A revelação feita por Sven-Goran Eriksson nesta quinta-feira, de que tem, na melhor das hipóteses, uma esperança de vida de um ano, tomou o mundo do futebol de surpresa. Surgiram mensagens de apoio de várias latitudes, como em Inglaterra ou em Itália. Mas também em Portugal, mais concretamente no Benfica, o sueco deixou marca.
O antigo treinador, atualmente com 75 anos, fez duas passagens pelo Estádio da Luz, primeiro entre 1982 e 1984, e depois entre 1989 e 1992. Cinco épocas onde ganhou cinco títulos, entre eles três campeonatos, deixando um grande legado no Benfica.
O Desporto ao Minuto falou com algumas figuras que se cruzaram com Eriksson ao serviço das águias. Caracterizam-no como um homem "extremamente inteligente" e "cordial", que trouxe novos métodos de treino para Portugal, "simples" mas "motivadores".
Toni, antigo adjunto de Eriksson, diz que esta é uma situação "dolorosa"
O percurso de Toni confunde-se com o de Sven-Goran Eriksson. O antigo jogador e treinador do Benfica foi o crónico adjunto do sueco na Luz. Primeiro entre 1982 e 1984 e, depois, curiosamente, passou de treinador principal campeão para adjunto de Eriksson, em 1989. Já sabia da doença, mas ficou surpreendido com a estimativa dos médicos.
"Não foi surpresa, já há muito que estou a viver esta situação. Não estava era à espera de ouvir esta frase [de ter um ano de vida]. Não tínhamos entrado nesse campo. Hoje foi mais doloroso. Sabemos que o cancro do pâncreas é fulminante. Já contava com a situação do Eriksson, não é de agora. Foi detetada já há mais de um ano. Tenho acompanhado e ainda no Natal falei com ele. A vida é madrasta. Sente-se que é uma luta inglória, desigual. A vida prega rasteiras", lamenta a glória do Benfica, com 77 anos.
Os jogadores, desde o primeiro dia, percebia-se que estavam mais motivados com eleToni recorda uma amizade com mais de 40 anos, dentro e fora de campo: "Ele vai fazer 76 anos no dia 5 de fevereiro. Temos uma relação de amizade que começou na época de 82/83, quando ele tinha chegado a Portugal e vencido a Taça UEFA com o Gotemburgo. Tinha uma identificação e cumplicidade muito grande com ele. Tivemos destinos diferentes mas nunca deixámos de partilhar essa amizade. Ele veio romper com aquilo que era o treino na altura, todos os jogadores aderiram ao método de treino, à proposta de jogo que ele criou. Era um jovem, tinha 30 e poucos anos quando chegou".
No meio de tantas e tantas aventuras, Toni tem dificuldade em escolher apenas uma que tenha protagonizado com Sven-Goran Eriksson. Ao lado do sueco, ganhou muitos títulos, mas também sofreu alguns desaires, como, por exemplo, as finais perdidas da Taça UEFA com o Anderlecht (1983) e da Taça dos Campeões Europeus diante do AC Milan (1989).
"Tive uma boa relação especialmente com dois treinadores, o Mário Wilson e o Eriksson. Nós coordenávamos bem as nossas ideias. A filosofia de jogo, de vida. Ele era um nórdico que veio para um país do sul da Europa e que acabou por se adaptar a um país como Portugal. Guardo boas coisas, por causa desta identificação que tínhamos sobre estilo de jogo e, sobretudo, futebol. Trouxe coisas simples nos processos de treinos. Os jogadores, desde o primeiro dia, percebia-se que estavam mais motivados, percebia isso enquanto treinador. Foi uma coisa que me influenciou enquanto treinador", admite.
Fernando Mendes recorda história curiosa: "É por isto que não jogas"
Tal como todos os treinadores, Eriksson deixou marca pela positiva e pela negativa, dependendo do tempo de jogo que dava aos atletas. Fernando Mendes cruzou-se com o sueco na época entre 1989 e 1991, mas não era titular para Eriksson. Ao saber da notícia, o antigo lateral admite tristeza.
"Foi uma pessoa com quem trabalhei, é sempre triste ouvir isto. Do pouco tempo que lhe resta, espero que aproveite bem e que haja qualquer coisa que lhe dê mais algum tempo de vida. Tive alguns problemas com ele, como é sabido. Jogava pouco. Era um técnico com ideias inovadoras, diferentes do que se fazia cá em Portugal", começa por dizer Fernando Mendes, em declarações prestadas ao Desporto ao Minuto.
Relembra-o com "uma pessoa extremamente inteligente". "Tinha uma mente aberta, cordial, muito simpático, não era uma pessoa complicativa. Tinha a ideia dele, quer gostassem ou não", vinca. Fernando Mendes guarda especialmente uma história curiosa relacionada com o tempo de jogo.
"Alguns jogadores que também não jogavam, ou que jogavam menos, foram ter com ele. O Erikson mostrou-lhes um vídeo da atitude de alguns jogadores, eu incluído, durante os treinos. 'É por isto que não jogam', disse ele. Mostrou o vídeo e acabou a conversa. De vez em quando apresentavam estas coisas fantásticas...", lembra Fernando Mendes, detalhando que o vídeo era em suporte cassete VHS.
Sven-Goran Eriksson ganhou 19 títulos ao longo da carreira. Destacou-se na Suécia, ao serviço do Gotemburgo, passando depois no Benfica, AS Roma, Fiorentina, Sampdoria, Lazio ou na seleção inglesa, durante os Mundiais de 2002 e 2006, e o Europeu de 2004, em Portugal. Teve aventuras mais breves no final de carreira em destinos exóticos como a Costa do Marfim, China ou Filipinas. Razões de saúde afastaram-no do futebol, no ano passado, quando tinha o cargo de diretor desportivo dos suecos do Karlstad.
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