"O presidente do PSG é o ministro sem pasta do Qatar"

O Benfica, a periferia do campeonato português e o ‘soft power’ da compra de Neymar, numa conversa sobre futebol com Fernando Seara.

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Pedro Filipe Pina
14/09/2017 09:39 ‧ 14/09/2017 por Pedro Filipe Pina

Desporto

Fernando Seara

Fernando Seara foi entrevistado do Vozes ao Minuto a propósito da sua candidatura autárquica em Odivelas.

A agenda era apertada mas o Notícias ao Minuto aproveitou também a conversa para falar um pouco das expectativas dos encarnados para o campeonato, de como foi o defeso para os três grandes e da transferência de Neymar de Barcelona para Paris, um negócio que bateu recordes no mundo do futebol.

E, se sobre o futebol português o conhecido benfiquista Fernando Seara está à espera de um ano competitivo, ainda para mais porque nesta época já só há uma entrada direta para a Liga dos Campeões, sobre o PSG a conversa envolveu Qatar, diplomacia e uma pequena lição sobre 'soft power'.

O Benfica é o campeão em título. Acha que vai ter a vida mais fácil ou difícil, esta época?

Este ano vamos ter uma época desportiva muito complexa e muito disputada, em razão de um facto: apenas o vencedor da liga terá acesso direto à Liga dos Campeões, o segundo classificado terá de ir à terceira eliminatória. É evidente que isso implica que Porto e Sporting se tivessem de reforçar.

Há menos margem de erro para todos.

Acho que nenhum dos três grandes pode permitir um grande distanciamento dos outros até dezembro, até ao final da fase de grupos da Liga dos Campeões, porque os primeiros três meses de 2018 serão já muito importantes para a disputa de final de campeonato. Cada um dos três vai ambicionar que cada um dos outros dois perca mais pontos até dezembro, sendo certo que espero que o meu Benfica já tenha perdido os pontos todos.

E neste defeso, quem é que acha que saiu a ganhar da época de transferências?

Cada um deles definiu a sua estratégia própria. O Benfica fez as opções que poderia fazer sem pôr em causa aquilo que chamo a estabilidade do balneário. O FC Porto nada fez de aquisições devido às circunstâncias, mas fez uma coisa muito importante: não deixar sair o Danilo, que é uma figura fundamental da equipa. E o Sporting... Vamos ver como gere estas saídas e não saídas de final de defeso, do Adrien [transferido para o Leicester] e do William Carvalho [não transferido].

E houve algum reforço que já lhe tenha chamado a atenção?

O Seferovic, do Benfica.

'Gabigol' poderá disputar o lugar com o Seferovic?

Não, acho que o Gabigol pode disputar o lugar, se se adaptar ao esquema, ao Salvio.

E há algum setor do Benfica que o preocupe mais?

Já percebi, mas não há nenhum setor que me deixe preocupado [risos]. Até pelo seguinte: o problema todo é que o Benfica, em função da natureza periférica da Liga portuguesa, tem que ser um clube formador-vendedor. E depois o que vale é uma equipa e um coletivo. Por vezes no meio desse coletivo há individualidades que se destacam, mas em razão da Liga portuguesa, essas individualidades, que são potenciadas por excelência na Liga dos Campeões, há que ter consciência de que não há meios para os segurar. Não tendo meios para os segurar…

E a transferência recorde de Neymar, veio agitar mais as águas?

O Neymar é o que eu ensino aos meus alunos: nas relações internacionais há dois conceitos de poder, 'hard power' e 'soft power'. O Neymar, como poderá acontecer com outro jogador para o ano, em função das circunstâncias, é o resultado da utilização do futebol como elemento de 'soft power'.

Este 'poder suave' implica poder de marketing e poder positivo. Perante o isolamento do Qatar, que está ligado aos xiitas muçulmanos, em relação às monarquias sunitas próximas, o Qatar utiliza o futebol para, em primeiro lugar, impedir qualquer tentativa de pôr em causa a realização do Mundial de Futebol de 2022 no Qatar, em segundo lugar, dizer que o Qatar, ao contrário do que dizem outras monarquias na região, não está isolado. E tanto que não está isolado que tem meios financeiros para fazer uma grande aquisição no futebol europeu. E logo de um clube, o Barcelona, que até tinha sido patrocinado pelo Qatar [através da Qatar Airways], para um clube de referência numa capital europeia [o PSG, em Paris], e logo em França, um país fundamental para manter relações no setor energético.

É já o mundo do futebol num outro plano?

No futebol, a partir do momento em que se tornou uma indústria e passou a ser dominado por mecanismos financeiros, entrou o poder russo, entrou o poder chinês e entrou o poder árabe. E o poder árabe, ao contrário do que algumas pessoas dizem, tem uma estrutura própria. Hoje em dia digo que o presidente do PSG [Nasser Al-Khelaifi] é o ministro sem pasta do governo do Qatar.

É um diplomata também.

Nós em Portugal também defendemos que o Presidente da República faz diplomacia económica. O presidente do PSG faz diplomacia de 'soft power'. E já reparou que é tanta diplomacia que o Emmanuel Macron diz 'ainda bem que chegou o Neymar' e o ministro das Finanças diz 'ainda bem que chegou que paga aqui os impostos'?.

*Pode ler a primeira parte desta entrevista aqui.

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