"O que temos visto no desenvolvimento das sociedades e particularmente nos últimos tempos é o aumento da diferença social. As desigualdades sociais estão a aumentar em todo a parte e também em Cabo Verde, significa que temos de ter políticas públicas que combatam efetivamente os fatores de conduzam a desigualdade", pediu Pedro Pires.
O ex-chefe de Estado reagia assim a uma pergunta da agência Lusa ao caso da morte de três crianças na sequência de um incêndio numa casa de tambor na zona de Pedra Rolada, na ilha de São Vicente.
Sem comentar as circunstâncias do caso, Pedro Pires disse, entretanto, que há que haver um "esforço" no sentido de travar o crescimento da desigualdade.
O também presidente da Fundação Amílcar Cabral fez o comentário no lançamento das atividades comemorativas do 20 de janeiro, cujo ato oficial vai ser no município de Santa Cruz, interior da ilha de Santiago.
O 20 de janeiro é Dia dos Heróis Nacionais em Cabo Verde, em que se assinala o aniversário da morte de Amílcar Cabral, considerado o pai das nacionalidades cabo-verdiana e guineense, e se presta homenagem aos que lutarem pela independência dos dois países.
As comemorações vão acontecer também no ano em que, em 05 de julho, Cabo Verde vai celebrar 45 anos da independência.
"Ninguém disse que 45 anos depois não teríamos pobreza em Cabo Verde, não se podia prever. Mas a conclusão é a seguinte, afinal, 45 anos depois ainda temos pobreza, e ainda temos pobreza aguda. Há que trabalhar para melhorar isso, a tarefa é de todos nós, dos cabo-verdianos, dos seus responsáveis, trabalhar para reduzir a pobreza, sobretudo a pobreza aguda", sustentou.
O caso da morte das três crianças está a gerar indignação no país, por causa das condições da casa feita de chapas, uma de muitas que ainda existem em São Vicente, a segunda ilha mais populosa do país.
O movimento cívico cabo-verdiano Sokols 2017, que está a realizar uma de muitas campanhas para ajudar a família, considerou trata-se de uma situação que "advém de não haver uma governação que põe como prioridade o direito à habitação condigna para todos".
"Temos de mudar de paradigma", defendeu o movimento cívico, presidido por Salvador Mascarenhas, que já realizou seis protestos de rua no Mindelo.
Para o luso-cabo-verdiano João Branco, presidente da Associação Mindelact e residente em São Vicente, deve-se encarar esta "terrível tragédia" como um "farol", para se agir.
Já Tchalé Figueira, artista plástico natural de São Vicente e residente há vários anos na Praia, disse que existem casas desabitadas e há pessoas que vivem nestas condições "abaixo de cão".
Por sua vez, o também são-vicentino Alcindo Amado entendeu que as três crianças morreram vítimas da "criminosa desigualdade social galopante" que se vive em Cabo Verde, nomeadamente nas periferias dos maiores centros urbanos.
A vereadora para a área Social da Câmara Municipal de São Vicente, Lídia Lima, disse, em declarações à Televisão de Cabo Verde, que a ilha tem cerca de duas mil casas de tambor, onde vivem várias famílias em condições precárias e em risco permanente.
Por isso, defendeu uma política de habituação social mais eficaz para famílias de baixo rendimento, que envolva não só a autarquia, mas também o Governo, as empresas locais, e todo o Estado de Cabo Verde.
No domingo, centenas de pessoas, vestidas de branco, marcharam pelas ruas do Mindelo em homenagem e memória das crianças, dois rapazes e uma menina com idades entre 4 e 6 anos.
Segundo a Polícia Nacional (PN) em São Vicente, o incêndio terá sido provocado pela explosão de uma garrafa de gás, quando as três crianças e a mãe de dois dos menores, o outro é um primo, se encontravam na casa.
Ao tentar ajudar, o pai e mãe sofreram queimaduras, tal como um adolescente e um bebé de cinco meses, tendo sido internados no hospital para observação, sendo que apenas o bebé já teve alta.