"Como podemos envolver as crianças nesta fase de adaptação?", é esta a questão que a pediatra Catarina Timóteo coloca a todos os pais e cuidadores, convidando-os a pensar mais a fundo na enorme complexidade de ser criança e ter de entender o surgimento de um mundo novo - um 'mundo de Covid' - com o qual os próprios adultos ainda mal ou pouco sabem lidar.
O que lhes dizer? Como explicar o que está a acontecer? Como podemos atenuar os sintomas de ansiedade dos mais novos e fazê-los sentirem-se úteis? E ao mesmo tempo deixá-los ser aquilo que realmente são: 'apenas' crianças.
Para quem tem filhos, aqui ficam algumas dicas da pediatra Catarina Timóteo de apoio à adaptação de rotinas e sobre como esclarecer as crianças sobre a pandemia Covid-19.
Aconselha a manter os horários habituais, nomeadamente os escolares, ou devem ser alterados?
É impossível manter os horários iguaizinhos, até porque as dinâmicas familiares vão ser totalmente diferentes. Eu acho que o desafio será organizar novos horários, que sejam compatíveis com o trabalho dos pais (muitos estão em teletrabalho), as tarefas escolares dos filhos, as tarefas de casa e alguns momentos de descontração e lazer. Aconselho a escrever um horário para a semana, fazer isso em grupo e com o acordo de todos lá em casa, que não seja demasiado inflexível, mas com alguns pontos obrigatórios, e depois ir adaptando se não estiver a resultar.
Em que medida devem as crianças consumir TV ou redes sociais, tendo em conta o fluxo de notícias que pode criar níveis elevados de ansiedade?
Acho que todos nós, incluindo adultos, devemos dosear a quantidade de notícias que lemos e vemos. É muito difícil, dada a quantidade de informação que chega até nós, involuntariamente. Seria possível desligar o telemóvel, TV, e outros meios digitais durante alguns períodos do dia…? Ou optar por ver apenas as notícias ao final do dia e desligar as notificações das redes sociais…? Não sei se existe a quantidade certa. Devem ser escolhidas fontes fiáveis e objectivas, os conteúdos devem ser supervisionados e explicados claramente, sem pressas e com linguagem adequada à idade.
Como diminuir os níveis de ansiedade nas crianças?
As rotinas bem definidas diminuem sempre a ansiedade nas crianças, por isso o primeiro passo é organizar os dias da família. As crianças devem sentir que fazem parte da nova organização, que têm uma palavra a dizer, que o seu papel é importante neste momento de crise. Ao mesmo tempo é importante ter noção que um exagero das suas responsabilidades lhes trará inquietação desnecessária. Não lhes pedir o que não têm idade para fazer ou assumir! Será também benéfico sentirem que não lhes estão a ser escondidas informações (a imaginação pode ser ainda pior que a realidade).
Como podem os pais responder a essas questões sem causar alarmismo?
Respondam claramente às perguntas, sem dramatismo, e sempre com a tónica no que está a ser feito para diminuir o problema. Também tranquiliza certamente as crianças se ouvirem os pais falar de outros assuntos, ler outras coisas, ver outros programas de TV. Fomentem o contacto virtual com a família e também com o grupo de amigos da criança, através das redes sociais; utilizem a voz mas também a imagem, mostrem o que estão a fazer, o que fizeram… deixe-os falar.
Fazer algum tipo de exercício pode ser positivo?
Manter a atividade física é outro ponto essencial para diminuir a ansiedade. Podem também organizar com a família e amigos sessões de ginástica e dança conjuntas, através das redes sociais, e existem também videojogos com essa temática.
Como lhes explicar que apesar de estarem em casa os pais têm de continuar a trabalhar?
Mais uma vez a honestidade e simplicidade é a chave. As crianças já perceberam que algo 'grande' está a acontecer no mundo e também devem saber que agora é o momento em que todos temos que contribuir. Podemos explicar-lhes que somos super-heróis com uma missão: a missão dos pais será continuar a trabalhar de casa e cuidar dos filhos, a missão dos filhos é ajudar os pais cumprindo as tarefas estipuladas no horário que fizeram em conjunto.