Luís Osório sobre Rogério Samora. "Quando morreu foi tudo muito discreto"

O ator partiu no dia 15 de dezembro depois de vários meses a lutar pela vida.

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© José Lorvão

Notícias ao Minuto
29/12/2021 07:04 ‧ 29/12/2021 por Notícias ao Minuto

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Luís Osório

Cerca de duas semanas depois da morte de Rogério Samora, Luís Osório decidiu recorrer à sua página de Facebook para escrever sobre o ator. 

"[...] Conheci o Rogério Samora há mais de vinte anos. Jantámos um par de vezes. Convenci-o a participar na grande final de 'Zapping', porventura o programa preferido (juntamente com 'Portugalmente') entre os que 'inventei' no meu curto percurso televisivo. O Rogério participou nos dois últimos episódios da série. E o seu papel era o de dividir, de retirar o pior dos personagens, de os provocar", começou por recordar. 

"O programa vivia da ambiguidade entre a ficção e a realidade. E interessava-me que Rogério fizesse de si próprio. Interessava-me que fosse inclemente com os outros personagens, que os provocasse, que os retirasse da zona de conforto. Fê-lo com brilhantismo", acrescentou, lembrando depois a partida do ator, aos 62 anos, no dia 15 de dezembro.

"Foi enorme a discrepância entre a importância do seu percurso e o modo demasiadamente discreto como foi celebrada a sua partida", disse.

"Rogério foi o ator mais poderoso da sua geração. Tinha – como a generalidade dos melhores – uma espécie de nuvem no que era. Custava-lhe ter uma vida 'real', custava-lhe separar o que era verdadeiro do que era ficção, não lhe interessava. Ou, para ser mais exato, acreditava convictamente que a verdade, qualquer que fosse, mesmo a sua, só poderia ser encontrada nos romances, nas peças de teatro ou nos filmes. Afinal, o que significa uma vida comum em comparação com o que ficava no que a arte tornava maior?", continuou, afirmando que o artista "não era, nas definições mais convencionais, uma 'boa pessoa'". 

"Era agressivo, atemorizava as pessoas quando chegava, se impunha ou fazia questão de marcar posição e lixar as verdades adquiridas. Era excessivo, absoluto e obsessivo. Não era agradável por tudo nele ser combate e perfecionismo – a maioria de nós não consegue tolerar pessoas assim, não há pachorra. Mas o Rogério era um ator extraordinário e um homem capaz de ser terno e de surpreender com um abraço ou um sorriso nos olhos", destacou, falando depois de alguns papéis que marcaram a carreira de Rogério Samora. 

Na mesma publicação, referiu que o ator começou a aceitar convites para fazer novelas a partir de determinada altura na sua carreira. "Não queria estar dependente do cinema e ainda menos do teatro, desejava ganhar dinheiro para poder nele não pensar. A sua aura foi enfraquecendo, mas continuou tão ou mais marcante entre os atores e o meio artístico", partilhou, não esquecendo a noite dos Globos de Ouro, da SIC, assim como os meses em que esteve a lutar pela vida. 

"Quando ficou doente e internado – em plenos Globos de Ouro – o seu nome não foi pronunciado. A SIC teve a humildade de corrigir (e bem) à posteriori.
No seu longo e penoso internamento o país não acompanhou com preocupação ou lágrimas o seu combate pela vida como sucedeu com outras figuras em circunstâncias idênticas", escreveu. 

"Quando morreu foi tudo muito discreto. O país despediu-se de um ator que nunca foi verdadeiramente amado pelo povo. Os seus amigos disseram presente, mas mesmo assim alguns deixaram cair um 'mas'. Felizmente os que o amavam, e não eram tão poucos quanto isso, souberam oferecer-lhe um último palco", realçou. 

"Um quase esquecimento que não vem de agora. Sabem quantos prémios de representação ganhou? Um único e atribuído pela TV 7 Dias. Rogério não ganhou Globos de Ouro ou qualquer outro prémio. Ao contrário de dezenas de colegas cujo talento, na larga maioria dos casos, estava a quilómetros do seu. Foi o preço a pagar. E ele sabia-o", disse ainda. 

Antes de terminar, frisou: "Rogério Samora morreu. Faz agora 15 dias. E é tempo de dizer que partiu um ator extraordinário. Num tempo como este, um tempo em que apenas parecem contar as emoções, parece que não temos nada a que nos agarrar quando nele pensamos. Não era empático. Não nos comovia com histórias suas. Não nos emocionava com a sua vida. Por isso, preferimos emocionar-nos quando morre alguém que, sendo menor, nos saiba abraçar e oferecer-nos um pouco da sua vida. O Rogério não o fez. Ah, mas foi grande. Marcante. Um dos melhores de sempre. Único. É desse homem que nos devemos despedir. Era desse ator que o Rogério gostava que nos despedíssemos… porque o resto, quando comparado com o que nos deixa, é secundário". 

Veja a publicação na íntegra:

Leia Também: De passagem pelo Porto, Ana Marques lembra Rogério Samora

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