"A suspensão da atividade das contrastarias bloqueou qualquer tentativa de reação e recuperação do setor neste período, impedindo, por exemplo, a comercialização via comércio eletrónico. Consideramos que é o momento de repensar o atual modelo de certificação, abrindo, por exemplo, a possibilidade de certificação por entidades privadas, devidamente credenciadas, terminando com o regime de monopólio", sustenta o presidente da AORP, citado num comunicado.
De acordo com Nuno Marinho, na sequência das restrições impostas devido à pandemia de covid-19, o serviço de certificação das peças de joalharia em Portugal -- assegurado em exclusividade pelas contrastarias da Imprensa Nacional Casa da Moeda (INCM) -- esteve suspenso de 16 de março a 03 de maio.
Esta situação "bloqueou quase por completo o setor, já afetado pela natural retração de consumo, pelo encerramento do retalho e pela redução de recursos humanos, devido às recomendações de contenção de propagação do vírus".
Recordando que o setor se encontra regulado pelo Regime Jurídico da Ourivesaria e das Contrastarias (RJOC), que obriga à certificação das peças de joalharia, "salvo pequenas isenções", Nuno Marinho sustenta que "em vários países europeus, como Espanha, o sistema de certificação com opção de serviço público e privado é bastante eficiente", devendo por isso ser equacionado um modelo semelhante em Portugal.
Na semana em que as contrastarias reabriram, a associação divulgou os resultados de um inquérito de monitorização dos efeitos da pandemia de covid-19 na ourivesaria portuguesa, que diz evidenciar um "impacto extremamente grave" na atividade.
Desenvolvido junto de uma amostra de 78 empresas associadas da AORP, o questionário revela que 93% viram a sua atividade reduzida em mais de 50%, destacando-se entre as principais consequências sentidas o cancelamento de encomendas (59%), 'stocks' parados por falta de certificação (51,3%), quebra na procura (71,3%) e ainda problemas logísticos na cadeia de abastecimento (34,6%) e interrupções nas linhas de produção (34,6%).
Naquele que foi o segundo estudo desenvolvido pela associação para aferir o impacto efetivo e previsto da crise nas empresas do setor da ourivesaria e relojoaria, 60,3% das empresas inquiridas disse encontrar-se em 'lay-off' total, 11,5% em 'lay-off' parcial e 14,1% com a atividade encerrada.
Das empresas abrangidas pelo 'lay-off', mais de metade (53%) preveem retomar a sua atividade já no mês de maio, 22,7% em junho e 24,2% disseram ainda não ter previsão de reabertura.
Quanto aos planos de investimento, 70,5% das empresas revela ter os seus investimentos suspensos, nomeadamente reforço da sua capacidade produtiva (57,4%), aumento de recursos humanos (39,7%), 'marketing' e comunicação (39,7%), melhoria de instalações (32,4%) e internacionalização (32,4%).
Quando questionadas sobre as suas expectativas para os próximos meses, 39,7% das empresas inquiridas antecipa uma descida entre 75 e 100% da sua receita, 29,5% um decréscimo de 50 a 75% e 9% uma redução de entre 25 e 50%.
Quanto à possibilidade de encerrar definitivamente a atividade, 30,8% diz existir um "risco elevado", 29,5% um "risco moderado" e 33,3% um "risco baixo", sendo que 34,6% prevê uma recuperação da atividade muito lenta (entre 12 a 24 meses), 29,5% estima entre seis a 12 meses e 14,1% estão mais pessimistas, antecipando a retoma apenas dentro de dois anos.
Já relativamente às perspetivas de recuperação da economia portuguesa, 41% afirma esperar ser muito lenta (entre 12 a 24 meses), 25,6% estima entre seis a 12 meses e 16,7% apenas depois de dois anos.
Para o presidente da AORP, "apesar do sentimento pessimista entre as empresas", a convicção da associação é que "o setor venha a inverter este impacto negativo nos próximos meses e a traçar a sua recuperação, adaptando-se ao contexto pós covid-19".
Neste sentido, diz Nuno Marinho, a associação está a desenvolver um conjunto de formações e de plataformas digitais precisamente para "apoiar as empresas neste novo e imprevisível desafio, onde a palavra-chave é, sem dúvida, adaptação".
O setor da ourivesaria portuguesa é composto por 4.300 empresas, representando um volume de negócios anual de 1.000 milhões de euros, dos quais 10% correspondem a exportação.
Da amostra de 78 empresas respondentes ao inquérito da AORP, 48,7% correspondem a indústria, 32,1% a comércio a retalho, 11,5% comércio por grosso e 7,7% a outras atividades conexas.
A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de covid-19 já provocou mais de 254 mil mortos e infetou quase 3,6 milhões de pessoas em 195 países e territórios.
Mais de um 1,1 milhões de doentes foram considerados curados.
Em Portugal, morreram 1.089 pessoas das 26.182 confirmadas como infetadas, e há 2.076 casos recuperados, de acordo com a Direção-Geral da Saúde.
A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.
Para combater a pandemia, os governos mandaram para casa 4,5 mil milhões de pessoas (mais de metade da população do planeta), encerraram o comércio não essencial e reduziram drasticamente o tráfego aéreo, paralisando setores inteiros da economia mundial.
Face a uma diminuição de novos doentes em cuidados intensivos e de contágios, alguns países começaram a desenvolver planos de redução do confinamento e em alguns casos a aliviar diversas medidas.