A ARCOmadrid 2025, uma das maiores feiras de arte contemporânea do mundo, que recebeu mais de 95 mil visitantes nas últimas duas edições, arrancou hoje ao final da manhã com uma homenagem e "um aplauso" à galerista e colecionadora Helga de Alvear, que morreu no início de fevereiro.
Após este momento - e antes da inauguração oficial pelos Reis de Espanha, que decorrerá ao final da tarde - colecionadores, convidados e profissionais de várias áreas puderam começar a percorrer os corredores dos dois pavilhões do Ifema (o espaço de exposições e feiras de Madrid) em que está instalada a ARCOmadrid, que conta com mais de 200 galerias de 36 países, incluindo 15 de Portugal.
A feira tem este ano uma secção comissariada dedicada à Amazónia ("Wametisé: ideias para um amazofuturismo"), em que à arte se junta uma mensagem de preservação da cultura amazónica e do meio ambiente.
Há sete galerias brasileiras presentes nesta secção, onde estão por convite, e para várias delas é a primeira vez que têm a oportunidade de estar numa feira de arte fora do continente americano e até do Brasil.
É o caso da Manaus Amazónia, da cidade de Manaus, uma galeria que, nas palavras do fundador e proprietário, Carlysson Sena, nasceu "no coração da Amazónia", onde se mantém, e que levou à ARCOmadrid três artistas que também nasceram e cresceram na Amazónia, região onde continuam a viver: Pa'saro, Duhigó e Paulo Desana.
Carlysson Sena diz que estar na ARCOmadrid significa "a possibilidade de entrar em novos mercados, falando do ponto de vista económico".
"Falando de arte, é a possibilidade de estes artistas serem vistos e terem o reconhecimento de um ambiente como este, que referenda e apoia os artistas. E do ponto vista da preservação da Amazónia é uma possibilidade de mostrar que a Amazónia também está a ser preservada pela sua cultura através das obras destes artistas. No fundo, é o arco da sustentabilidade: economia, sociedade e meio ambiente", sintetiza o galerista.
"Podemos dizer que temos uma arte sustentável, que apoia quem vive na Amazónia e que ajuda a mantê-la em pé", acrescenta.
Nos corredores da ARCOmadrid2025 ecoam outras mensagens sociopolíticas a par da da preservação da Amazónia. Alguns exemplos: uma instalação de Jaume Plensa, o artista catalão conhecido pelas enormes esculturas de cabeças de jovens mulheres, evoca as migrações e sucessivas tragédias que se vivem no Mediterrâneo; dezenas de obras lembram as guerras em Gaza e na Ucrânia e uma máquina de lavar louça carregada com pratos com as caras de Donald Trump, Elon Musk, Giorgia Meloni, Javier Milei, Santiago Abascal ou André Ventura, com o título "White Whashing", reflete sobre "o branqueamento" de mensagens populistas e da extrema-direita em todo o mundo, numa obra do espanhol Eugenio Merino.
A ARCOmadrid é também um espelho do "mundo estranhíssimo" atual, como o designa o galerista português Luís Castanheira Loureiro, da NO-NO, galeria de Lisboa que pela segunda vez consecutiva está na feira de Madrid.
Segundo o galerista, tal como o mundo e a geopolítica, também o mercado da arte "está estranhíssimo", sublinhando que depende de investidores ligados a atividades muito diversas e transversais, desde o imobiliário à política.
"As pessoas estão saturadas, desanimadas, não especialmente bem mentalmente", afirma, lembrando que o mercado da arte viveu uma euforia e um dos melhores anos de sempre em 2020, coincidindo com a pandemia, passou por um 2021 "péssimo" e começou a recuperar em 2022.
Atualmente, o galerista nota "desânimo", com as "pessoas a sentirem-se quebradas" por sucessivos acontecimentos - pandemia, guerras, inflação - que geram um "sentimento de impotência".
"Muito colecionadores foram também apanhados de surpresa pela crise da subida das taxas de juro", afirma, antes de acrescentar que, no caso português, tudo isto se alia "a uma total falta de investimento público" nas artes visuais.
"Vivemos um contexto bizarríssimo", considera o galerista da NO-NO, que explica que "nunca houve um reconhecimento tão importante de galerias e gerações de artistas portugueses" ao mesmo tempo que, localmente, "o mercado está cada vez mais magro" e numa situação em que "de repente podem desaparecer metade das galerias".
Luís Castanheira Loureiro critica, por exemplo, o valor destinado à Cultura no Orçamento do Estado (historicamente, sempre perto de 0,50% em termos de limite de despesa), mas também critérios que impedem a generalidade das galerias nacionais de se candidatarem a fundos para apoios à internacionalização.
"O mercado está a encolher e é cada vez mais desafiante fazer isto", sublinha.
A galeria NO-NO, de Lisboa, está na secção "Opening" da ARCOmadrid, dedicada a novas galerias.
A presença nesta secção comissariada ocorre por convite, que se estende por dois anos, pelo que a NO-NO, após uma participação com um balanço "bastante positivo" em 2024, pretende regressar à feira de Madrid em 2026, já dentro do programa geral.
"Este ano estou à espera de resultados melhores", diz Luis Castanheira Loureiro, que explica que numa feira como a ARCOmadrid, um escaparate internacional de grande dimensão, o êxito da participação se mede, sobretudo, com o estabelecimento de "uma série de contactos que deixam lastro" e são fundamentais para manter a atividade e o trabalho da galeria.
As restantes 14 galerias portuguesas presentes na ARCOmadrid 2025 estão no programa geral da feira: 3+1 Arte Contemporânea, Balcony, Bruno Múrias, Cristina Guerra Contemporary Art, Foco, Francisco Fino, Jahn und Jahn, Madragoa, Miguel Nabinho, Monitor, Pedro Cera e Vera Cortês, todas de Lisboa, e ainda a Kubikgallery e a Lehmann, do Porto.
Da agenda da ARCOmadrid deste ano faz ainda parte a conferência, hoje à tarde, "Pontes culturais: Diálogos entre museus de Portugal e Espanha", com o diretor do Centro de Arte Moderna (CAM) da Gulbenkian (Lisboa), Benjamin Weil, a diretora do Centro Cultural de Belém (CCB, Lisboa), Nuria Enguita, e a diretora do Museu Helga de Alvear (Cáceres, Espanha), Sandra Guimarães.
A conferência é organizada pela Embaixada de Portugal em Madrid e será moderada pelo jornalista espanhol Ianko López.
Na quinta-feira, será apresentado na ARCOmadrid o Museu de Arte Contemporânea Armando Martins (MACAM), que tem inauguração prevista para este mês, em Lisboa.
Por outro lado, a Embaixada de Portugal em Espanha reeditou o "Mapa de Artistas Portugueses em Galerias Espanholas", que está a ser distribuído na ARCOmadrid junto de colecionadores e profissionais do setor.
"Nesta edição, apresentam-se 43 artistas representados por 34 galerias, em 11 cidades diferentes", segundo a embaixada.
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