Tiago Pinto faz parte de uma geração de jogadores portugueses que foi à procura da sorte no estrangeiro. Filho de João Pinto, considerado um dos melhores jogadores portugueses na década de 90, o lateral-esquerdo de 29 anos está agora na Turquia, onde representa as cores do Osmanlispor e garante estar feliz por ter encontrado um "bom sítio" para família viver.
Em entrevista ao Desporto ao Minuto, Tiago Pinto não deixa nada por dizer e aborda todas as questões com as quais lidou ao longo da carreira.
A adaptação a uma nova realidade, com traços culturais bastantes distintos, não foi fácil, mas, após dois anos de estadia em Ancara, Tiago Pinto garante estar agora totalmente tranquilo e pronto para atacar a nova temporada.
Que balanço faz desta aventura na Turquia?
A adaptação não foi a melhor porque o choque cultural foi muito grande e, como era um clube que estava em fase de transição, da segunda divisão para a primeira, houve uma certa desorganização, e por isso a integração não foi a melhor. Mas o balanço, depois de dois anos e pouco, é o melhor possível por dois motivos. Primeiro, desportivamente, as coisas estão a correr bem, o que ajuda muito. Tenho os meus filhos e a minha mulher bem adaptados à cultura e à cidade, estudam na escola americana, já falam inglês…. O meu filho vai para o segundo ano e a minha filha para a primeira classe, e vejo que eles já têm os seus amigos e que estão felizes aqui. Isso para mim é o mais importante. Juntando isso à parte desportiva, acho que não poderia pedir melhor. Sinceramente, não esperava que as coisas corressem tão bem e não poderia desejar mais para mim e para a minha família.
"Pensei em vir-me embora e deixar tudo"
Quais foram as primeiras impressões quando chegou à Turquia? Teve aquela sensação de querer voltar atrás?
Tive… Sinceramente, na primeiras semanas pensei em ir-me embora, por várias razões. Na altura, eu fui direto para o estágio na Holanda. Tal como disse, era uma equipa que vinha da segunda divisão e foi num ano onde abriram muitas vagas aos jogadores estrangeiros. Passaram de três ou quatro para 14. Foi uma diferença muito grande, que talvez não foi muito bem vista por muitos jogadores e por muitos turcos aqui na Turquia. E eu fui um dos primeiros, a chegar. Talvez o terceiro. Lembro-me da receção não ser a melhor por parte dos jogadores. Houve um certo atrito invisível, mas que estava lá e que se sentia. Ainda por cima, lesionei-me logo no início, ainda que sendo uma lesão ligeira, impediu-me de treinar, então as coisas não começaram a correr bem desportivamente. Estava sozinho e não fui recebido, pelo menos da parte dos meus colegas, como os estrangeiros são recebidos em Portugal e as pessoas às vezes não têm a noção das dificuldades que existem em estar num país estrangeiro. E por isso mesmo pensei em vir-me embora e deixar tudo.
Agora já encontra um clube diferente? Mais desenvolvido e com um projeto consolidado?
Sim, sem dúvida! Acho que principalmente pelo nosso primeiro ano, fizemos uma grande época. Acabámos em quinto lugar e fomos à Liga Europa. O clube, apesar de ter acabado de subir – com outro nome na altura, por questões administrativas – era um clube que tinha alguma experiência de primeira Liga. Na altura, desceu de divisão por problemas políticos. Era um clube que apesar de estar em transição para a primeira Liga, e o facto do primeiro ano ter corrido bem, cimentou imediatamente uma posição aqui na Turquia. Neste momento, temos um clube que é respeitado e temido pelas outras equipas. Tivemos um primeiro e um segundo ano excelentes e isso causou um grande impacto aqui na Turquia. Na segunda época, o sucesso não foi só apenas a nível doméstico, fizemos uma boa Liga Europa.
E em relação à língua… Como é que se lida com um treinador e com colegas que só falam turco?
No meu primeiro ano e meio, apanhei um treinador turco que não falava nada em inglês, mas aqui no clube há vários tradutores – como nos restantes na Turquia – e neste momento temos três. Agora só eu e o Luiz Carlos é que falamos português e temos sempre um tradutor connosco que nos acompanha também fora do clube, sempre que precisamos de alguma coisa. Por isso, a necessidade de falar turco não é tão grande e daí o meu turco não ser perfeito, apesar de me esforçar e tentar aprender. É um país com 80 milhões de pessoas e eu gostava de falar um bocadinho a língua deles e perceber melhor o que se passa na Turquia. Mas vou falando, não dá para ter uma grande conversa com um turco (risos)… mas já tenho uma perceção do uso da gramática e de que forma funciona a língua.
Pensa ficar na Turquia nos próximos anos?
Sim, neste momento tenho contrato por mais três anos. Ou seja, esta época e mais duas. Em princípio, quero cumpri-los mas o meu plano para o futuro só depende da minha mulher e dos meus filhos. Se eles estiverem bem, vou continuar por aqui. Se assim não for, teremos que reavaliar o nosso futuro. Claro que no futebol nunca se sabe o que se pode passar, a vertente desportiva fala sempre mais alto e não sei se entretanto vai aparecer uma boa proposta para sair daqui, mas, como disse, a minha decisão tem sempre de passar pela felicidade da minha família.
"Se aparecesse uma proposta de um dos grandes, claro que nem pensaria duas vezes"
E um regresso a Portugal?
Um regresso a Portugal só se for para um dos três grandes. Sempre foi um dos meus grandes objetivos e não pensaria duas vezes. Saberia que a minha mulher e os meus filhos estariam bem porque é o nosso país e é onde nós gostamos mais de estar. Se aparecesse uma proposta de um dos grandes, claro que nem pensaria duas vezes. Saberia que era o melhor para mim e para a minha família. Em termos financeiros, sendo sincero, dificilmente igualariam o que eu ganho aqui, mas não pensaria duas vezes.
Como é que lida a família que está em Portugal com a distância?
Não estando em Istambul, terão sempre que fazer escala. São nove horas e tal de viagem, o que dificulta a situação. Mas a minha mãe já me veio visitar, o meu pai veio logo nas primeiras semanas que estive aqui, os meus sogros também… Eu no Natal não posso ir a Portugal, mas em janeiro tenho sempre uns dias que aproveito para ir. Sinto falta, mas tem que ser. A verdade é que é difícil depois de dois anos sem natal, sem estar com a minha família, vai sendo difícil lidar.
"Se as pessoas conhecessem um bocadinho mais a Turquia, teriam uma ideia diferente"
Do que sente mais falta de Portugal? Para além da comida…
Sim, principalmente a comida (risos)… Mas por exemplo, eu gosto muito de mar e aqui em Ancara não tenho. O próprio passeio, ou ir beber um café… Essas pequenas coisas às vezes fazem repensar o futuro, mas a verdade é que a carreira é curta e tenho que olhar para o futuro. Não posso pensar muito nessas coisas, se não a estadia aqui torna-se mais difícil.
Há alguns jogadores portugueses a jogar na Turquia. Mantém algum contacto com eles?
Não tanto como gostaria, porque aqui os horários são diferentes. Nós passamos muito mais tempo nos clubes. Não é só ir ao treino e voltar para casa. Temos horários mais complicados. Normalmente estou com eles quando jogamos uns contra os outros. Depois dos jogos, se houver essa oportunidade, estamos todos juntos. Mas regularmente não estou com nenhum português.
Sente que na própria Turquia há diferenças culturais?
Eu penso que a Turquia é um país muito unido, no sentido que é muito uniforme. Claro que tem a parte Este, onde vivem os terroristas na montanha e que infelizmente já fizeram danos no resto do país, mas o resto do país é uniforme. Claro que as pessoas de Istambul e de Ancara, são mais sofisticados e lidam melhor com a presença de estrangeiros, mas é um país onde se nota uma cultura enraizada. Mas é um país com praias e locais lindíssimos. Se as pessoas conhecessem um bocadinho mais a Turquia, teriam uma ideia diferente.