Na véspera de o executivo comunitário apresentar em Bruxelas o seu livro branco para o setor da defesa, no qual defende previsibilidade financeira para investimentos na área da segurança, várias fontes comunitárias ouvidas hoje pela Lusa salientaram o ceticismo da instituição em avançar novamente com um modelo semelhante ao adotado após a pandemia, no qual a UE foi aos mercados, a taxas mais favoráveis, redistribuindo depois esses montantes pelos países.
"A principal questão é que, antes da covid-19, a dívida pública [dos países da UE] não estava tão elevada", referiu um alto funcionário europeu à Lusa.
Além disso, "a história agora também é diferente" porque, ao contrário do que aconteceu com o Plano de recuperação para a Europa (que veio financiar o Plano de Recuperação e Resiliência -- PRR), desta vez não seriam os países europeus do sul os maiores beneficiários -- foram na altura porque foram os mais abalados pelos efeitos económicos e sanitários da pandemia.
Desta vez, seriam antes a Polónia, a Finlândia, a Suécia e a Estónia, por exemplo, dada a proximidade à Rússia e à Ucrânia, que foi invadida pelas forças russas em fevereiro de 2022, explicaram as mesmas fontes.
"Não consigo imaginar termos de dizer aos países do sul que são eles que têm de pagar para os países do norte. Não iria funcionar e criaria um debate tóxico", apontou ainda outra fonte.
Se a Comissão Europeia -- em nome da UE -- contraísse dívida comum, as condições de empréstimo seriam mais favoráveis para a maioria dos países do que se estes o fizessem individualmente pois beneficiariam das fortes notações de crédito dos Estados-membros mais ricos.
Mas, neste caso, os maiores beneficiários dos montantes seriam os países mais próximos do conflito.
Por essa razão, a Comissão Europeia está, neste momento, "cética" para propor tal medida, isto "a não ser que aconteça algo dramático", segundo as fontes ouvidas pela Lusa.
Portugal, juntamente com Espanha, tem vindo ainda a defender uma nova emissão de dívida conjunta na UE para financiar a aposta em defesa, semelhante ao PRR.
Embora esta solução não seja totalmente descartada pelos líderes da UE, a Holanda já fez saber estar contra e a Alemanha disse estar cética.
O executivo comunitário está, ainda assim, a explorar outras opções de financiamento, por exemplo através de empréstimos em condições favoráveis do Mecanismo Europeu de Estabilidade (mas apenas para a zona euro), da reafetação de verbas e de outros programas europeus no âmbito do próximo orçamento da UE a longo prazo, cuja proposta deverá ser apresentada no verão.
Certo já é que Bruxelas quer avançar já com o seu plano de 800 mil milhões de euros para defesa na UE, apresentado no início do mês, que inclui a ativação da cláusula de salvaguarda nacional das regras orçamentais para evitar procedimentos por défice excessivo (para aumento da despesa pública com defesa num acréscimo máximo de 1,5% do PIB por ano, resultando em 650 mil milhões de euros para quatro anos) e um novo instrumento europeu de crédito em circunstâncias extraordinárias (num total de 150 mil milhões de euros, semelhante ao de empréstimos a condições favoráveis criado durante a covid-19 para evitar o desemprego).
As restantes vertentes do plano incluem a reafetação de verbas de outros fundos (como da Coesão, para projetos de uso civil e militar), verbas do Banco Europeu de Investimento (que deverá passar a ter regras mais flexíveis para estes investimentos) e ainda capital privado.
O Livro Branco sobre o futuro da defesa será apresentado na quarta-feira.
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