Credores da Portucel Moçambique responsabilizam regulador português

Um consórcio de credores da Portucel Moçambique responsabilizou hoje a Comissão do Mercado de Valores Imobiliários em Portugal (CMVM) por prejuízos e alegada fraude financeira causados pelo grupo português Navigator, detentor da sociedade florestal, em Moçambique.

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Lusa
14/02/2020 16:37 ‧ 14/02/2020 por Lusa

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Portucel Moçambique

"A razão pela qual decidimos enviar esta documentação à CMVM, prende-se com o facto de estarmos convictos de que a CMVM tem, neste processo, uma enorme responsabilidade e sobre a qual terá muito brevemente de se pronunciar, no âmbito do processo-crime a dar entrada na Procuradoria-Geral da República de Portugal (PGR), contra as sócias da Portucel Moçambique, administradores desta e outras entidades e pessoas físicas como corresponsáveis", lê-se na carta enviada que acompanha o conjunto de onze documentos de apoio a que a Lusa teve hoje acesso.

Na documentação enviada à CMVM, os credores da Portucel Moçambique dão conta de que o pré-aviso da ação judicial contra o grupo Navigator foi submetido em dezembro de 2019 no Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal.

"Existem indícios substanciais que apontam no sentido de que as requeridas [Navigator International Holding, SGPS, S.A. e The Navigator Company S.A.], através da sua filiada Portucel Moçambique" levaram "ao engano as requerentes [sociedades credoras], mobilizando-as para um projeto que bem sabiam que não iam concretizar", consta da notificação judicial submetida em Setúbal.

O documento, consultado pela Lusa, refere que o grupo Navigator "criou uma aparência de balanço que não correspondia à realidade" e que "foi, de resto, através dessa ficção de balanço que as requeridas vieram a obter a entrada no seu capital e a aprovação de um financiamento de 32 milhões de dólares [28 milhões de euros], que não se sabe em que termos foi concretizado e onde foi aplicado".

O consórcio de credores alega que em causa estão incumprimentos de contratos, pagamentos em atraso e indemnizações por equipamento e danos causados durante a prestação de serviços de silvicultura à Portucel Moçambique, nas províncias moçambicanas de Manica e da Zambézia.

Desde 2009 a empresa portuguesa desenvolve naquela região um megaprojeto florestal de 2,5 mil milhões de dólares (cerca de 2,2 mil milhões de euros) de plantio de eucalipto ao longo de cerca de 360 mil hectares.

Os credores da Portucel Moçambique afirmam que têm reclamado o pagamento de compensações pelos prejuízos que lhes têm sido causados pela Portucel Moçambique, mas até ao momento sem sucesso.

Em entrevista à Lusa, a 19 de março de 2019, o consórcio de credores, na altura constituído por três empresas, anunciou a intenção de avançar com um processo-crime em Portugal contra o grupo The Navigator Company, detentor da sociedade florestal em Moçambique, por prejuízos de mais de 50 milhões de dólares naquele país africano lusófono.

Desde então, a Portucel Moçambique intentou três ações declarativas de simples apreciação negativa no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, em Moçambique, por forma a obrigar três das agora cinco sociedades do consórcio de credores a fazer prova que foram alvo de prejuízos financeiros pela Portucel Moçambique, referem os documentos enviados agora à CMVM.

No processo de contestação, a decorrer na justiça moçambicana, segundo os documentos consultados pela Lusa, uma das sociedades credoras, a FAAN -- Aluguer de Equipamentos, LDA, reclama o pagamento de 13,3 milhões de dólares (12,4 milhões de euros) por incumprimento de contratos e prejuízos alegadamente causados pela Portucel Moçambique e quer ainda que seja feita uma auditoria à contas da sociedade florestal do grupo português nos últimos sete anos de atividade em Moçambique.

"Requere-se uma auditoria independente às contas da Portucel Moçambique desde o ano 2013 até à presente data e aos registos dos aumentos de capital social da Portucel Moçambique de modo a provar manipulação de contas; fuga fiscal; escrituras ilegais de redução e aumentos de capital social; aumentos ilegais de capital social; a incapacidade financeira da Portucel Moçambique", refere a empresa.

A FAAN afirma que a Portucel Moçambique se encontra "numa situação de insolvência, estando a dever até ao Sistema de Segurança Obrigatório, gerido pelo INSS [Instituto Nacional de Segurança Social de Moçambique]".

Na sua contestação à ação judicial instaurada pela Portucel Moçambique, a FAAN alega também que a Portucel Moçambique "indicou terrenos trabalhar sem o acordo das populações" e insta a sociedade florestal do grupo Navigator a "fazer prova dos investimentos efetuados a favor das populações" locais em Moçambique para o qual, segundo alega, "mantinha uma bolsa de cerca de 40 milhões de dólares (36 milhões de euros) destinados a execução de ações sociais".

Em resposta à Lusa, a Navigator disse desconhecer "a existência de quaisquer queixas-crime apresentadas pelo auto-denominado 'consórcio de credores '" e acusou uma das empresas que compõem o grupo, a SMOPS, de estar a promover "campanhas de mobilização contra o projecto da Portucel Moçambique junto das comunidades de Macala, Murruma e Sugue".

"A atuação da The Navigator Company e da Portucel Moçambique sempre se pautou e pautará pelo cumprimento de todas as suas obrigações legais e contratuais, sem excepção, e respeitando integralmente toda a legislação em vigor nos países onde operam, pelo que repudiam veementemente as acusações e insinuações que lhe são dirigidas pelas entidades que compõem o referido 'consórcio'", refere a empresa portuguesa.

Segundo a Navigator, a "Portucel Moçambique pagou todas as facturas emitidas por estes prestadores de serviços no âmbito de uma relação comercial que os mesmos mantiveram até há cerca de três anos, não existindo atualmente qualquer factura emitida (...) pendente de pagamento".

Por isso, e perante as queixas, a Portucel Moçambique interpôs, "em junho de 2019, três ações judiciais, junto do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, contra cada um desses prestadores de serviço, com o objectivo de obter uma sentença judicial reconhecendo a inexistência daqueles pretensos créditos", acrescentou a resposta da Navigator à Lusa.

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