Luís Marcos, da Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID), disse hoje que os dados recolhidos nas sete estações meteorológicas da organização (algumas com 20 anos de dados) mostram que este ano agrícola no Douro (entre novembro de 2021 e outubro de 2022) é o "ano mais seco e provavelmente um dos anos mais quentes" de que há registo.
O recorde de temperatura terá sido atingido em julho, com os 47 graus verificados na zona do Pinhão, concelho de Alijó.
As projeções até 2050 "são preocupantes" e mostram uma tendência para a diminuição da precipitação durante o ciclo vegetativo e aumento da temperatura média anual.
"Não considerámos que condene a viticultura na região, mas obriga a tomar medidas que possam diminuir os impactos que as alterações climáticas possam vir a ter", salientou Luís Marcos, que falava à agência Lusa à margem de um seminário que a ADVID realiza hoje, no Peso da Régua, distrito de Vila Real.
O projeto "G.O.T.A. -- gerir, operacionalizar e transferir. Uso eficiente da água na vinha: beneficiar de cada gota" que a associação está a implementar pretende, precisamente, contribuir para a disseminação, entre os viticultores, de boas práticas no uso da água.
E algumas dessas práticas estão já a ser aplicadas pelas empresas parceiras no projeto: a Real Companhia Velha, Poças, Sogrape e Symington Family Estates.
A Real Companhia Velha (RCV) está a criar condições para guardar a água, nomeadamente através da construção de charcas, e a fazer um uso "muito eficiente e racional" da rega, a qual só é aplicada em parcelas e castas mais sensíveis ao 'stress' hídrico.
"Fazemos na empresa um conjunto de práticas que visam, precisamente, a adoção de uma rega deficitária para repor apenas uma fração daquilo que a planta perde, tendo em vista o objetivo final que é produzir vinhos de qualidade", explicou Rui Soares, da RCV.
A Poças tem em curso dois ensaios, um com uso de redes de ensombramento e outro com a aplicação de Biochar (carvão vegetal aplicado no solo), estando para arrancar um terceiro ensaio com o aproveitamento de águas residuais para rega gota a gota.
Maria Manuel, desta produtora de vinhos, explicou que as redes de ensombramento são, no fundo, um chapéu para as vinhas para reduzir a radiação, atenuar a temperatura na zona dos bagos, o que tem "influência na redução da evapotranspiração e, portanto, redução, do consumo de água", destacando os resultados positivos desta técnica.
"No próximo ano iremos arrancar com a validação da rega com águas residuais urbanas para irrigação de uma pequena parcela de vinha, onde vamos avaliar a qualidade da uva, ver o comportamento fisiológico, impacto no solo e, com isso, procuramos uma fonte alternativa de água", explicou, salientando que a "poupança de água é um imperativo".
José Manso, da Sogrape, disse que a poupança de água tem de ser feita nos diferentes níveis da cadeia produtiva e que "é inerente ao ADN de uma empresa ser eficiente".
Na vinha, explicou, o coberto vegetal, o armamento do terreno e as drenagens são feitos no intuito da água da chuva se infiltrar no solo e, com isso, reduzir as necessidades da planta.
Já na adega foram implementadas pequenas medidas como a troca de torneiras, a água usada nas lavagens é reaproveitada até chegar à fase de lavagem do chão, as tubagens são limpas por vácuo.
"Atualmente estamos a utilizar diferentes formas de abordagem à monitorização do estado da água na planta, recorrendo a imagens de satélite integradas com sensores de solo, um novo projeto europeu onde somos parceiros e que nos vai permitir criar informação para atuar de forma mais rápida e chegar, com essa informação, ao conjunto das vinhas que temos em exploração no Douro", disse Fernando Alves, da Symington Family Estates
O responsável frisou que essa informação será partilhada com os produtores que necessitem de fazer uma otimização do uso da água.
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