O medicamento molnupiravir, utilizado para tratar a Covid-19, pode estar a "impulsionar a evolução" do vírus, através da criação de novas variantes com mutações distintas, segundo revela uma análise publicada pela revista New Scientist.
Segundo explica a revista, foi feita uma análise dos 15 milhões de vírus sequenciados em todo o mundo até então e encontrados "cerca de 900" padrões distintos de mutação, "que provavelmente surgiram em pessoas tratadas com o medicamento molnupiravir". Em alguns casos, refere, o vírus parece "ter-se espalhado da pessoa que está a ser tratada para outras".
Apesar desta evidência, "não existem variantes preocupantes".
“O sinal é bastante claro e não existem variantes preocupantes", disse Theo Sanderson, do Instituto Francis Crick, em Londres, citado pela New Scientist.
A revista sublinha ainda que houve um aumento do número do vírus com variantes distintas nos países que começaram a usar o medicamento em 2022. "Essas sequências eram muito mais prováveis de serem observadas em países que usam molnupiravir", afirmou Sanderson.
A equipa conseguiu ainda perceber que os vírus sequenciados no Reino Unido provinham de pessoas tratadas com o medicamento. Segundo a análise, 31% das variantes com o padrão distinto vieram de pessoas tratadas.
"Acho que a questão mais interessante é: o tratamento gera mais novas mutações na população do que o não tratamento?", questionou Martin Nowak, da Universidade de Harvard. A resposta, estima, é "não".
Segundo a New Scientist, um porta-voz da farmacêutica Merck, fabricante do molnupiravir, defendeu que o estudo se baseia em associações circunstanciais, defendendo que os autores "assumiram" que estas mutações "estavam associadas à propagação viral de pacientes tratados com molnupiravir sem evidência documentada dessa transmissão". "Além disso, estas sequências eram incomuns e estavam associadas a casos esporádicos", disse.
De realçar que, em julho deste ano, o antiviral deixou de ser recomendado em Portugal com efeitos imediatos, depois de a farmacêutica ter solicitado ao regulador europeu a retirada da autorização de comercialização.
Em Portugal, o medicamento estava recomendado para o tratamento da doença covid-19 ligeira a moderada, depois de, em novembro de 2021, ter obtido uma recomendação de uso emitida pela Agência Europeia do Medicamento (EMA).
Já em fevereiro de 2023, o Comité dos Medicamentos de Uso Humano (CHMP) da EMA considerou que não era possível concluir que o medicamento "pudesse reduzir o risco de hospitalização ou morte ou diminuir a duração da doença ou o tempo de recuperação da mesma em adultos com covid-19 com risco de progressão para doença grave", segundo informaram o Infarmed e a Direção-Geral da Saúde (DGS).
Na sequência desta posição, a empresa Merck Sharp & Dohme B.V. solicitou a revisão deste parecer negativo, mas em 21 junho deste ano pediu ao regulador europeu a retirada do pedido de autorização de introdução no mercado.
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