseguido. Só os meus leitores é que me vão dizer se, realmente, consegui alcançar o meu objetivo.
De vez em quando, vou partilhando também nas redes sociais mensagens que me vão enviando, testemunhos de pessoas que se identificaram, que se emocionaram a ler a história. Gosto sempre de emocionar as pessoas e fico contente por tê-lo conseguido com esta história.
A maioria das pessoas que não gosta do meu trabalho, nunca leu um livro meu. Isso deixa-me triste
Já lhe chegou alguma mensagem, por exemplo, de alguém que tenha passado por uma situação idêntica aquela que é retratada no livro?
Muitas pessoas têm-me dito que era o livro que estavam a precisar de ler neste momento das suas vidas. Felizmente, isso acontece-me porque procuro sempre abordar temas que vão de encontro aquilo que a humanidade está a precisar e, portanto, era expectável que encontrasse alguns testemunhos desses e fico feliz. Significa que as pessoas, através desta história, conseguiram identificar-se e, isso embora signifique que elas estão a viver um relacionamento tóxico, ao mesmo tempo é bom porque, se calhar, a partir de agora, não conseguem ignorar mais esse problema. E, se não o conseguem ignorar, têm de o resolver. Esse é o primeiro passo para nós conseguirmos resolver os nossos problemas, assumir que o problema existe.
Fico contente também por ter conseguido que as pessoas se tenham identificado e, sim, tenho recebido alguns testemunhos que vêm de encontro a isso. Pessoas que me dizem que estavam a precisar de ler este livro, que nem tinham percebido que estavam a viver um relacionamento tóxico e é isso que acontece em muitas situações.
As pessoas nem sequer sabem que estão num relacionamento tóxico, portanto assumem que é o normal porque é normal ser difícil, é normal ser cansativo e o amor dá trabalho. Não, não é suposto ser doloroso, desgastante. É suposto ser leve, tranquilo, próspero e, muitas vezes isso não acontece, mas como as pessoas não têm outro termo comparativo, sempre viveram relacionamentos tóxicos porque é um padrão da vida delas, acham que é o normal, que amar é sofrer e não é suposto.
Disse, numa entrevista antes, que o seu estilo de escrita nunca seria premiado pela crítica. O que é que quis dizer com isto?
Essa minha afirmação persegue-me desde essa altura. Usaram isso como linha de chamada ou título da notícia, mas não deixa de ser verdade, não deixa de ser aquilo em que acredito.
Não é bem um nunca, mas será mais difícil premiar um estilo de escrita como o meu porque é um estilo de escrita mais popular, mais comercial e este estilo não é muito apreciado pela crítica e por quem atribui esses prémios, especialmente se não forem prémios atribuídos pelo público. No entanto, se forem prémios atribuídos pelo público, tenho maior probabilidade de ganhar. Se for pela crítica, como acredito que não aprecie muito, o livro até pode ser muito bom, mas, muitas vezes, nem sequer o vão ler porque tem um estilo comercial, porque avaliam pela capa, pelo título, pelo tema, e nem sequer vão ler.
Tanto que, estou convicto, a maioria das pessoas que não gosta do meu trabalho, nunca leu um livro meu. Isso deixa-me triste. Agora quem leu e não gostou, tudo certo. Percebo perfeitamente, acontece com todos os autores, eu não sou melhor que os outros. É o normal que podia acontecer.
Agora, não gostarem do meu trabalho e nunca sequer terem lido um livro meu como, às vezes, me acontece, mesmo colegas de jornais e tudo, como já vi notícias a saírem sobre o meu trabalho que julgavam, literalmente, os meus livros pelo título e diziam que só pelo título se notava que era literatura de cordel.
Que autores portugueses mais o inspiram? Ou estrangeiros?
Não tenho um autor, tenho mais um género literário do que propriamente um autor. Eu não sigo autores, sigo um género literário. Neste caso, é desenvolvimento pessoal. Podia dizer Robin Sharma que, por acaso, é o autor do meu livro favorito dentro deste género. A nomear alguém seria esse autor. Não gosto de nomear porque, dificilmente, repito livros do mesmo autor.
Eu escolho os livros pelos temas que eles falam e, portanto, se eu quiser aprender sobre espiritualidade, eu vou escolher um livro sobre isso [...] gosto de aprender um bocadinho sobre tudo. Eu procuro os livros que, normalmente, são os mais conhecidos na área. A minha missão é ler todos os livros que sejam os grandes clássicos na área do desenvolvimento pessoal.
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