"Eu acho que onde o plano falha é em não encontrar, ou, pelo menos, não ter medidas que façam baixar os custos para as empresas, os custos de contexto", disse o professor da Universidade do Minho (UM) à agência Lusa.
O académico considerou que o Plano de Recuperação e Resiliência, já apresentado pelo primeiro-ministro, "pode ter algum efeito positivo no caso dos custos dos transportes, com algum investimento em algumas vias de comunicação", mas 'peca' nas questões energéticas.
"Apesar de apostar na transição energética, não tem nada que permita antever que vá haver uma redução nos custos de energia para as empresas portuguesas. É uma das principais queixas dos empresários nacionais e é um dos fatores de perda de competitividade face a outras economias", explanou.
João Cerejeira prosseguiu, dizendo que "há rendas associadas a monopólios existentes", e que "concorrência no setor da energia é baixa", alargando ainda o escopo da sua análise ao setor das "telecomunicações e noutros setores".
"A questão do hidrogénio pode ser um investimento muito interessante para a economia portuguesa, mas era importante explicar que se trouxer energia mais cara, deixa de ser interessante, acho eu", asseverou.
O economista realçou a necessidade de haver uma análise de custo-benefício - "que não existe, em alguns dos investimentos que foram anunciados" - contabilizando as mais-valias para os consumidores e as empresas.
"Isso tem de ser ponderado, e Portugal sabemos que paga uma energia cara, fruto de várias opções feitas no passado, e não vejo grande iniciativa política no sentido de alterar esse padrão", referiu, lamentando ainda a inexistência de um mercado energético europeu, com existência de redes nacionais e "mercados fragmentados".
Em termos de infraestruturas, João Cerejeira salientou a aposta na ferrovia - "um parente pobre" -, advogando a melhoria dos acessos às duas principais cidades do país, Lisboa e Porto.
"Se houver melhores acessibilidades quer ao Porto quer a Lisboa, por via de ferrovia, então permite-se o crescimento e a valorização da habitação em áreas que são periféricas, e isso vai descongestionar a procura para o centro da cidade", o que permite ter um "efeito benéfico, que é a diminuição do custo de habitação".
João Cerejeira lembrou ainda que "há áreas do território em Portugal que não têm, pura e simplesmente, ferrovia", como as capitais de distrito Vila Real ou Viseu, e que nenhum dos aeroportos tem ligação a ferrovia pesada, mas apenas aos metropolitanos de Lisboa e Porto.
O economista defendeu ainda que "devia haver mais concorrência no setor ferroviário" de passageiros, que além da pública CP tem ainda "um operador privado, monopolista, que é a Fertagus".
Questionado sobre a possibilidade da criação de um 'cluster' ferroviário, à semelhança do que acontece na aeronáutica ou no setor automóvel, o professor da UM reconheceu que quando há grandes encomendas do Estado, "regra geral, é possível que haja empresas nacionais que beneficiem como fornecedores de componentes".
No entanto, alertou que, "pelo menos na situação atual", o mercado português "nem tem volume nem regularidade suficiente para que haja um 'cluster' propriamente ferroviário".
"A não ser que haja aqui um plano que seja depois cumprido, em termos de aquisição e renovação de material, que crie os incentivos aos potenciais construtores se instalarem e ter um volume de encomendas regular que seja minimamente previsível, ou então também não há incentivo para a criação desse 'cluster'", prosseguiu.