O Benfica completa este domingo, dia 28 de fevereiro, 117 anos de existência. A propósito da data especial, o presidente das águias, Luís Filipe Vieira deu uma longa entrevista à televisão do clube onde abordou os temas que marcam a atualidade do Benfica.
Acompanhámos as principais declarações do presidente das águias que abordou temas como a continuidade de Jorge Jesus, o planeamento da temporada, o surto de Covid-19 e a crise de resultados.
Fique com o essencial da entrevista de Luís Filipe Vieira.
Aniversário: "Hoje é um dia muito especial. Esta história é extraordinária de amor a um clube. Hoje era um dia normal para nós festejarmos os anéis de platina, os emblemas de ouro e prata, se não fosse a pandemia. Brevemente, veremos qual é a oportunidade que teremos para festejar este mesmo dia. Vamos esperar por esse dia para estarmos todos juntos."
Objetivos estão a ser redefinidos ou já se pensa na próxima época?: "Ninguém baixou os braços. Enquanto for matematicamente possível, o Benfica vai lutar para ser campeão nacional. Temos uma Taça de Portugal para conquistar. Ninguém baixa os braços, que acreditem sempre. Já ganhámos um campeonato com 8 pontos de atraso. Só assim vale a pena existir o Benfica. Para isso é importante estarmos juntos, que os sócios e adeptos e sócios apoiem a equipa. Envolve toda a gente. Temos de estar unidos, a pensar sempre que é possível lá chegar."
Responsável pela crise: "Só pode haver um, sou eu. Na hora da derrota, sou eu, não pode existir mais ninguém. Assumo inteira responsabilidade por tudo aquilo que está a acontecer no Benfica neste momento. Na hora da derrota tem de aparecer sempre quem lidera o clube. Devo ser dos presidentes mais titulados do Benfica, ganhei seis campeonatos, quando ganhámos o tetra não dei uma entrevista, pois foi uma vitória dos benfiquistas. Não de uma pessoa só. Acho que é importante e que não sirva de desculpa para ninguém. O Jorge falou, emocionou-se, estou sempre no Seixal. Sei o que se passa naquela casa. O mês de janeiro fomos fustigados... Quando tentámos adiar o jogo com o Nacional, nessa semana tivemos uma tempestade perfeita, com 27 casos de Covid-19, 10 eram jogadores. Sabemos o que se passou. Os benfiquistas não devem minimizar o que se passou e é grave se o fizerem. Sei que é penoso... Quando ficamos negativo não está resolvido, tanto para mim como para um atleta. É importante haver essa sensibilidade. Houve colegas e amigos a dizer-me: 'a equipa só corre uma parte...'. Os jogadores corriam imenso e não correm mais de sete quilómetros. Quando um jogador não pode correr, não pode. Não é uma desculpa, é uma realidade. Nunca vi isto acontecer noutro lado, a não ser nos lares. Esta foi a realidade do Benfica. Nada no Benfica em janeiro foi normal.
Independentemente disso ter acontecido, não faltou profissionalismo, dedicação e trabalho. Praticamente não tínhamos contacto uns com os outros por causa desta situação, mas hoje as coisas já estão a ficar diferentes. As situação pode começar a normalizar, com mais percalço ou menos percalço. [Desde que testei negativo] Eu não consigo subir um lance de escadas do Seixal sem parar e antes não me acontecia, o médico disse que ia melhorar dentro de dois ou três meses. O meu estado mantém-se igual, dizem-me que vai melhorar e ainda não melhorou, dizem-me que tenho de esperar. Vamos lá ver."
Problemas resumem-se à Covid?: "Tem uma parte muito forte, mas há outras situações de culpa, como o Jorge Jesus disse. Mas o principal foi o mês de janeiro e foi onde fomos fustigados a sério."
Arbitragens: "Todos nós vimos com os nossos próprios olhos. Esta semana entregámos uma carta ao presidente da FPF para que mal acabe o campeonato, que haja uma reunião onde esteja o Secretário de Estado, o presidente da Liga, o presidente do Sindicato, Associação de Jogadores, Associação dos árbitros e de treinadores. Temos de dar a volta a isto. Isto não está bem. Quando o VAR chegou pensámos que os problemas estavam resolvidos, mas não. Complicou! Há lances que tive oportunidade de ver e é impossível como é que aquela pessoa não viu os lances de penálti frente ao Moreirense. Como é que não viu? Acho que a própria FPF está sensibilizada para se fazer algo. Quando falei nos árbitros estrangeiros reclamaram, mas agora parece que já vem um inglês. Tudo o que seja para a verdade desportiva, façam tudo o que for possível. Não é só a arbitragem, mas temos de tratar tudo nos locais próprios. Não vale a pena disparar para o lado, nem para a frente, nem para trás. Não compete a um presidente fazer isso".
Impacto da ausência do público nos jogos do Benfica: "O 12.º jogador é muito importante para o Benfica. Tanto aqui [Luz] como fora. Não é por acaso que dizíamos que era o 12.º jogador do Benfica. Esse público arrastava a equipa para as vitórias, fazem-nos muita falta."
Fratura no Benfica: "Nem sei porque acontece esta fratura... Este clube sempre foi democrático, até no tempo da ditadura. Houve eleições há quatro meses e em cada três sócios, dois votaram em mim. Não percebo esta contestação. Se não houver estabilidade e unidade, dificilmente nós ganhamos. Ganhámos vários títulos, estivemos em duas finais europeias. O Benfica nesse espaço de tempo fez um bi, um tri e um tetra. Sofremos um golo aos 90 minutos e se não fosse isso garanto que o penta era nosso. O Herrera nunca mais na vida repete esse pontapé. Isto tudo só foi possível com o apoio das pessoas, porque é na derrota que se vê os verdadeiros benfiquistas. Há coisas que na derrota marcam."
Jorge Jesus vai continuar?: "Logicamente vai continuar. Tem de cumprir o contrato. Mas o Jorge Jesus não é um treinador competente? Nas eleições eu ouvia toda a gente dizer que o Jesus é que tinha de vir. Acho que até as outras listas apoiava o Jorge Jesus. Ele tem 12 títulos neste clube e não precisa que o esteja a defender. É o treinador que mais títulos conquistou neste clube. As pessoas não entendem e não há desculpa nenhuma. Há um caso atípico que não se está a entender. Eu estou no Seixal todos os dias e sei como foi severo. Se porventura não houver imunidade de grupo no próximo ano, o Benfica nunca mais se equipa em balneário nenhum. Sai do hotel equipado, vai para o estádio, sai e até a palestra é dentro do campo. Acaba o jogo sai direto para o hotel, tomam banho e jantamos lá e ficamos lá. É impensável 27 pessoas infetadas em poucos dias, nunca mais! Liguei ao presidente do Nacional para adiar o jogo e disse logo que não podia ser. Mas se eu lhe emprestasse o Diogo Gonçalves já adiava o jogo! Não há solidariedade nenhuma no futebol e o Benfica já foi muito solidário com o Nacional."
Benfica não se transformará num cemitério de treinadores: "Mas qual cemitério? Isso é falácia das pessoas. Vou levar uma mágoa grande para sempre que foi o Fernando Santos, ele sabe. A partir de 2009 só tive três treinadores. Jorge Jesus a ganhar e a perder. O Rui Vitória em três anos e meio ganhou seis títulos. O que fizeram ao Rui Vitória... Eu li ali: 'Vieira para a rua, Rui Vitória para a rua'. Falei abertamente com o Rui e isto já não era bom para ele e ele reconheceu isso. Depois, o Bruno Lage quando ganhou o campeonato era o novo Mourinho, o novo modelo de treinador em Portugal, era tudo bonito para o Lage. Entretanto a segunda volta correu mal e o Bruno Lage já não era o Bruno Lage. Os comentários que faziam... O Bruno Lage teve a coragem de pegar do Ferro, Florentino e Félix a titulares. Diziam que era eu que queria meter os jogadores na montra. Os benfiquistas têm de saber o que querem."
Pressão: "É revoltante o que fazem ao treinador, ao presidente, aos jogadores. Este clube não pode ser vivido assim. É preciso entender que há alturas que não podemos ganhar. Temos de estar unidos na vitória e na derrota, senão voltamos ao passado, é direitinho. Em março do ano passado, o Benfica era dos clubes mais rentáveis da Europa, tudo graças à formação do Benfica. Não há nenhum clube em Portugal que não tenha de vender. Só se pode vencer com um trajeto equilibrado."
Planeamento da temporada: "Hoje faríamos igual. Quanto contratamos o Jorge Jesus, não houve um jogador que o Jorge não dissesse que sim. Havia o Cabrera que o Jorge queria, mas entendemos não o contratar porque nos pediram 15 milhões de euros. O Robin Koch também não conseguimos contratar, que acabou por ir para Inglaterra. O Rui Costa e o Tiago Pinto foram à Alemanha, mas foi impossível contratar esse que já tinha assumido com outro clube. O Jorge fez uma pressão enorme para contratar o Everton. Toda a gente o conhece, internacional brasileiro. Darwin também foi pedido exclusivo do Jorge, o Rui Costa foi a Almería para contratá-lo, curiosamente também estava no scouting do Benfica. O Otamendi veio por causa da saída do Rúben Dias e o Vertoghen veio com o consentimento do Jorge também. Não era bem aquilo que ele pretendia, mas não poderíamos contratar o Cabrera, que era a preferência dele. Ele disse logo, vamos por aí, não há problema nenhum. O Gilberto também foi pedido do Jorge. O Pedrinho foi contratado antes, mas o Jorge Jesus chegou ao pé de mim depois de o treinar e disse-me: 'Afinal, enganei-me. O Pedrinho é um craque. Tenho é de o preparar bem. Aquele pé esquerdo é diabólico'. Qualquer contratação foi decidida entre Jorge Jesus, Rui Costa, Tiago Pinto e eu. Só há completa sintonia entre todos. Volto a frisar, estou todos os dias no Seixal, às vezes até durmo lá."
Adaptação dos jogadores: "Houve se calhar um fator que não ponderámos, que foi um erro: a adaptação dos jogadores. Temos experiência o que é um jogador adaptar-se ou não, o que é certo é que não é pela falta de qualidade deles. São todos internacionais. É preciso tempo. O treinador é que escolhe. Temos um departamento de scouting altamente profissional. O treinador está cá, está lá o Rui Costa, que é hoje o responsável máximo. Está a acumular o cargo de administrador com o de diretor-geral. E depois estou eu. Existe diálogo entre todos nós. Em relação ao Rui Costa, ele tem feito um trabalho extraordinário de dedicação ao Benfica, de benfiquismo. Ao contrário do que dizem, ele não está renumerado. Está a trabalhar grátis, agora é dirigente do Benfica. Nós não podemos ser renumerados. Ele tem feito um trabalho fantástico. Quando as pessoas dizem que não há mística, está lá o Rui Costa e o Luisão perto da equipa. Ele até me está a surpreender, eu já lhe disse. Aquilo que ele fazia e o que está a fazer, tem feito um trabalho extraordinário. A sintonia é de tal ordem que faríamos exatamente o mesmo. Talvez devêssemos ter sido mais teimosos no meio-campo. Agora, até veio finalmente o Lucas Veríssimo, que o Jorge Jesus queria. Não o conseguimos trazer na altura, que era quando o queríamos trazer, mas veio em Janeiro. É outro jogador que todos conhecem, o que se fala do Lucas, um jogador de craveira reconhecida."
Formação: "Não há uma política de ziguezague. Se alguém quer apostar na formação, está aqui à frente. Sou eu. Quando apostamos seriamente na formação, diziam que não podíamos ser campeões com miúdos, que o Vieira queria era vender por causa das comissões. Tivemos um treinador para fortalecer e consolidar uma politica destas, os benfiquistas sabem o que se passou e o que fizeram ao treinador. Este ano, por causa dessa contestação, tenho de ter a sensibilidade daquilo que os sócios querem. Fizemos uma mescla de experiência. Não houve contratações por avulso. Foi o nosso departamento de scouting que visionou estes jogadores, têm os relatórios, o Jorge Jesus viu os jogadores e aceitou. único presidente, penso eu, na história do Benfica que pensou seriamente na formação fui eu. Quero investir no centro de formação. Por isso vai haver uma reunião a 1 de março para haver uma permuta do terreno que pretendemos para termos mais 6 campos de futebol e uma unidade hoteleira. Continuo a manter esse sonho de ser campeão com uma equipa da formação. A pandemia atrasou, mas quero ter um clube em que seja possível ser financeiramente estável e futebolisticamente. Desportivamente ganhador. Os sócios do Benfica têm de assumir. Vamos seguir esse caminho. O Rui Vitória fez o trabalho que fez em três anos e meio lançou jogadores, tal como o Bruno Lage, e vêm dizer que só com miúdos não vamos lá. Aqueles que falam da formação são os mesmos que diziam que isto não ia lá com miúdos e que diziam que eu é que fazia a equipa. Vamos ver para o ano o que vai acontecer."