"Infelizmente, Moçambique não tinha um período de graça nas regras das emissões de dívida doméstica; se estiverem atrasados mais de 5 dias é um 'default' ao abrigo dos nossos critérios, por isso, como ultrapassaram os cinco dias em muitos casos, isso levou-nos a colocar o rating em SD ['Selective Default', no original em inglês], explicou o diretor dos rating soberanos da S&P, Ravi Bathia.
Em entrevista à Lusa no seguimento da descida do 'rating' para as emissões em moeda local, de B- para SD, na quarta-feira, e depois subindo para CCC+, na quinta-feira, um nível abaixo da notação que tinha no início da semana, Ravi Bathia explicou que a descida para SD foi um sinal enviado aos investidores por uma questão de transparência, para assinalar que Moçambique atrasou-se nos prazos de pagamentos da dívida interna entre fevereiro e maio, mas que a situação já está resolvida.
"Subsequentemente, Moçambique resolveu a questão e estão a pagar dentro do período devido, vemos o problema resolvido, e por isso voltámos a tirá-los do 'default', mas devido às pressões sobre o sistema financeiro e a pressões inflacionárias e de despesas pública, colocámos o 'rating' para emissões em moeda local em CCC+ porque ainda consideramos que subsistem dificuldades, que Moçambique está a resolver, e numa posição melhor, e é por isso que melhorámos o rating", acrescentou o diretor da S&P.
Moçambique viu assim a análise da S&P sobre as emissões soberanas domésticas piorada em um nível, de B- para CCC+, mas manteve inalterado o 'rating' relativo às emissões internacionais, nomeadamente os Eurobonds, sobre os quais não houve qualquer atraso, mantendo-se, por isso, em CCC+/C.
"Nas emissões em moeda externa, tiveram algumas questões a nível bilateral, mas continuaram a pagar na totalidade e em tempo nos compromissos de dívida comercial; Nós avaliamos a capacidade e vontade de pagar a dívida comercial, mas no caso da bilateral, mesmo que se atrasem, isso não implica um mexida no rating", explicou o analista.
Questionado sobre a razão de a S&P ter descido o rating de B- para Incumprimento Seletivo durante um dia, e depois ter subido para CCC+, um nível abaixo do inicial, Ravi Bathia respondeu: "Nós queríamos assinalar que falharam pagamentos entre fevereiro e maio, quisemos refletir isto aos investidores por uma questão de transparência; colocámos em SD para refletir que falharam pagamentos devidos, mas não temos de ficar em SD durante muito tempo, foi uma questão de demonstrar que houve falhas nos pagamentos. Só é preciso ir a SD por um dia por uma questão de transparência".
Questionado sobre a razão de o rating ter sido revisto de 'default' para um nível abaixo do que estava, o analista argumentou que a situação macroeconómica mudou desde a última avaliação.
"Ainda sentimos, mesmo tendo sido resolvido, que há questões sobre o sistema de pagamento que podem ter sido tratadas antes", argumenta, acrescentando que houve outros fatores: "as pressões inflacionários aumentam os custos no sistema, nos salários e noutras linhas de defesa, as autoridades enfrentam um aperto orçamental que reduz a quantidade de dinheiro disponível para pagamento de dívida, mesmo no mercado doméstico".
Sobre a importância para a economia dos investimentos nos grandes projetos de gás natural no norte do país, o analista responsável na S&P assume que são fundamentais para transformar a economia moçambicana, e por isso conclui que até os projetos entrarem em funcionamento e o gás começar a ser exportado, a situação macroeconómica do país não vai mudar substancialmente.
"Doravante, até vermos os grandes projetos de gás a funcionar, as pressões orçamentais vão continuar e isso afeta o 'rating' da moeda local", concluiu.
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