A invasão russa da Ucrânia pode complicar a tarefa do BCE, que terá de ajustar a sua resposta monetária para enfrentar a inflação elevada, mas corre o risco de uma desaceleração do crescimento na zona euro.
Esta crise surge depois de na reunião de fevereiro o BCE não ter fechado a porta a uma subida das taxas de juro ainda este ano, um cenário que até então tinha afastado.
"Após a reunião de fevereiro, dadas as repetidas surpresas ascendentes da inflação, as melhorias no mercado de trabalho e uma mudança de tom por Christine Lagarde, pensámos que em março o BCE aceleraria a redução das compras de ativos mais do que o esperado em dezembro e abriria a porta ao aumento das taxas de juro no quarto trimestre", refere uma nota divulgada pela Unidade de Estudos Económicos e Financeiros do BPI.
"No entanto, a eclosão do conflito entre a Rússia e a Ucrânia pode moderar esta mudança na política monetária. O BCE pode optar por manter uma posição paciente e cautelosa na reunião de março para avaliar a evolução deste conflito e as suas implicações económicas", acrescenta a nota.
A guerra e as sanções impostas pelos países ocidentais à Rússia têm consequências ainda difíceis de avaliar para as economias europeias.
Neste contexto geopolítico sem precedentes desde o fim da Guerra Fria, o BCE "está pronto para tomar todas as medidas necessárias" para garantir a estabilidade de preços, disse recentemente a sua presidente, Christine Lagarde.
O risco de "estagflação", uma combinação de inflação e estagnação económica "aumentou claramente", segundo Carsten Brzeski, economista do ING.
O conflito já levou a uma subida do preço das matérias-primas, que pode ainda acelerar.
Na quinta-feira, o BCE terá novas previsões macroeconómicas que integram os dados mais recentes, nomeadamente a inflação recorde de 5,8% registada em fevereiro na zona euro, bem como o cálculo de efeitos previsíveis do conflito ucraniano.
Os observadores esperam que a instituição liderada por Lagarde confirme a conclusão, no final deste mês, do programa de compra de ativos lançado para contrariar os efeitos da pandemia (PEPP).
O BCE decidiu em dezembro comprar dívida com um outro programa que já existia antes, conhecido como APP, uma vez concluídas as compras de emergência devido à pandemia, mas a um ritmo mais lento do que com o PEPP.
"Acreditamos que o BCE irá confirmar o fim das compras líquidas do PEPP até ao final de março e o aumento das compras líquidas de APP de 20 mil milhões de euros por mês para 40 mil milhões de euros durante o segundo trimestre. Para os próximos trimestres é possível que a declaração do BCE mostre muito mais flexibilidade do que as últimas, onde apresentou o ritmo de redução do APP", referem os economistas do BPI.
Com o aumento da tensão geopolítica, o BCE deve "evitar fazer alusão a prazos finais" para as compras de obrigações e a "datas para o início da subida das taxas", segundo Brzeski.
Os analistas do Goldman Sachs esperam um endurecimento da política monetária do BCE em dezembro, mas acrescentam que a possibilidade de um conflito armado prolongado e cortes no fornecimento de gás possam atrasar essa estratégia de saída de uma política bastante acomodatícia que vigorou nos últimos dois anos devido à pandemia.
Na quinta-feira, o BCE deve também rever em alta a sua previsão de inflação para 2022, que atualmente está em 3,2%, já acima do seu objetivo de 2% a médio prazo.
"Acreditamos que a previsão do BCE para o PIB [Produto Interno Bruto] em 2022 diminuirá ligeiramente e que a inflação esperada para 2022 será muito superior ao que a instituição esperava em dezembro (3,2%)", assinala a nota do BPI.
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