Não é novidade, mas ainda está aquém do seu potencial nos hospitais públicos, onde continua pouco implementada. A radiologia de intervenção é um procedimento que utiliza a imagem para o diagnóstico e tratamento de pequenos tumores e metástases de um modo pouco invasivo e que permite reduzir o tempo de internamento dos doentes.
O procedimento a que os utentes são submetidos implica uma pequena incisão na pele, através da qual é introduzida uma 'agulha especial' que atua na lesão. Com a ajuda de uma ecografia, o médico consegue posicionar devidamente essa 'agulha' e fazer uma termoablação percutânea. "No fundo, a lesão irá ser 'queimada' ou 'congelada' num processo que leva à sua destruição", explica ao Lifestyle ao Minuto Pedro Marinho Lopes, coordenador da unidade funcional de radiologia de intervenção do serviço de imagiologia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia.
Esta técnica tem a particularidade de poder ser usada em doentes em que a cirurgia tradicional é contraindicada, apresentando um "menor risco de complicações".
© Pedro Marinho Lopes
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O que é a radiologia de intervenção e o que traz de inovador?
É uma área de diferenciação dentro do universo de uma especialidade médica chamada radiologia, que se dedica ao diagnóstico e tratamento de várias patologias de um modo minimamente invasivo, com recurso a técnicas de imagem, fazendo uso das mais modernas tecnologias.
E que técnicas inclui?
O espectro de atuação é bastante amplo. Tradicionalmente, dividem-se os procedimentos em técnicas de diagnóstico e terapêuticas. No plano diagnóstico, temos, sobretudo, as biópsias orientadas por fluroscopia, ecografia, tomografia computorizada ou mesmo ressonância magnética. As angiografias com intuito diagnóstico são também outro exemplo, sendo que têm vindo a ser substituídas por técnicas não invasivas (angio-TC e angio-RM), ficando as técnicas de angiografia reservadas para os procedimentos terapêuticos. No plano terapêutico, o campo de actuação é muito alargado, destacando-se as técnicas de embolização: hemorragia, lesão tumoral, malformações artério-venosas e patologia osteolarticular, drenagens biliares percutâneas, gastrostomias, termoablações, técnicas de trombólise venosa, colocação de cateteres e por aí além. Acabamos por poder colaborar com praticamente todas as especialidades médicas.
A seu ver, qual a que mais tem contribuído para a melhoria dos cuidados prestados aos doentes?
É difícil escolher uma única opção, mas uma das técnicas realizadas pela radiologia de intervenção que, na minha opinião, em muito tem contribuído para a melhoria dos cuidados prestados aos doentes é a termoablação percutânea. Trata-se de um procedimento minimamente invasivo, realizado apenas com um corte milimétrico na pele. É tecnicamente semelhante à realização de uma biópsia. É introduzida na lesão, através da pele, uma 'agulha especial' que a irá tratar, recorrendo a métodos térmicos, como radiofrequência, micro-ondas ou crioablação. No fundo, a lesão irá ser 'queimada' ou 'congelada' num processo que leva à sua destruição. Têm a vantagem de substituir a cirurgia e terem menor risco de complicações. Além disso, estes procedimentos são orientados por ecografia ou tomografia computorizada e duram cerca de uma hora. São indolores para o doente, uma vez que são realizados sob sedação ou anestesia geral, com a colaboração de anestesiologia.
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Em que situações é que estes procedimentos podem ser indicados?
No tratamento de fases iniciais de algumas neoplasias, em doentes que não são candidatos a cirurgia, por comorbilidades ou risco aumentado de complicações, ou no tratamento de alguns nódulos benignos. Estas técnicas podem ser aplicadas no fígado, rins, pulmão, osso, mama, tiroide e tecidos moles.
As técnicas de termoablação ao serem minimamente invasivas e realizadas percutaneamente, isto é, através da pele, com uma incisão milimétrica, permitem menores tempos de internamento, menor risco de complicações, custos menores e um retorno mais rápido à vida ativa
Qual a diferença entre uma termoablação percutânea e uma cirurgia?
As técnicas cirúrgicas são mais invasivas, com incisões maiores, maior risco de complicações e tempos de internamento mais prolongados. Por norma, há também necessidade de exérese [cirurgia] de maior quantidade de parênquima do órgão a tratar. As técnicas de termoablação ao serem minimamente invasivas e realizadas percutaneamente, isto é, através da pele, com uma incisão milimétrica, permitem menores tempos de internamento, menor risco de complicações, custos menores e um retorno mais rápido à vida ativa, com uma eficácia comparável, proporcionando assim óbvios ganhos, seja em termos de qualidade de saúde, seja económicos. Importa, no entanto, referir que trabalhamos em conjunto com as restantes especialidades, num ambiente de complementaridade e de busca pela melhor solução para o doente. Geralmente, a decisão do procedimento a efetuar é tomada em consulta multidisciplinar.
Existe uma preocupação com a menor invasividade, nomeadamente com material de menor calibre e acessos através de vasos de menores dimensões. Estas abordagens cada vez menos invasivas permitem-nos evoluir no sentido de tempos de recuperação mais curtos e numa aposta nos regimes de ambulatório. E há também uma questão que preocupa os doentes e que se prende com as doses de radiação.
O nome radiologia, por vezes, ainda 'assusta' um pouco os doentes?
Sim. Nesse sentido, temos feito uma aposta nas técnicas ecoguiadas (isentas de radiação ionizante). Por outro lado, com a evolução tecnológica, os novos equipamentos não só emitem menos radiação, como também nos têm facilitado o trabalho, permitindo que os procedimentos se tornem mais rápidos, aumentando, por isso, o seu perfil de segurança.
Internacionalmente, há uma outra área em grande foco que se começa agora a desenvolver em Portugal. Falo das embolizações músculo-esqueléticas. Neste momento, estamos focados sobretudo na embolização da anca e joelho em contexto de artrose refratária ao tratamento convencional em doentes que não são candidatos ainda à colocação de prótese e à embolização do ombro em contexto de capsulite adesiva. Com esta técnica é realizada uma embolização superselectiva das artérias patológicas que potenciam o processo inflamatório e, consequentemente, a dor. Utilizamos um agente embólico temporário, que permite ao doente melhorar a função da articulação e, sobretudo, diminuir a sua dor. São procedimentos realizados em ambulatórios e com resultados quase imediatos.
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