"Está muito grande [número de vítimas] para São Paulo. Temos de ver o que está a acontecer aí. Não pode ser um jogo de números para favorecer interesse político. (...) Não estou a acreditar nesses números", disse hoje o chefe de Estado do Brasil, numa entrevista telefónica ao canal televisivo Bandeirantes.
São Paulo, que é o estado mais rico e populoso do Brasil, é também a unidade federativa mais afetada pela covid-19, contabilizando 68 mortos e 1.223 infetados, segundo dados do Ministério da Saúde. Em cinco dias, São Paulo teve um aumento de 46 mortos.
"Procurem saber, por estado, quantos morreram por H1N1 [gripe suína] até ao momento. Não é que eu queira que tenham morrido, mas no passado foram 700 pessoas, mais ou menos. Alguém teve de morrer este ano dessa doença. Se toda a gente morrer com coronavírus, é sinal de que o estado está a fraudar as causas de morte, querendo fazer uso político de números. Isso não podemos admitir", acrescentou o mandatário, sem precisar o estado a que se referia.
As suspeitas face aos números apresentados por São Paulo surgem após uma forte disputa entre Jair Bolsonaro e o governador daquele estado, João Doria, que têm divergido em relação às medidas de isolamento, o que resultou numa troca de acusações.
João Doria dirigiu hoje duras críticas a Jair Bolsonaro face à retórica do chefe de Estado de desvalorização da pandemia do novo coronavírus, acusando o atual executivo de "desprezar vidas"
"O Brasil não pode parar para lamentar a irresponsabilidade de alguns que preferem desprezar vidas. Mais de 50 países estão em quarentena. É a pior crise de saúde no mundo. Quase metade da população do planeta está em casa. O mundo inteiro está errado? E o Presidente Jair Bolsonaro é quem está certo?", questionou ironicamente o governador do estado de São Paulo.
Durante uma conferência de imprensa na tarde de hoje, João Doria acusou o Governo Federal de divergir nas orientações enviadas à população.
Na terça-feira, Jair Bolsonaro gerou polémica junto da classe médica e política do Brasil ao pedir às autoridades estaduais e municipais a reabertura de escolas e comércio, e o fim do "confinamento em massa", de forma a evitar uma eventual "onda de desemprego".
"A política que mata pessoas não salva a economia", defendeu João Doria, aconselhando os cidadãos a verificarem as recentes declarações do governante de Milão, Giuseppe Sala, que se mostrou arrependido por ter estimulado moradores da cidade a continuarem as atividades económicas e sociais durante a pandemia.
Contudo, as desconfianças de Bolsonaro vão mais longe, colocando também em dúvida os números de casos na Itália, país europeu que registou hoje 919 novas mortes pelo novo coronavírus.
"O vírus evolui. Nós temos informações do mundo todo de como as pessoas estão a ser tratadas. Inclusive, estamos a desfazer certos mitos, como a questão das mortes na Itália. A maioria das mortes não tem nada a ver com o coronavírus, nada a ver. São pessoas que estavam numa região fria e todos com uma média de idade de 80 anos", disse Bolsonaro, citado pelo jornal Folha de S. Paulo.
O Brasil ultrapassou hoje os três mil infetados pelo novo coronavírus, registando 3.417 casos positivos e 92 mortos, sendo que 85% das vítimas mortais apresentava pelo menos um fator de risco.
Depois de São Paulo, Rio de Janeiro é o segundo estado com mais casos de covid-19, com 10 óbitos e 493 infetados.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou cerca de 540 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram perto de 25 mil.